ECOCINE 2005

15 de junho de 2005

Este ano fui presidente do júri do IV Ecocine - festival de cinema ambiental, que habitualmente era realizado em São Sebastião, mas desta vez foi transladado para Salvador, Bahia. Ser júri é sempre uma lição de humildade porque não é nada fácil ficar tarde e noite assistindo documentários de vários tamanhos, que regra geral são excessivamente longos (como a maior parte foi feita em Vídeo ou Digital, todos tem muitos minutos a mais do que o necessário). Enfim aprendi muito, nem sempre boas noticias, quando você fica sabendo que a devastação ambiental acontece em toda parte (o Festival é internacional).

Foram 250 inscritos e 45 selecionados. O júri acabou resolvendo o seguinte: Melhor Filme “500 Almas”, de Joel Pizzini; Melhor Curta-Metragem “Arne Scuksdorff: Uma vida documentando a vida”, de Bárbara Fontes; Melhor Animação “The Meatrix”, de Louis Fox; Melhor Obra com Tema Ligado à Água “A Velha e o Mar”, de Petrus Cariry; Melhor Curta-Metragem com Temática Nordestina “Roça Crua”, de May Waddington; Melhor Obra Digital “Icologia“, de Ângelo Lima; Prêmio Especial do Júri “Dias de Carton” (Argentina), de Verônica Souto; Prêmio Aquisição STV "Sin Embargo - Nevertheless" (Cuba), de Judith Grey (esses dois últimos são sobre reciclagem, no caso do argentino, uma situação que eu desconhecia sobre os catadores de papel, contado com poesia e posição social, muito interessante).

Mas vamos comentar os que poderão ser vistos por aqui:

“Arne Sucksdorff” - Quando eu começava na critica nos anos 60 ainda, eu vi um filme chamado “Fabula” que achei fantástico. Foi feito no Brasil pelo documentarista sueco Arne Sucksdorff, que havia dado aulas no Rio (ele já havia ganho Oscar de curta metragem) e que eventualmente ficaria anos no Pantanal. A diretora Bárbara Fontes foi visitá-lo num asilo de velhos na Suécia (ele morreu em 2002) e fez uma fita super bonita, fazendo justiça a esse artista esquecido. Fiquei encantado com o média metragem (tem 30 e poucos minutos) e com a sensibilidade da moça.

“500 Almas” - Conheci o diretor Pizini como realizador de curta-metragens de arte há uns 15 anos atrás. Depois nunca mais o encontrei, se casou com Paloma filha de Glauber Rocha mas tive a alegria de ver que continua com um olhar cinematográfico, com uma mão, toda especial (é lógico que foi ajudado pela fotografia de Mario Carneiro mas este sozinho não faria nada). É realmente um artista. Este belo documentário de longa metragem (que é um pouco longo demais), fala de uma tribo de índios matogrossenses (terra também do diretor) de que nem a Funai tomava conhecimento. Em belas imagens, planos cuidadosamente construídos, ele retrata o drama dos descendentes, da língua nativa que desaparece (e todos esquecem), do líder que foi morto... tudo que poderia ser banal não fosse trágico.O filme também é original ao colocar atores (basicamente Paulo José com ponta de Matheus Nachtergale) dizendo textos oficiais (onde se questiona, por exemplo, se os índios tinham alma). Enfim, com Pizini, temos um grande realizador de documentários.

Marcos Palmeira - Quando era muito jovem, Marcos Palmeira passou uma longa temporada com os índios xavantes, depois que o pai Zelito Viana fez o documentário “Terra de Xavantes”. Agora ele juntou um grupo de amigos e equipe, para visitar novamente o território deles (convidado que foi para ajudá-los num momento em que estão tendo problemas de mortalidade infantil, cultivo da terra e outras situações). Num documentário co-dirigido por Palmeira, eles saem da fazenda do ator até a reserva. A principio parece uma missão estranha, meio missionária, como se eles fossem salvar os índios. Felizmente Palmeira é sincero e tem boa vontade e intenções, o que faz com que o filme vá melhorando, ao mostrar os hábitos e costumes, as festas e as explorações da região (Marcos funciona como uma espécie de guia de turista, já que a proposta parece ser virar um programa de teve). Os estrangeiros que estavam no júri porém não gostaram nada dele, desse lado de vamos salvar a pátria. Talvez porque, viram no ator apenas uma celebridade e não tivessem informação que o avalizava (os depoimentos dos membros da equipe por exemplo são banais e não interessam num festival de ecologia).

Olha quem estava também concorrendo ao Eco Cine!! - Foi assim que finalmente consegui assistir “Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida” (Brasil – 2004), com direção de Moacyr Góes. Foi o único filme brasileiro do ano que teve mais de um milhão de ingressos vendidos, mas mesmo assim esta abaixo do nível de Xuxa, que geralmente é superior a 2 milhões. Isso indica não apenas a queda de publico do cinema, a curva descendente da apresentadora mas principalmente o declínio de seus filmes. Já apontei a separação da produtora Marlene Mattos como fator disso mas parece ainda mais grave. Não sabem o que fazer com Xuxa, que chegou a uma idade perigosa. Esta quarentona e faz um papel ingrato, com cabelo curto, óculos de grau, roupas não sofisticadas. E quando vira Princesa se torna tão artificial, tão esquisita que fica difícil acreditar. Na verdade, achei o filme um desastre completo. Tudo ruim. O roteiro é pavoroso, muito mal construído, a produção deficiente (poucas externas, muito estúdio e uma mensagem ecológica que tem a sutileza de um martelo na cabeça da gente). Sua pretensão de ser Indiana Jones é derrubada pela cenografia deficiente (as provas que eles tem que atravessar até chegar ao tesouro são patéticas) e os estrangeiros que estavam no Eco Cine ficaram horrorizados com a resolução (que tem saudação à la nazista para um monte de gente pseudo loira, como se a raça deles fosse dominante e melhor). Não acho nem que foi proposital, foi descaso e irresponsabilidade. Porque não dá para levar a sério um filme que chega a deixar saudade daqueles que Renato Aragão e os Trapalhões faziam às pressas (que eram melhores do que isto). Há apenas uma única canção, Marcos Pasquim nada tem a fazer como o galã, casais românticos muito fracos (e o roteiro copia “Sonho de uma Noite de verão” de Shakespeare). A única figura que funciona é a do Curupira que ao menos faz teatro infantil. Um desastre total.

Por Rubens Ewald Filho