A VOZ DO CORAÇÃO

21 de outubro de 2004

Se você faz parte da turma dos cínicos, nem passe perto. Porém, se é professor ou trabalha em ensino, vá correndo. Vai chorar desbragadamente. Ou no mínimo, se emocionar muito. Este filme francês, feito por gente pouco conhecida (até mesmo o ator principal, Gerard Jugnot, é um veterano humorista cuja fitas nunca passaram direito por aqui), acabou sendo o maior sucesso de bilheteria do ano por lá e foi até indicado pelos franceses para concorrer ao Oscar de filme estrangeiro. Não são apenas os franceses, mas o mundo inteiro que está precisando de uma boa história, com boa lição de moral (sem porém cair em pieguice). O curioso é que é uma refilmagem de outra fita esquecida, La Cage aux Roussignols (1945, de Jean Dreville), exibida no Brasil como Juventude Delinqüente. De uma certa maneira relembra uma velha tradição francesa, que são os filmes sobre internatos no estilo Zero de Conduta, de Jean Vigo. Tem o diretor um pouco corrupto e desinteressado, os empregados violentos, os alunos rebeldes. Mas a fita é construída no mesmo estilo de outra do mesmo ator e produtor, Jacques Perrin, Cinema Paradiso. Lá ele fazia um diretor de cinema famoso que retornava à sua cidade natal e relembrava o homem que influenciou toda sua vida. Agora é um maestro famoso que retorna para o enterro da mãe, e recebe a visita de um velho colega, que lhe mostra o diário do antigo professor de música, que por sinal ele tinha até esquecido, Clément Mathieu, um compositor mal-sucedido, um homem muito simples, mas muito honesto, bondoso, bem intencionado. E que resolve formar um coral no reformatório, mais para seu próprio prazer do que para reformar e motivar os alunos à beira da criminalidade. É lógico que você vai duvidar que isso funcione na Febem atualmente, mas é uma fita de época (no final dos anos 40) e tem até uma pequena história de amor (o professor se interessa pela mãe do seu aluno mais talentoso, o que parece também ter a função de mostrar que ele não seria gay).

De qualquer forma, se o espectador experiente perceber as velhas tessituras dramatúrgicas do dramalhão popular, é difícil não se envolver com um filme feito com tanta simplicidade, e que chega até mesmo a ser ingênuo. O que, de certa maneira, é delicioso nos tempos que correm.

Não duvido nada que fique entre os cinco finalistas ao Oscar.

Por Rubens Ewald Filho