14
de março de 2006
Chego de viagem sempre tão arrasado pelo jet lag (resultado da mudança de fuso de horário), que nem tenho coragem de escrever e contar as novidades. Desta vez, ainda pior com a ressaca do Oscar.
Nem tanto da transmissão mas, este ano, do resultado que é dos mais esdrúxulos que já vimos.
Ainda mais no Brasil, onde Crash, apesar de ter passado duas vezes nas salas (em novembro e depois das indicações) ninguém, ou quase ninguém, se deu ao trabalho de assistir.
Ainda bem que Maria Cândida e eu comentamos sobre o filme e sua chance de ganhar no pré-show da TNT (na verdade, os sinais já estavam aparecendo na TV e jornais americanos, tão claros que realmente sentimos necessidade de mencioná-los, embora eu não conseguisse crer em sua vitória).
Ah! Um amigo do Orkut me mandou outra teoria, que circula agora nos EUA, de que houve erro na votação, porque na cédula os nomes de Brokeback Moutain e “Crash, estão mal definidos. Bonita desculpa, mas ainda acredito em preconceito mesmo.
A Transmissão
Ninguém percebeu, mas o que fizemos pela TNT, ao vivo de Atlanta (os jornais falaram em Los Angeles - não havia dito nada, isso foi inferido e não vi razão para desmentir), foi um ato pioneiro.
Foi o primeiro programa ao vivo, produzido e apresentado diretamente dos estúdios da Turner para a América Latina, pela TNT.
O que foi importante como precedente (e deu certo, sem erros, apesar de ter sido ao vivo; tenho que dar crédito à colega Maria Cândida, que foi incansável nos ensaios e que ficou cuidando de tudo, enquanto eu tentava preparar a transmissão, porque o roteiro desta vez chegou com poucos detalhes - nada de Jon Stewart, nem dos clipes - inclusive os nomes dos apresentadores, apenas no domingo de manhã!
Acho que o único incidente mais estranho foi quando a transmissão da Academia, da ABC, cortou repentinamente assim que saiu o Oscar de melhor filme. Tão rápido que Atlanta ficou esperando pelo retorno imediato, o que não sucedeu. E sem saber, Regina (a tradutora) e eu ficamos no ar esperando. E o que falamos foi ouvido pelos mais atentos (a maior parte das pessoas achou que tinha terminado e desligou). Felizmente nenhum dos dois disse nada de horrível ou chocante. Nem mal do prêmio. Só disse que demorando tanto, todo mundo ia desligar. Ou seja, perdi a chance de involuntariamente provocar algum escândalo!
Houve outros fatos inusitados: acontece que meu aniversário era logo depois dos prêmios, e me fizeram a surpresa de levar um bolo para o estúdio. Muito gracinha. O estranho é que dentro dos estúdios não é permitido acender fogo, ou isqueiro, ou algo parecido.
Assim, tive que soprar as velas apagadas! Ao chegar ao aeroporto, sete e pouco da manhã, Sabrina, da TNT, também fez uma gracinha, levando uma faixa, cumprimentando pela transmissão e pelo aniversário, numa citação a Roda da Fortuna (“The Band Wagon” - 1953), onde Fred Astaire é recebido assim quando chega a Hollywood, que me alegrou o coração (porque a gente chega cansado e inseguro!).
Outro detalhe importante: os estúdios da Turner são os mesmos onde são gravados os programas do meu canal favorito, o TCM (Turner Classic Movies), inclusive os de Robert Osborne (que este ano virou o host oficial dos Oscars, e que foi aplaudido pela equipe amiga dele quando apareceu no tapete vermelho). Além de moderno e bem aparelhado, também tem a marca da antiga MGM e Warner (já que a Turner é dona do acervo dos antigos estúdios).
E a cantina, por exemplo, é toda decorada com fotos antigas de astros (Joan Crawford, Judy Garland, Liz Taylor).
