ZAPEANDO
 
 

12 de dezembro de 2005

Normalmente quando falamos em trilhas sonoras, pensamos primeiro em música de cinema. Mas temos exemplos de ótimas trilhas compostas para outras mídias, como vídeo games e séries de TV. Na coluna de hoje vamos dar uma olhada em algumas trilhas de séries recentes de TV, que fazem sucesso também em DVD!

 


AS TRILHAS DA TELINHA: ALIAS, 24 HORAS E ANGEL

 

ALIAS – Música composta por Michael Giacchino. ALIAS - Codinome Perigo, um grande sucesso nos EUA e de boa aceitação no Brasil, onde é exibida na TV paga desde 2002 e também vem saindo em DVD, é uma feliz conjunção de acertos, que iniciam na atriz Jennifer Garner, que interpreta a agente secreta Sydney Bristow, e passa pela sua música incidental. Até o momento foram lançados nos EUA, pelo selo Varèse Sarabande, dois CDs contendo seleções extraídas dos scores da sua primeira temporada, compostos por Michael Giacchino (autor da trilha do grande sucesso Os Incríveis). O fato da série ter merecido álbuns exclusivamente de música incidental, ao invés da costumeira coletânea de canções, é algo a ser realmente comemorado, e um atestado da importância desta música no estabelecimento do tom e do ritmo do programa. Giacchino é um compositor versátil, que produz tanto música orquestral como eletrônica, e até recentemente era mais conhecido por seu trabalho em vídeo games (a série Medal of Honor e alguns títulos baseados em 007).

O eminentemente eletrônico "Main Title" de ALIAS, que abre os episódios e os CDs, foi composto pelo próprio J.J. Abrams, marcando a direção que seguiria a trilha sonora de Giacchino durante a série. No entanto, o compositor não utiliza este tema nos scores (até porque ele basicamente é um ritmo interpretado em sintetizadores, não tendo uma melodia propriamente dita), mas sim um de sua própria autoria - que, apesar de também ser eletrônico, possui um naipe de metais e é melodicamente superior ao de Abrams. Se formos comparar com o trabalho de outros compositores, poderíamos dizer que a música de ALIAS é uma bem sucedida mistura de Don Davis (Matrix) e de David Arnold nos seus scores para os últimos filmes de James Bond. Adicionalmente, as diferentes aventuras ao redor do mundo, mostradas em cada episódio, permitem a Giacchino compor músicas que espelham a linguagem musical típica de cada local. Um dos exemplos no primeiro álbum é "Spanish Heist", onde castanholas e violão flamenco acompanham uma composição típica e atraente, que também serve de tema para a agente inimiga Ana Espinoza. Os CDs, de um modo geral, alternam aceleradas faixas trance/techno acrescidas de samplers vocais, metais e cordas, com outras exclusivamente orquestrais com a predominância da seção de cordas, ouvidas nos momentos mais dramáticos. Como exemplos destas últimas, temos "Double Life" e "In the Garden" (melancólico tema ouvido quando Sydney está trancafiada em uma clínica psiquiátrica romena). A orquestra se faz presente também em momentos de tensão e suspense - preste atenção nos violinos sinistros de “The Tooth Doctor”, memorável na TV e no CD.

A alternância de ritmos corresponde às mudanças que acontecem no andamento dos episódios - Sydney parte para uma missão repleta de ação e suspense, e depois volta para casa para lidar com seus problemas emocionais e familiares (seu pai distante também é um agente duplo CIA/SD-6, e sua mãe, que pensava estar morta, era uma traidora que trabalhava para a KGB). Aprecio bastante as composições onde Giacchino combina a orquestra com os ritmos eletrônicos à la Arnold - como em "Sleeping Beauty", na qual ouvimos riffs de guitarra e metais típicos da música de James Bond. Nos scores de ALIAS, Giacchino usa e abusa desta e de outras referências cinematográficas, e o conjunto, em termos de música feita para a TV, fica acima da média e estabelece uma identidade musical marcante para a série. Claro que, como ocorre com a maioria dos álbuns extraídos de séries de TV, a música presente carece de desenvolvimento dramático, uma vez que as faixas são retiradas de momentos - episódios - separados.

