CANNES 2004 - APRESENTAÇÃO

12 de maio de 2004

Ano passado - a opinião foi unânime - foi considerado o pior festival de todos os tempos. Apesar de ter lançado Dogville, Sobre Meninos e Lobos e Invasões Bárbaras.

Daí a responsabilidade de Cannes 2004, limpar a barra e restituir ao Festival seu antigo prestígio, abalado pelas mudanças administrativas (nova equipe de seleção, menos filmes concorrentes).

A arma secreta deles chama-se Quentin Tarantino, que deve a Cannes sua revelação e que este ano, como presidente do júri, promete dar entrevistas divertidas e surpreendentes (além de impor sua vontade ao resto do júri, que não tem grandes personalidades. Kathleeen Turner, Tilda Swinton, Emmanuelle Beart, o diretor americano Jerry Schatzberg, o de Hong Kong, Tsui Hark, um crítico filandês, Peter Von Bagh e uma roteirista americana, Edwige Danticat).

Ou seja, Tarantino vai mandar e desmandar. E não me consta que ele tenha especial afeição por Che Guevara ou a América Latina (o que já prejudica Walter Salles e seu Diários de Motocicleta). Nada se faz em Cannes, porém, sem lobby, muito pior que no Oscar.

E com certeza se deve ao Waltinho o fato da retrospectiva deste ano ser sobre o Cinema Brasileiro (para se imaginar o prestígio, basta dizer que no ano passado foram os filmes de Fellini!). Só pode ter sido ele quem influenciou a seleção do que se chama Um Tributo ao Cinema Brasileiro: 40 anos de Cinema Novo. Serão exibidos Macunaíma (69, na programação oficial está 68 por engano) de Joaquim Pedro de Andrade, já na cópia restaurada pela nossa Cinemateca; Vidas Secas (63) de Nelson Pereira dos Santos; Deus e o Diabo na Terra do Sol (64) de Glauber Rocha; Terra em Transe (67) de Glauber; Bye Bye Brasil, de Carlos Diegues (79); Dona Flor e Seus Dois Maridos de Bruno Barreto (76) e finalmente, para Anselmo Duarte não ficar chateado, também incluíram O Pagador de Promessas (62), Palma de Ouro em Cannes.

A única inclusão discutível no caso é de Dona Flor, que afinal das contas não é bem Cinema Novo, mas enfim... Durante o Festival será exibido também o documentário de Silvio Tendler, Labirinto Glauber e concorrendo como curta-metragem, Quimera, o filme do filho de Glauber, Erik Rocha.

Outro detalhe curioso: consta da programação oficial, para o dia 17, uma festa brasileira, que está sendo organizada pelo pessoal do Festival do Rio, liderado por Ilda Santiago.

A duvida é saber se o filme de Waltinho poderia ser considerado brasileiro ou não.

Se bem que não faça tanta diferença neste mundo globalizado, queiram ou não os franceses.

 

A Seleção do Ano

A primeira vista não parece essas coisas. Tem meia dúzia de filmes novos de ex-vencedores e pouco mais. Tem filmes novos de Kusturica (Zivot je Cudo), dos Irmãos Coen (The Lady Killers, que foi enorme fracasso nos EUA, mesmo sendo estrelado por Tom Hanks), o já polêmico novo documentário de Michael Moore (Fahreinht 911), do chinês Wong Kar Wai (2046), o primeiro filme espanhol a abrir Cannes (A Má Educação, de Almodóvar, outra fita polêmica). E só.

Hollywood mais uma vez esnobou o festival (como medo de lhe queimarem os filmes como sucedeu com Godzilla). Então tem algumas sessões especiais com fitas americanas, Shrek 2 (que concorre), Tróia, Kill Bill 2. Principalmente porque sempre é bom ter uma subida de escadas com Brad Pitt ou Eddie Murphy. Mas a ausência americana é escandalosa. A tal ponto que concorre um telefilme da HBO, A Vida e Morte de Peter Sellers, porque é estrelada por Charlize Theron.

E na lista de concorrentes há poucos nomes conhecidos. Mesmo os franceses são do segundo time (Agnes Jaoui, Oliver Assayas, Tony Gatlif). É claro que Cannes não é só isso.

Tem inúmeras mostras paralelas e são dela que geralmente surgem os filmes-revelação. Mas por enquanto é difícil prever o êxito do Festival ainda mais quando se anuncia que os atores e técnicos de cinema e teatro pretendem causar confusão e acabar com o Festival, protestando contra o fim dos privilégios da Assistência Social. Ou seja, vai ter passeata e quem sabe pancadaria.

Isso, porém, não garante o sucesso de um Festival. De hoje até o domingo, dia 23, eu estarei aqui contando para vocês o melhor e o pior de Cannes 2004.

Por Rubens Ewald Filho