Ou seja, por tabela me senti num estúdio de Hollywood. O que não deixa de ser prazeroso. Só que, desta vez, o trabalho era tanto que chegava de manhã aos estúdios e saia à noite, a tempo de ainda comer alguma coisa.
Fiquei espantado quando, num bar lanchonete com música, me pediram os documentos! Nessa altura do campeonato isso é um espanto. Acontece que as leis da Geórgia são muito restritas. Não permitem que se compre bebida alcoólica aos domingos e a tolerância é zero para dirigir carros. Se bebeu algo, por mínimo que seja e for pego, vai direto dormir na cadeia!
Tudo isso confirma minha sensação de que os EUA estão virando um estado policial, onde tudo está ficando proibido e controlado.
Tudo isso para dizer que não tive tempo de ir muito ao cinema. Só na 2ª feira cedo consegui assistir a uma estréia:
16 Quadras (“16 Blocks” - 2006)
Queria ver este filme policial porque era dirigido pelo Richard Donner (que andou afastado por uns tempos), de quem sempre fui admirador. Mas não é nada demais. Bruce Willis envelheceu e continua canastrão. É a história de um velho policial alcoólatra (e, depois se descobre, corrupto), que resolve proteger uma testemunha (o excelente ator rapper Mos Def), que está sendo perseguido pelos colegas policiais (David Morse os lidera). Deus sabe porquê, Bruce resolve salvá-lo e andar as 16 quadras de Nova York que faltam para chegar ao tribunal. Ou seja, tem um jeito de faroeste (este tipo de ação), de seriado de TV (a la “The Shield”), e não traz qualquer novidade.
Com uma exceção: o primeiro ataque à testemunha e Bruce é fotografado de forma inovadora, usando câmera lenta, mas conseguindo registrar a sensação de alguém que está sendo atingido, mas que não consegue perceber bem por quem e vindo de onde. Um breve feito técnico. Mas o resto é rotina, o que explica porque o filme teve más críticas e fraco resultado de bilheteria.
Pay TV
O serviço de Pay on Demand do Hotel Marriot era excepcional, com muitas alternativas, e preços salgados (chegando a 15 dólares por filmes novos). Consegui assistir ao documentário indicado ao Oscar, “Enron, The Smartest Guys in the Room” (2005), que é inacreditável e obrigatório. O que aqueles vigaristas fizeram é completamente absurdo (foram eles que provocaram os apagões na Califórnia, para subir o preço de suas ações) e comprovado (para variar, os donos eram e são amigos da família Bush, que aparece em depoimentos apoiando-os!). Embora pareça confuso à primeira vista, é um documentário do nível de Michael Moore.
Outro filme que assisti foi o novo de Steven Soderbergh, “Bubble” (2005), aquele que ele tentou lançar em cinema e Pay TV ao mesmo tempo (deveria ter também em DVD, mas Atlanta é fraca em ofertas no ramo). Mas não consigo entender direito esse sujeito.
Ele alterna bons filmes comerciais (como Traffic) com outros experimentais, que são desprezíveis.
Lembro-me de uma coisa patética que ele fez, e nunca foi vista por aqui (Schizopolis- 1996), e outro mais recente, Full Frontal (2002), que era um desperdício de energia e elenco. Este aqui, que seria o primeiro de uma série, é simplesmente chato e inócuo.
Feito com atores amadores, conta uma história muito boba, de um rapaz (que aparenta ser o herói, mas no fim das contas vira coadjuvante), operário de uma fábrica que se engraça com uma nova colega, que aparece assassinada.
Logo depois, se descobre quem a matou, por razões totalmente fúteis. E daí?
O filme é distanciado, com planos gerais de objetos e lugares, um elenco neutro e nem o título se explica direito (as pessoas vivem em bolhas isoladas, será Isso?). Enfim, quem se importa.
Pelo jeito ninguém. Nada contra fazer fitas experimentais, mas que ao menos elas sejam realmente inovadoras, tenham algo a dizer ou acrescentar. Esta não é nada.
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Por
Rubens Ewald Filho