CONSTANTINE

15 de março 2005

Dá a impressão de que, numa reunião de executivos da Warner, alguém deu a idéia: “Porque não unimos duas de nossas franquias, fazemos uma mistura de Matrix com O Exorcista?”. E foram encontrar justamente essa proposta numa história em quadrinhos, Hellblazer aqui transformada em Constantine (para não confundir com Hellraiser, o nome do herói é várias vezes repetido no filme, talvez para garantir uma continuação, John Constantine). O filme dirigido pelo estreante Francis Lawrence (que veio de music vídeos para Britney Spears, Will Smith, Aerosmith) é repleto de efeitos especiais, muita violência (teve cotação R nos EUA, ou seja, proibido para menores) e faz uma carreira medíocre nos EUA (onde chegou aos 66 milhões de dólares, para um orçamento estimado em 100 milhões de dólares). Originalmente quem iria fazer o filme era Tarsem Singh com Nicolas Cage, mas os dois abandonaram o projeto. O protagonista Constantine era originalmente de Liverpool mas para o filme tiveram que o transpor para Los Angeles.

Para o espectador comum, o problema é justamente que o filme custa a deixar claro que não se trata de mera história de terror (começa pregando alguns sustos e mostrando um misterioso punhal, que teria matado Cristo na cruz), mas sim uma fantasia, baseada em quadrinhos. Curiosamente o diretor não consegue criar o clima desejado e ficamos com dificuldade para entender quem é aquela figura esquisita que aparentemente é um exorcista moderno, ajudado por alguns asseclas igualmente misteriosos (como um adolescente que dirige um táxi e parece ser um aprendiz, que some no meio da história para voltar justamente para seguir o destino de todo parceiro de mocinho no cinema. Outro é um dono de boliche que é especialista em demônios!). Só mais tarde ficamos sabendo a trama improvável.

Usando a liturgia católica (e assim deixando de fora os de outra religião), Constantine teria sobrevivido a um suicídio (e, portanto, segundo os católicos iria diretamente ao inferno), mas ao voltar à vida iria dedicar-se a lutar contra os demônios (a que ele chama de mestiços, que transgridem a lei do equilíbrio, ou seja, a paz armada entre Deus e o Diabo), a mandá-los de volta para o inferno. A situação se complica quando uma jovem aparentemente se mata (e, portanto vai para o inferno), mas sua irmã gêmea (Rachel Weiz, amiga de Keanu desde que fizeram juntos o fraco Reação em Cadeia) é uma policial que tenta investigar o caso, se envolvendo com o herói. Se o resumo parece complicado, espere para ver o filme, que se baseia em vidros que explodem, paredes perfuradas (há uma seqüência curiosa, mas mal explicada, em que a garota sai voando pelas paredes de um prédio e depois vai cair numa piscina lá embaixo, o que custa a ficar claro) e outros delírios. Sem esquecer a ilustração freqüente do inferno flamejante, com diabinhos que correm de quatro (aliás, toda a fita usa o catálogo inteiro de efeitos digitais disponíveis no momento).

Constantine não é desastroso porque começa a tomar forma na parte final, quando o diretor resolve não interferir e deixar a ação nas mãos de dois grandes atores, que interpretam respectivamente o Anjo Gabriel (a excelente Tilda Swinton) e Lúcifer (o sueco Peter Stormare. Reparem como ele cria um tipo memorável, que lembra muito a figura do mestre do ator, o diretor Ingmar Bergman). É um duelo muito interessante, do qual pouco participa o galã Keanu, que consegue ser ao mesmo tempo carismático e canastrão. De qualquer forma, não parece que iremos ter uma nova franquia.

Por Rubens Ewald Filho