DIÁRIOS DE NOVA YORK 2005 - 1ª PARTE

24 de fevereiro de 2005

Amantes do cinema assinei este manifesto, pois já fomos derrubados no Cidade de Deus, que provocou uma virada lá nos velhinhos dos filmes estrangeiros. Agora lá vêm, eles em nome do espetáculo, colocar o Antonio Bandeiras para representar a América do Sul. É, continuamos cucarachas. O manifesto me foi enviado pelo Walter Salles.

 

" Dos criadores e amigos de Diários de Motocicleta

Diários de Motocicleta é um projeto que demorou cinco anos para convertesse em realidade. Durante esse período, os atores e a equipe, provenientes principalmente da Argentina, Chile, Perú, México, Uruguai e Brasil, compartilharam o sonho coletivo de explorar as raizes da identidade do nosso continente. Produção independente da companhia produtora de Robert Redford, South Fork, Diários de Motocicleta é baseada nos diários escritos por dois jovens argentinos, Ernesto Guevara e Alberto Granado, que deixaram seu país de origem para descobrir a América do Sul. Diários de Motocicleta já foi visto sido por 10 milhões de espectadores ao redor do mundo. A película recebeu mais de 40 prêmios internacionais e/ou indicações, incluindo Sete nominações da Academia Britânica de Cinema, como também indicações para o Cesar francês e para o prêmio Goya espanhol, e duas indicações para o Oscar. Recentemente a produção ganhou um prêmio Goya de Melhor Roteiro Adaptado e, dois prêmios BAFTA (Oscar britânico) por, Melhor filme Estrangeiro e Melhor trilha Sonora. Uma das indicações ao Oscar foi dada ao filme por sua canção Al Otro Lado del Rio (O Outro Lado do Rio) ou The Other Side of the River. Composta e interpretada pelo brilhante artista uruguaio Jorge Drexler, Al Outro Lado del Río fala das opções morais e éticas pelas quais o jovem Ernesto Guevara optou quando se viu confrontado com as desigualdades sociais e políticas da América do Sul. É gratificante que a importante contribuição de Drexler ao filme tenha sido honrada desta forma.

De fato, é a primeira vez que, uma canção escrita e cantada em espanhol é indicada ao Oscar. Entretanto, para nossa surpresa, nos inteiramos recentemente que Jorge Drexler não seria convidado a interpretar sua canção na cerimônia de entrega do Oscar. Esta decisão unilateral, dos produtores de TV da transmissão do Oscar, foi tomada sem consultar previamente ao artista que criou Al Otro Lado del Río ou aqueles que trabalharam na película durante muitos anos. Fora isso, para substituir Drexler, os mesmos produtores de TV optaram por não considerar nenhum artista oriundo do continente retratado por Diários de Motocicleta. Nós, que estivemos profundamente envolvidos na criação e realização de deste filme durante os últimos cinco anos, gostaríamos de expressar nossa profunda insatisfação por aquilo que nos parece não só eticamente como também esteticamente inaceitável. A decisão que nos há sido imposta de um maneira autocrática não é somente uma falta de respeito pelo artista como autor, como também mostra um profundo desconhecimento das matizes culturais e as diferenças que existem no nosso continente. Durante o processo de realização do filme, nos demos conta de que a ignorância, com relação a quem somos e de onde viemos é no mínimo o centro de nossos problemas estruturais.

A maneira como nossa cultura é continuamente distorcida, fora de nossas fronteiras é parte integral desta equação. Tomando decisões baseadas, unicamente em valores de mercado sem nenhuma consideração, pelas diferenças culturais em jogo, os produtores do Prêmios da Academia levaram essa distorção, seja deliberadamente ou inadvertidamente, um pouco mais longe, e o fazendo hão demonstrado, lamentavelmente, uma extrema ignorância e desprezo pela natureza do trabalho, sua voz e o que ela comunica. Diarios de Motocicleta é uma película que trata sobre o respeito a identidade e à cultura de um povo - e não sobre a trivialidade do encobrimento de suas especificidades. É irônico que um aspecto artístico é chave do filme não está sendo respeitado justamente no momento em que se supõe que ela é honrada. Aqueles de nós que temos estado profundamente envolvidos no filme, reprovamos esta decisão."

Por Rubens Ewald Filho