11
de junho de
2004
É sempre
um risco se fazer uma biografia autorizada. Mas este não é o
problema deste filme que, com bastante coragem, e até candura,
não esconde a promiscuidade e a autodestruição
do compositor e cantor Cazuza. Certamente eles acertaram no mais
difícil. A escolha do ator para fazer o protagonista.
O pouco
conhecido Daniel de Oliveira pode não ter o jeito
de anjo do jovem Cazuza, mas tem garra, presença, uma
figura dominante que segura os dois tempos do personagem, a
primeira fase do sexo, drogas e rock n´roll e depois
de uma hora, enfrentando a tragédia da Aids (o ator
emagreceu e tem uma figura impressionante). É uma revelação
de ator, que convence plenamente e se o filme for sucesso deve-se
principalmente a ele (o rapaz também canta algumas poucas
canções embora, na maior parte do tempo, sejam
usadas as gravações originais do próprio
Cazuza).
As
outras opções são menos felizes. A idéia
dos realizadores de fazer o filme em Super 16 mm, com cores berrantes
e contrastadas como se fosse um filme que o próprio Cazuza
estivesse fazendo de sua vida, não chega a passar para
o espectador. Esqueceram de nos avisar e a sensação é de
um filme apressado, nervoso (todo em câmera na mão),
superficial.
O problema
maior é que o roteiro não
deixa nada muito bem definido ou explicado.
De
tal forma que os coadjuvantes - até feitos por atores
consagrados - não tem falas ou muito pouco a dizer. Mesmo
os pais de Cazuza têm uma dezena de cenas, onde repetem
lugares comuns, sem chance de se explicarem ou se tornarem humanos.
E só resultam porque ambos (Marieta Severo e Reginaldo
Faria), são grandes atores e souberam passar, muitas vezes
num mero olhar ou na postura, o que estão sentindo. Porque
o filme em momento nenhum os ajuda. Mas tampouco está a
favor de Cazuza, já que o personagem fica dizendo frases
feitas (ao que parecem autenticas), que fora de contexto parecem
artificiais, e dão uma impressão de que ele é apenas
um garoto mimado, voluntarioso, como se o fato de ter talento
poético, justificasse tudo e qualquer coisa.
Incomoda
especialmente o erro de Emilio Melo que faz um caricato Ezequiel
Neves (amigo e guru de Cazuza e que por sinal faz uma
figuração ao lado de Emilio num show). Sem o brilho
e humor do verdadeiro. Perdido num limbo, o jovem Daniel tem
a ingrata tarefa de carregar o filme, o que geralmente consegue
(há uma tentativa de inserir a vida de Cazuza num contexto
histórico o que também resulta superficial e mal
resolvido). Principalmente porque é impossível
não se ter uma memória emotiva tanto em relação às
canções hoje, até clássicas, quanto às
vitimas da Aids (ao chorar por Cazuza estamos também de
certa forma, chorando por nossos mortos).
Por Rubens Ewald Filho
(Foto: divulgação)
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