28
de setembro de 2003
AS
ESCOLAS E MOVIMENTOS CINEMATOGRÁFICOS - 1
Não
se pode separar as escolas e movimentos cinematográficos
do momento político e social que os originou. Todos eles
estão interrelacionados de forma estreita e conclusiva.
Um exemplo disso é a escola soviética de cinema
político que surge depois da Revolução Comunista
de 1917.
O
Cinema Político Soviético
Quando
os comunistas tomaram o poder, o Estado soviético
nacionalizou o cinema, pois achava que poderia ser um forte instrumento
de propaganda e ensinamento, sua proposta era fortemente ideológica,
pretendendo difundir as idéias comunistas por todo o mundo. É importante
também ter claro que através dos Partidos Comunistas
em diferentes países, os intelectuais e críticos
de cinema, com freqüência defendiam os filmes daquele
pais. Há casos de filmes consagrados em festivais exclusivamente
por ordem do chamado PC (Partido Comunista). Nascia assim o conceito
de filme politicamente engajado, ou seja, filmes com idéias
geralmente de esquerda, promovendo a revolução
e os ideais comunistas.
No
cinema soviético reuniu se um grupo de cineastas talentosos,
com muitas teorias, ainda que sempre à serviço
dos ideais alheios. Entre eles, Dziga Vertov (1896 1954), criou
um estilo de documentário inovador chamado Câmera
Olho, se opondo ao cinema de ficção. Mas curiosamente
mostra o mundo não como é, mas como deveria ser.
Ele explica, interpreta e reconstroi a realidade, exprimindo
a concepção comunista do mundo soviético.
Faz isso através de dois meios, os enquadramentos, por
vezes elaborados e sofisticados, sempre com um ponto de vista,
e a montagem, considerada como uma verdadeira escrita, permitindo
se unir ou opor os assuntos. Seu filme mais famoso foi “O
Homem e sua Câmera”, de 29, uma espécie de
manifesto das teorias da Câmera Olho.
Os
filmes de ficção também tiveram um tratamento
estético semelhante. Os planos com freqüência
são fixos e é a montagem que dá sentido
as imagens, reforçadas por câmeras altas e baixas,
rupturas de ritmo (câmera lenta, acelerada, closes). A
montagem paralela é a que causa mais impacto (por exemplo,
comparando os grevistas à animais abatidos em “A
Greve”). Recusando o sistema de estrelas americano, o cinema
soviético tem sempre uma mensagem política, utilizando
imagens muito fortes. Os nomes mais famosos são Serguei
M. Eisenstein, Vsevolod Poudovkine e Aleksandr Dovjenko.
Avant
Garde (ou Vanguarda)
A
França nos anos vinte foi uma época de efervescência
cultural, causada pelo após-guerra. Na primeira década
do século, o cinema industrial francês teve seu
apogeu inclusive com alguns cineastas brilhantes (como Max Linder),
mas nos anos vinte entrou em declínio, com o império
Pathé acabando se (fechando em 1930 assim como a Gaumont).
O que se fez na época de mais interessante foi a chamada
Avant Garde, que procurou fazer um cinema marginal em volta do
crítico e cineasta Louis Delluc. Eles buscavam um cinema
autêntico, experimental, influenciado pelo surrealismo,
fortemente influenciado pela literatura e pintura. A busca de
uma nova linguagem levou aos experimentos de Abel Gance, Jean
Epstein e Marcel L'Herbier. Essa primeira fase do movimento foi
chamada de Impressionista, porque se opunha ao Expressionismo
alemão. 1924, ano da morte prematura de Delluc, encerra
essa fase. A segunda vanguarda é influenciada pelo movimento
dadaísta e surrealista (que buscavam a espontaneidade
e o subconsciente), se opondo diretamente ao cinema comercial.
Tem
o gosto da provação, do delírio, da
abstração e seus nomes mais importantes são
Luis Buñuel e o pintor Salvador Dali, que fazem “Un
Chien Andalou”. Ao mesmo tempo, o diretor Rene Clair fazia
experiências
inovadoras inclusive com os primeiros filmes sonoros, que também
se inclui nesse mesmo movimento. Expressionismo
Alemão
Influenciado
pela pintura expressionista (cujo nome mais famoso é Van
Gogh), este cinema surgiu na Alemanha, procurando fugir do realismo,
tanto no plano estético quanto temático. A idéia é mostrar
o que personagem sente e não aquilo que vê. Seu
filme chave é “O Gabinete do Dr. Caligari” (de
Robert Wiene, 19), que é uma história contada por
um louco, por isso todos os cenários são deformados,
como seria mesmo a visão de uma pessoa alucinada (só se
descobre isso ao final, antes pensa se que o Caligari é um
perigoso seqüestrador de mulheres, depois vê-se que
era apenas o médico do sanatório).Usando telões
e figuras estilizadas, como numa pintura, o filme é o
padrão do gênero. Houve outros, mas menos rígidos,
como “O Estudante de Praga” (de Stellan Rye, de 13), “O
Testamento do Dr. Mabuse”, de Fritz Lang, 33, e “Nosferatu,
o Vampiro”, de Murnau , 22. Mas logo esses dois cineastas
superariam os limites desse movimento.
