ADORÁVEL JÚLIA

29 de março de 2005

Os que têm boa memória devem lembrar quando Marília Pêra estrelou a montagem teatral de Adorável Julia e também da versão européia do texto de Somerset Maugham, com o mesmo nome, estrelado por Lilli Palmer (sublime), Charles Boyer e Jean Sorel. Uma fita que passou pouco tempo atrás no Telecine Classic, onde se confirmou seu humor e principalmente o acerto da atriz (ela faz Julia, uma estrela de teatro que confunde vida e palco, de tal forma que mal sabe quando diz um texto tirado de uma peca ou é de verdade mesmo). Lilli e Marília eram infinitamente superiores a Annette Bening, que foi bastante louvada e até indicada para prêmios, inclusive o Oscar. Não está mal (ela é das poucas atrizes americanas que não fizeram plástica nem puseram botox; ainda bonitona, a sra. Warren Beatty tem o rosto com muitas rugas). Mas o roteiro não ajuda, nem a direção do húngaro Istvan Szabo. E sabe por quê? Porque fizeram uma fita européia e não americana.

A fotografia é escura (a regra é simples, comédia tem que ter foto clara e luminosa), a câmera está sempre colocada de forma precária em cenários reais, nunca favorecendo o ator ou a cena. Escolheram um recurso narrativo muito duvidoso, que é trazer um fantasma, o personagem do diretor que inventou Julia (Michael Gambon) e que continua falando e dirigindo ela (naturalmente só Julia o vê). Isso acrescenta pouco e não ajuda na parte de humor. O filme é bem irregular, repetindo o esquema: Julia se apaixona por um rapaz mais jovem que está apenas explorando-a e quer um papel para sua nova namorada (que por sua vez o trai com o marido de Julia, o diretor Jeremy Irons, já que eles têm uma relação aberta). Pena que o garoto escolhido é muito feioso e fraco (o gordinho Shaun Evans), ao contrário do ilustre elenco de apoio, que tem Bruce Greenwood, Rosemary Harris, Rita Tushingham, Juliet Stevenson e Miriam Margoyles. O que atrapalha tudo. Para quem não conhece o original, tudo pode ser até relativamente divertido. Annette chora um pouco demais, mas não compromete, o personagem é bom demais para negar fogo.

O trabalho só não é melhor porque o roteiro de Ronald Harwood não ajuda. Nem a realização: fui checar e realmente a maior parte do filme foi feita em Budapest, o visual não engana.

Por Rubens Ewald Filho