10
de maio de
2005
Há pouco
tempo atrás foi exibido um documentário em nosso
circuito de arte, chamado Eu Fui Secretária de Hitler,
2002, que consistia basicamente em uma série de entrevistas
com a recém-descoberta Trauld Junge, uma mulher da Baviera
(ou Bavária) que serviu como secretária do ditador
Adolph Hitler nos últimos tempos de seu governo, já na
decadência e fim da Guerra. O filme não era mais
do que uma sucessão de depoimentos (um deles encerra este
filme) mas, por ser árido, foi muito pouco assistido.
Foi ele que deu origem a esta adaptação em superprodução,
que acabou sendo grande sucesso de bilheteria na Alemanha e finalista
do Oscar de filme estrangeiro.
Não
há dúvida que é uma história
importante, já que pela primeira vez temos detalhes dos últimos
dias de Hitler e do Nazismo, porque Trauld estava no Bunker e
foi testemunha de tudo. Por outro lado, é visível
que ela faz tudo para não se comprometer, dizendo que
era ingênua e confusa (o que soa altamente inconvincente)
e provavelmente inventando detalhes que “não lhe
sujassem as mãos”. Além disso, temos que
acreditar piamente no que ela conta, já que não
há outras testemunhas (embora
nos pontos básicos ela não fuja do que sempre se
contou). Também faz pensar na incompetência dos pesquisadores
que levaram 50 anos para encontrá-la (e pouco antes de
sua morte em 2002).
O lado
ruim do projeto também é que ele foi entregue às
mãos de um diretor altamente incompetente, que não
sabe escolher ou dirigir atores (alguns deles estão péssimos,
a maioria compromete e somente o veterano Bruno Ganz, como Hitler, é que
faz o papel com certa dignidade, ainda que não brilho,
sem cair em caricaturas). Não sabe criar clima, tensão
ou emoção.Faz
um filme feio, com estética de telemovie de televisão
européia. O mais estranho é que antes ele tinha
feito uma fita interessante chamado O Experimento! De
qualquer forma, o filme é decepcionante como cinema
(até mesmo como narrativa, já que prossegue por
quase meia hora depois da morte de Hitler, mas nem sempre se
preocupando em mostrar apenas o que a secretaria viu e ouviu).
Mas muito curioso como reprodução da história.
Não
há qualquer lógica em boatos de que
daria uma visão humana de Hitler, portanto amenizando
seus crimes. Ao
contrário, ele é mostrado como um velho de
cinqüenta e poucos anos decadente, sofrendo de Mal de Parkinson,
dado a ataques histéricos, completamente cruel e sem piedade
(dizendo que o povo alemão deveria pagar por ter perdido
a guerra), tendo delírios e sendo incapaz de enfrentar
os fatos e a derrota. E principalmente insistindo em se matar
e mandar todos os seus auxiliares próximos fazerem o mesmo,
sob pena de serem considerados traidores. Basicamente o filme é um
estudo sobre o fanatismo, principalmente na figura da Sra. Goebbels
(feita por uma péssima atriz) que mata friamente todos
seus filhos, mas tem um ataque histérico pedindo para
o ditador fugir. Fanatismo que ser reflete nos cidadãos
que estavam na rua matando a esmo os que consideravam traidores
e desertores, mesmo quando o exército russo está a
poucos metros da cidade. Em muitos oficiais que preferem morrer
porque fizeram um juramento de obedecer a Hitler. E uma das frases
mais fortes do filme, além do orgulho de Hitler em ter
matado tantos judeus, é o fato de que os nazistas chegaram
ao poder através de eleições, de meios legítimos
e não através de um golpe de estado. Ou seja, já que
o povo alemão escolheu esse tipo de governo, agora teria
que pagar por isso.A figura
de Hitler que vemos é um sujeito patético,
louco (mas não histérico), iludido e amado fanaticamente
por seus asseclas, que aceitam tudo sem discussão ou questionamento:
talvez seja isso que mais impressione, ninguém ousa questioná-lo,
enfrentá-lo, desmascará-lo. É uma ilusão coletiva que nos deixa pensando em
outros fanatismos atuais, seja em seitas religiosas à la
Jim Jones, ou no caso dos mulçumanos fundamentalistas.
Como o ser humano é frágil e pode cair em situações
como essa. E com freqüência assustadora.
A
Queda é medíocre como cinema, mas notável
como imprescindível lição de história
Por Rubens Ewald Filho
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