A PESSOA É PARA O QUE NASCE

17 de junho de 2005

É exatamente o que você pode esperar de um documentário sobre três velhas cantoras cegas nordestinas (de Campina Grande, PB) que ganham a vida na rua, pedindo esmolas. São três senhoras humildes e encantadoras (em sua humanidade, sem pose ou artifícios) que foram captadas pelas câmeras do diretor carioca desde 1998 (ele também usa material de arquivo desde os anos 60). Elas falam o que pensam (a fotografia nessa primeira fase tem bastante cuidado, o uso dos letreiros é criativo), relatam sua vida infeliz, mas sem grandes conflitos, mas o diretor não sabe onde acabar e vai esticando.

Elas vão à Bahia, depois a São Paulo, cantam com Gilberto Gil, visitam lugares e vêem paisagens (antes que me corrijam, é incrível a quantidade de vezes que elas mesmas usam a expressão “eu vi”. Na sessão do filme, por exemplo, disseram que iam “ver” o filme!). E ai começam a suceder coisas esquisitas e desagradáveis, como quando a mais velha confessa seu amor pelo diretor (o que consegue ser esclarecido, mas é um momento de desconforto). O filme tem até depois dos letreiros um adendo, mostrando as irmãs cegas recebendo a Medalha do Mérito Cultural dada pelo Presidente Lula.

O erro do filme, porém, é mostrar, quase ao final, as três irmãs se banhando inteiramente nuas numa praia paradisíaca. Obviamente seria uma visão ingênua, mas é uma cena que invade a privacidade delas, uma coisa que não estamos querendo ver e que dá uma sensação de que estão sendo usadas e exploradas de forma errada.

Dá um gosto amargo a esse documentário, que sem esse voyeurismo ficaria muito melhor.

Por Rubens Ewald Filho