OLGA

26 de junho de 2004

Certamente é o filme nacional mais esperado do ano. Perdi a conta das vezes que pessoas na rua me perguntaram se o filme era bom. Mas só fui assisti-lo na abertura do Festival de Gramado, onde foi muito aplaudido, mas acabou tendo péssimas críticas. Encontrei o Jaime Monjardim, que afirmou que iria me procurar para eu lhe dar, pessoal e posteriormente, uma crítica mais detalhada do filme. Até porque o conheço há muitos anos, desde o tempo em que era apenas o filho de Maysa. Mas se quisesse mesmo minha opinião, teria procurado antes do filme ficar pronto. Agora não adianta mais. Até porque Olga não é um projeto pessoal. Ele é apenas um diretor contratado, que foi chamado pela produtora e roteirista Rita Buzzar (mulher do ex-diretor Sérgio Toledo).

A seu favor podemos dizer que Olga é certamente o filme brasileiro mais bem produzido em todos os tempos. Tem extraordinária direção de arte, cenografia (toda feita no Brasil, num estúdio do Rio, onde fizeram as cenas de neve, que parece cair sem parar e sem provocar bafo quente nas pessoas). A fotografia é bastante cuidada. O problema maior é a escolha da trilha musical, que é certamente a pior que eu já ouvi num filme brasileiro recente. Invasiva, excessiva, enfatiza tudo da forma errada, sempre de forma retumbante e óbvia (foi feita pelo mesmo compositor das trilhas de telenovelas de Benedito Ruy Barbosa). Irrita e chega a tornar o filme difícil de tolerar.

Não há a menor dúvida que o diretor persiste na sua mania de filmar tudo em closes, por vezes redundantes (a ironia é que o filme talvez funcione melhor em DVD, em tela pequena). Não acho um grande problema ter cara de televisão, de seguir a narrativa no estilo global. O produtor sabia o que queria quando chamou Jaiminho. Os erros são outros. Estão já no roteiro (os diálogos são ruins, por vezes embaraçosos, o filme minimiza a figura de Luiz Carlos Pestes, chegando ao cúmulo de mostrá-lo costurando roupinhas, mas por outro lado não conta que mesmo com o ditador Getúlio Vargas matando Olga, Prestes o apoiará na eleição de 50!). O fato é que é muito difícil contar para um público contemporâneo o que seria um revolucionário fanático comunista. Engajado em luta armada, na revolução, ele sacrifica conscientemente sua vida pessoal e sua segurança pelo sonho utópico da Revolução. Assim, já na primeira cena, Olga aparece empunhando revólver e salvando um comunista de um julgamento. Mostra-se sempre fria e decidida (por isso, muito do que diz no navio não faz sentido, assim como seu comportamento quando se torna mãe; afinal, certamente houve um elemento de jogo, ao engravidar de pai brasileiro). Enfim, terrorista hoje mata gente e explode World Trade Center. É difícil simpatizar com gente que recebe o ouro de Moscou (Moscou financiava tudo e ditava ordens) para provocar revoluções, ainda que por ditas boas causas. Outro erro grave do filme é a decisão de falar português como se fosse a língua natural deles (assim, Olga não tem sotaque). Mas isso acaba provocando uma grande confusão (no Brasil, no grupo de revolucionários, o americano não tem sotaque, mas outros sim.

E quando ela faz discursos em Moscou falando português não poderiam incluir palavras em russo). Enfim, ficou uma salada. Quando vi A Casa das Sete Mulheres, Camila Morgado parecia uma opção interessante para o papel de Olga (para o qual chegou-se a pensar até em Meryl Streep). Mas ela não tem fôlego para sustentar um personagem tão difícil e complexo, talvez até por inexperiência. O fato é que não convence. Caco Ciocler chega próximo de Prestes (embora a preocupação parece ter sido querer deixá-lo de pequena estatura diante de Olga) sem o carisma do personagem. O resto do elenco é igualmente irregular (e inclui a santista Jandira Martini, fazendo bem uma colega de campo de concentração, em meio a outras figuras menos convincentes). O livro de não-ficção de Fernando Moraes foi um grande best-seller e é, pela própria natureza, muito melhor do que o filme. Não acredito que o público esteja sabendo direito do que se trata a história e é provável que, passada a promoção inicial (aliás, a campanha de lançamento da fita foi primorosa), se assustem com a história melodramática e trágica. Mas, no entanto, com pouca emoção.

Olga resulta frio apesar dos acordes bombásticos da trilha musical.

Por Rubens Ewald Filho