OS PRODUTORES (The Producers)
 


23 de dezembro de 2005

Não procurem desculpas: Os produtores é um musical assumido, sem vergonha de sua origem teatral, que pretende fazer rir e preservar um grande sucesso do palco. Curiosamente é inspirado num filme (Aprenda a Perder Dinheiro ou Primavera para Hitler, de 1968), que revelou Mel Brooks e lhe deu um Oscar de roteiro original. E até hoje deixa suas marcas nesta versão, no cabelo puxado para o lado de Nathan Lane - na verdade uma homenagem ao criador do papel, Zero Mostel, e na histeria sem controle, estilo de humor característico de Gene Wilder.

Mas é Mel Brooks o verdadeiro autor e criador oculto do musical, autor tanto da idéia, dos diálogos, como também das canções e da produtora do filme (a ironia é a seguinte: este é um filme baseado numa peça, que foi baseada num filme sobre uma peça). Ele preferiu não dirigir, até porque está sob forte stress pessoal (sua mulher da vida toda, Anne Bancroft, faleceu recentemente). E apenas dublou a voz de um gato e de um figurante que diz (“Don´t be stupid, be a smartie...”). Quem realizou o filme foi a coreógrafa, que também o dirigiu a peça na Broadway, a estreante Susan Stroman, certamente sem intenção de abri-lo demais: raramente se vai para a rua e as únicas seqüências que foram realmente rodadas nas ruas de Nova York, são as das velhinhas e quando Bloom aceita participar do esquema e ambos dançam no chafariz, as duas no Central Park. Fora isso, tudo é estúdio, na verdade um novo estúdio que foi inaugurado com este filme, o Steiner Studios, no Brooklyn.

Fica claro que a preocupação maior é não mexer demais no sucesso para não estragá-lo. Assim, o elenco é basicamente o original (com Uma Thurman substituindo a anteriormente prevista Nicole Kidman, como a secretária sueca, e Will Ferrell fazendo o autor nazista), mas no tempo certo da piada no cinema, moderando (um pouco) a histeria, cortando algumas canções (a inicial, em que Max lamentava sua sorte, e que só aparece na trilha sonora como faixa bônus), e acrescentando algumas novas (duas nos letreiros finais, uma para ser indicada ao Oscar). Porém, o que esta na tela é basicamente o que ainda está no palco (vi o show duas vezes, uma na Broadway, ainda com Nathan e outra recentemente, na Argentina, com dois ótimos comediantes locais; ambas são contagiantes e muito prazerosas).

Assim, dá para notar alguma elipse, um ou outro detalhe criado e aperfeiçoado para o filme (por exemplo, o longo sibilo com que Roger Bart, como assistente/namorado do diretor recebe os convidados à porta). Só que ser fiel é, ao mesmo tempo, a maior qualidade e maior defeito do filme. Confesso que fiquei assustado com a abertura, igual ao palco, quando se registra a reação do público à estréia do novo show de Max Bialystock (soa falso, mal dublado e teatral, no pior sentido). Felizmente o filme se recupera graças à presença estrelar e magnífica de Nathan Lane, que está do tamanho certo para o cinema. Ele é muito engraçado, e uma indicação ao Oscar não seria demais (ele foi indicado ao Globo de Ouro). O mesmo já não se pode dizer de Matthew Broderick, que está envelhecendo mal, inchado e careteiro (talvez porque não se sinta muito à vontade, cantando com sua voz pequena). Está ficando distante o tempo de Ferris Bueller e isso choca um pouco.

Por outro lado, Will Ferrell tira o máximo do seu personagem. Para os conhecedores, o filme tem ainda pontinhas de estrelas da Broadway (Debra Monk e Andrea Martin como duas das velhinhas, o inglês John Barrowman como o tenor do número Primavera para Hitler). E a pior coisa do filme é, sem dúvida, sua incompetente legendagem nacional, que estraga piadas importantes (traduzindo gay como alegre, e em vez de “Break a Leg” / “Quebre uma Perna”, usando “Merde”), principalmente nas letras de canções.

Não vou dizer que é preciso gostar de musical para gostar do filme. Mas certamente ajuda muito.

Eu, particularmente, gostei muito, me diverti e, eventualmente, vou ver de novo.

Por Rubens Ewald Filho

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