Numa
segunda fase do movimento, procurou se maior realismo sem dúvida por causa da crise econômica e social da
Alemanha, que favoreceria a ascensão do partido ultra
nacionalista de direita, o Nazismo, liderado por Adolf Hitler.
Na verdade, todo o movimento expressionista já prenunciava
o clima de insegurança que culminaria na ditadura. Fritz
Lang com o personagem de Dr. Mabuse e com “Metropolis”, é um
exemplo disso (anos depois ele fugiria da Alemanha às
pressas quando foi convidado para ser o chefe do cinema nazista
mesmo sendo judeu).
Os
melodramas sociais de George Wilhelm Pabst correm paralelo a
outros filmes com preocupações semelhantes como “O
Anjo Azul”, de Sternberg e “M., O Vampiro de Dusseldorf”,
de Lang. São chamados de Kammer-spiel (a câmera
como espelho).
Filmes
Nazistas
Curiosamente
os nazistas fizeram poucos filmes de propagada aberta, alguns
criticam e ridicularizam os judeus. Mas em geral os
filmes eram operetas para divertir as massas ou então
os chamados Heimat Films (filmes de aventuras alpinas misturando
patriotismo, nacionalismo, heroísmo, sentimentalismo,
exaltando a Mãe Pátria e a natureza). Os filmes
de propaganda aberta foram feitos com brilhantismo por Leni
Riefensthal, que continuou a se defender e negar que fosse
nazista. Ainda assim fez os documentários mais célebres
sobre o movimento, “O Triunfo da Vontade”, de 35,
sobre reunião do partido em Munique e “Olympia” (conhecido
também como “Os Reis do Estádio)”,
de 36, sobre os Jogos Olímpicos na Alemanha.
A
Chegada do Som
Em
1927, quando “O Cantor de Jazz” revolucionou
a indústria, o cinema mudo tinha chegado a seu apogeu
com uma série de filmes de alta qualidade e apelo universal
(todos entendiam um filme sem palavras e cada vez menos se usavam
letreiros explicativos).
Por
isso, os intelectuais foram contra o advento dos filmes falados
(os chamados "Talkies", que eram anunciados como “All
talking! All singing!” (todo falado, todo cantado) e durante
anos o criticaram, com alguma razão. Chegou ao extremo
de Charles Chaplin que foi o único a continuar fazendo
filmes sem diálogos, como “Luzes da Cidade”,
de 31 e “Tempos Modernos”, de 36 (embora este já tivesse
música e ruídos sincronizados e cantasse uma música
com palavras impossíveis de compreender). Seu personagem
Carlitos só falava justamente em o ultimo filme em que
ele pareceria, “O Grande Ditador”, 40, para fazer
um discurso contra o nazismo.
Mas
foi um exagero. Os críticos estavam certos porque
os estúdios não estavam preparados para a chegada
do som. As câmeras faziam muito ruído e precisavam
ser blimpadas (protegidas com capas de metal protetoras), toda
a técnica de interpretação dos atores tinha
que mudar (em vez de fazer caras e bocas, precisavam decorar
texto como no teatro, não era possível o diretor
dar ordens durante a filmagem, como acontecia antes, onde para
criar clima chegavam a ter orquestrar no set). Pior que isso,
muitos deles tinham forte sotaque estrangeiro ou voz ruim, afeminada,
o que não combinava com sua imagem. Muitas carreiras foram
arruinadas (como a John Gilbert, as Irmãs Talmadge), mas
alguns astros conseguiram fazer a transição sem
grandes problemas, como a sueca Greta Garbo. A culpa não
era só deles mas da deficiência técnica dos
aparelhos conforme pode ser confirmado no filme “Cantando
na Chuva”, 52, que relata tudo isso com muito humor.
Custou
um pouco para os cineastas irem se libertando dos ditames técnicos. Depois de recrutarem caras novas da Broadway,
atores que conseguiam dizer diálogos, foram alguns realizadores
que deixaram de fazer teatro filmado e provaram que não
era sempre preciso mostrar a origem de um som , voltando a mostrar
as vantagens dos momentos de silêncio. Entre esses inovadores,
destaque para Rene Clair na França, Fritz Lang e Josef
Von Sternberg, na Alemanha e no cinema americano, Rouben Mamoulian
e Lubitsch. Foram
eles que voltaram a provar que o cinema era um meio visual, onde
o diálogo, as falas, são meros acessórios.
(continua...)
Por Rubens Ewald Filho
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