AEON FLUX
 


14 de março de 2006

É complicado quando um filme não é mostrado com antecedência para a imprensa, como este “Aeon Flux” (nem aqui, nem nos EUA), criando uma situação: 1) Onde automaticamente já se assume que o filme é ruim; 2) Cria má vontade com ele, e 3) Cabe a pergunta: o que é menos ruim? Críticas possivelmente desfavoráveis ou deixar o filme passar em branco, com certeza de fracasso, ainda mais por causa do título misterioso e a pouca publicidade.

Neste caso, o filme deveria ter sido mais bem vendido ao público indicado, que são os fãs de série de TV anime (animação) japonesa, ou seja, de quadrinhos e fantasia (que, por sinal, são fãs fiéis e entusiastas, espalhados por sites da internet, onde hoje em dia realmente se cria o boca-a-boca). Ou seja, como é alternativo em concepção (produção MTV, baseada em um desenho animado que começou como parte da série “Liquid Dreams”, em 1990, e depois se tornou uma série regular de TV em 1995, criada por Peter Chung), ela chegou a sair em vídeo no Brasil e já está saindo uma edição em DVD. “Aeon Flux” deve fracassar aqui também (nos EUA custou cerca de 55 milhões de dólares e não passou dos 25), simplesmente porque há uma rejeição a esse tipo de filme por grande parte do público (em particular, as mulheres). Aliás, como já sucedeu com “A Ilha” (este filme já foi descrito como “A IlhaencontraMatrix”).

Deixe-me abrir um parêntesis: a sessão que assisti estava muito vazia, o que me levou à conclusão de que poucos continuam indo ao cinema, e que os filmes do Oscar estão sendo o fracasso de bilheteria que se esperava, com exceção de “Brokeback Mountain”.
Muitos só estão em uma única sessão e em fim de carreira (fitas até acessíveis, como “Orgulho e Preconceito”, além de “Boa Noite e Boa Sorte”, e até mesmo algumas que nada tem a ver com o prêmio, como “O Matador”).

Ou seja, estamos caminhando para outro ano de fracassos.

Não acho que seja uma coisa ruim para os Oscars, que este ano assumiram sua condição de Academia de Artes e Ciências, optaram por filmes de arte, independentes, mais sérios e polêmicos, que obviamente iriam render menos dinheiro. Que fique claro que qualidade nada tem a ver com sucesso de bilheteria.

Voltando ao filme, esta adaptação é dirigida por uma mulher, Karyn Kusama (que havia estreado com filme premiado em “Sundance, Girlfight”, que foi precursor de “Million Dollar Baby”. O título nacional que achei foi “Boa de Briga”). Não faz diferença. No roteiro, eles mudaram bastante coisa. No original quase não havia diálogos (aqui não são muitos, mas o suficiente para entender-se a trama). Houve críticos americanos que reclamaram que não compreenderam nada. Besteira deles. O filme é perfeitamente lógico, até com certas pretensões shakespeareanas, com traições, reuniões de gabinete, lealdades e velhas paixões explicadas ao final. Na série de TV não se ficava sabendo nem sequer o que motivava Aeon (Charlize Theron), nem qual sua relação com Trevor Goodchild (houve capítulos onde todos morriam, menos os dois, e outros onde Aeon morria no fim de cada um!). Ou seja, era cult e obscura por definição. Aqui ainda há certas coisas nebulosas, que mereciam maior clareza (por exemplo: que organização é aquela em que as pessoas se reúnem a partir de pílulas no estomago!

Dá para aceitar como fantasia, mas não se deixa claro sua causa e sua motivação, talvez até pensando em continuação, que certamente não irá acontecer). Como também não fica muito clara a finalidade e utilidade da parceira de Aeon, Sithandra (a indicada ao Oscar por “Ruanda”, Sophia Okoneko) ter tirado os pés e substituído por outro par de mãos! E mais detalhes assim.

É bom explicar que a história se passa daqui a quatro séculos, em 2415. Segundo eles, em 2011 quase toda a humanidade foi varrida por um vírus mortal. Agora, os sobreviventes num regime totalitário num lugar chamado Bregna, onde têm tudo mas estão sujeitos a ataques de melancolia e sonhos estranhos (o filme lembra também o cult "Fuga do Século XXIII"). Aeon é uma assassina/terrorista fria e muito bem equipada, que trabalha para a organização chamada Monicans. Sua missão é matar o cientista que salvou eles todos, Trevor Goodchild, que seria o benigno ditador do lugar, mal aconselhado por seu irmão Nero (que deseja seu posto e se revela mau-caráter). Mas quando o encontra, os dois parecem se reconhecer, o que faz com que mude de planos e procure se reajustar à situação, provocando assim a impressão de que é uma traidora.

Enfim, não gostaria de explicar mais além de que o filme procura seguir o visual estilizado do original (a seqüência da mosca no começo é uma citação literal), e que a bela Charlize tem uma atuação atlética (o filme teve que ser interrompido por um mês, porque ela se machucou insistindo em fazer grande parte dos movimentos de ginasta).

Ainda que, dramaticamente, esteja melhor do que em “Terra Fria”, que lhe deu outra indicação ao Oscar. O resto do elenco tem curiosidades, como Frances McDormand fazendo a chefe dos terroristas (ela também está em “Terra Fria”, ao lado de Charlize) de cabelo arrepiado de bruxa. E ainda uma aparição marcante, como o jardineiro de Trevor, do filho de Klaus Kinski e irmão de Nastassia, o exótico Nikolai Kinski. O vilão é Jonny Lee Miller, ex-marido de Angelina Jolie.

Não me lembrava do galã do filme, que é o alto (1,91 m), o neozelandês de origem húngara, Marton Csokas (o nome se diz Cho-Kash), que esteve em “O Senhor dos Anéis”, “Supremacia Bourne”, “Linha de Tempo”, “Kangaroo Jack”, “Triplo X” e até “Star Wars - O Ataque dos Clones”. Ele fotografa como uma mistura de Kevin Spacey e Clive Owen.

Sem dúvida, esquisito, “Aeon Flux” está longe de ser o desastre que apregoaram. Pessoalmente até achei interessante e divertido.

Mas admito que não seja para todos os gostos. Mas é uma fantasia/ficção cientifica com algo a dizer.

Por Rubens Ewald Filho

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