07
de fevereiro de 2006
Com
oito indicações para o Oscar® 2006,
este filme tem se tornado favorito para os prêmios
de melhor filme e direção (depois de
acumular sucessivas premiações).
Mais do que uma fita modesta (custou apenas 14 milhões)
e de arte, é um verdadeiro evento.
Caminha para se tornar um grande sucesso de bilheteria
(está com 51 milhões de dólares
de renda), quando nos EUA já virou mote de
piadas e assunto obrigatório de conversa.
Afinal mexe com uma figura ícone da cultura
americana que são os cowboys, só que
desta vez envolvidos num romance gay.
Mas não há nada de engraçado
ou gaiato no filme, que transcende o tema. Não é apenas uma história de
amor homossexual, mas uma fita séria, contemplativa
(o ritmo é propositadamente lento) que vai
tocar todo mundo que já teve um amor proibido,
e que não foi capaz de assumi-lo (por medo
ou por pressões familiares).
E que ao viver na mentira, não apenas destruiu
sua vida mas, a de todos ao seu redor.
O
Segredo de Brokeback Mountainé baseado
num conto, quase uma pequena novela de E. Annie Proulx
(autora de “The Shipping News” que rendeu
o filme Chegadas e Partidas).
O roteiro de Larry McMurty (de A Ultima Sessão
de Cinema e especialista em westerns) e
sua habitual parceira Diana Ossana, é extremamente
fiel ao texto original, tendo sido obrigado a criar
muitas situações e, visualizar outras.
Praticamente tudo que está na tela, é ao
menos sugerido pelo livro. Inclusive o final.
Mas o filme não teria dado certo sem a direção
de Ang Lee, um realizador oriental de grande sensibilidade
(por isso mesmo se deu mal com Hulk)
que já tinha feito um filme sobre o assunto
logo no começo da carreira (O Banquete
de Casamento de 1993, que o revelou).
O fato de ele ser um estrangeiro, e trazer com isso
um olhar diferente sobre a paisagem e a cultura do
Oeste atual, acabou sendo um fator positivo. Evitando
qualquer sensacionalismo mas, sem fugir do tema.
Brokeback Mountain é uma montanha
do Wyoming, para onde vão dois jovens cowboys
desempregados em 1963, contratados para cuidarem
das ovelhas de um rancheiro (Randy Quaid). O lugar é muito
frio, distante, solitário. Os dois rapazes
são calados e mal resolvidos.
Ennis Del Mar mal consegue se expressar (o ator Heath
Ledger fala para dentro, como se tivesse uma batata
quente na boca.É o Murilio Benicio americano).
Jack (Jake Gyllenhaal, obviamente já é mais
experimentado, sabe do que gosta.
Eventualmente, os dois fazem sexo e iniciam uma relação.
Mas quando termina o verão cada um vai para
seu lado sem se falarem.
Os dois irão se casar. Ennis com uma namorada
antiga (Michelle Williams, de Dawson´s
Creek) e Jack, dando o golpe do baú,
com uma garota filha de pai rico (Anne Hathaway,
que muda de tipo depois de ter sido estrela de Disney
com Diário de uma Princesa.
Aliás, sua participação é corajosa,
bem como de todo o elenco).
Condenados a uma vida de mentiras, os dois eventualmente
se reencontram (e talvez a melhor cena do filme seja
quando os dois não conseguem esconder a tensão
e desejo, quando do reencontro.
E a esposa de Ennis, os vê sem entender direito
o que está acontecendo.
Dali em diante, uma ou duas vezes ao ano, eles irão
se reencontrar passando uma temporada na Montanha.
Vivendo de mentiras, de solidão, sem coragem
de se assumirem (o filme e o conto deixam isso bem
claro na história de Ennis sobre um cowboy
efeminado que foi morto e enforcado pelo pênis,
que o pai lhe levou para ver quando pequeno).
Curiosamente
o filme resiste à tentação
de fazer uma abordagem romântica, ou melodramática,
embora a trama pudesse permitir isso (fiz um resumo
porque achei importante, mas não quero revelar
desfechos).
Tudo é distanciado, até um pouco frio,
mas talvez por isso, funcione bem.
Dá tempo pára o espectador raciocinar,
simpatizar com os personagens, entender a armadilha
de que não conseguem escapar.
Eles se tornam tão humanos, tão próximos
que não é um filme que se presta a
risos embaraçados (as cenas são razoavelmente
claras).
E o filme dá certo, embora não seja
exatamente perfeito.
Há um problema com a maquiagem, que não
consegue fazer os protagonistas envelhecerem vinte
anos de forma convincente.
Jake tem cara de gaiato, o que não permite
aprofundamentos e Heath fala pra dentro. Mas nada
disso, prejudica o resultado final.
Nem a força da conclusão ou o impacto
do filme. Que é o ponto de lança de
um ano muito bom de filmes ousados e políticos.
Por
Rubens Ewald Filho