 

ANGEL – Música composta por Robert J. Kra. A série de TV Angel, derivada de Buffy, A Caça-Vampiros, apesar de nunca ter atingido a mesma popularidade da série original, conquistou um grande número de fãs, que sempre esperaram pelo lançamento de um álbum com sua trilha sonora. Isso aconteceu em 2005, quase um ano após a exibição da quinta e última temporada do programa. Há dois fatos um pouco surpreendentes neste lançamento: em primeiro lugar, o do disco também ter saído aqui no Brasil, onde a série ficou relegada às madrugadas da Globo e só foi exibida, em horário decente, no canal pago Fox - sem falar que até agora ela é inédita em DVD por aqui (nos EUA já saíram as cinco temporadas); em segundo lugar, ao contrário de Buffy, que só recebeu discos com o tema e canções pop, o CD Angel: Live Fast, Die Never: Music from the TV Series, possui em sua maioria temas instrumentais de Robert J. Kral, o compositor principal das trilhas incidentais da série. Apesar de, na minha opinião, o trabalho de Kral não ser tão inspirado e atraente como o de Christophe Beck (compositor de três temporadas de Buffy e da primeira de Angel, e que se faz presente no CD com a faixa "I'm Game", da primeira temporada), deve ser reconhecida a sua capacidade de criar uma boa variedade de composições que, ora com samplers orquestrais, ora com acompanhamento eletrônico, forneciam o impulso musical que o programa necessitava. Fora a já citada faixa de Beck, o álbum possui seleções musicais da segunda até a quinta temporada, e inicia com uma versão longa, de três minutos, do tema principal de Angel interpretado pela desconhecida banda de Los Angeles Darling Violetta. Esta versão estendida, um belo e melancólico cello rock com vocalizações femininas, certamente surpreenderá e agradará àqueles que apenas conheciam a versão curta ouvida na abertura da série. O álbum é completado com canções de Vast, Kim Richey, Christian Kane (o "advogado do mal" Lindsay) e Andy Hallet - este, o intérprete do demônio verde Lorne. O CD possui um bom encarte contendo fotos do elenco e notas do criador de BUFFY e ANGEL, Joss Whedon, e de Kral. Cada faixa é comentada, situando-a em seu episódio específico.

 

24 Horas – Música composta por Sean Callery. A série de TV 24 Horas chegou em 2001 quebrando várias convenções televisivas e tornou-se um enorme sucesso. Cada episódio corresponde a uma hora de um dia atribuladíssimo na vida do agente da Unidade de Contra-Terrorismo Jack Bauer (Kiefer Sutherland). Os episódios apresentam ritmo e estilo visual único, e além disso, tanto a equipe de produção como o elenco são compostos por excelentes profissionais, o que dá ao programa um nível de qualidade excepcional. Em termos musicais, a trilha sonora necessariamente teria de acompanhar este nível e se adequar às propostas incomuns que a série trouxe à televisão, e felizmente a música que Sean Callery compôs para cada um dos episódios comprovou estar à altura dos demais elementos do programa. O envolvimento de Callery com 24 Horas, que já ganhou um Emmy de "Melhor Compositor" por seu trabalho na série, surgiu graças a um dos produtores, Joel Surnow, com quem ele já trabalhara em La Femme Nikita. Surnow acreditou que o compositor seria capaz de realçar a tensão das tramas de modo inovador, e acertou em cheio. Seja por orientação de Surnow, que não desejava um score eminentemente orquestral, seja por limitações orçamentárias e de tempo, Callery optou por criar a música da série principalmente em teclados eletrônicos, com várias inserções de samplers de orquestra e timbres/instrumentos específicos quando necessário, como voz humana, baixo elétrico e violão. Estruturalmente, Callery procurou fugir do óbvio, mas sempre realçando a tensão do espectador decorrente da insegurança quanto ao que iria acontecer na tela.

Como podemos constatar no CD com a trilha original da série, também lançado no Brasil, as faixas de suspense são lenta e progressivamente construídas, com ênfase sempre no estabelecimento de um ambiente musical tenso. Apesar de não buscar sobressair-se à ação, tornando-se intrusiva, a música de Callery está longe de ser uma audição monótona, como se poderia supor, já que ele utiliza uma grande variedade de ritmos, batidas e sonoridades (ouçam, por exemplo, "Jack On The Move" e "Jack In The Limo"). Há um conjunto de harmonias e construções de sound design que fazem dela uma audição muito interessante em CD, que inicia muito bem com a versão longa de "24 Theme", ouvido esporadicamente nos scores e nos créditos finais de cada episódio. Esta é a gravação original feita para o episódio piloto, até agora nunca disponível na íntegra, e que dá o tom que a música seguirá a partir de então. "Up and Down Stairs", que vem a seguir, é a mais atípica do álbum - apesar de haver outras músicas para cenas de ação, esta é a única que possui um ritmo genuinamente dançante. Falando em ação, "Copter Chase Over L. A." é provavelmente a melhor do gênero presente no CD, uma composição vibrante e quase que totalmente orquestral que não faria feio em nenhum filme. Mas nem só de ação e tensão vive a música de 24, como comprovam faixas como a emotiva "Jack Tells Kim He's Not Coming Back" e a dramática The Bomb Detonates".

O álbum contém músicas extraídas das três primeiras temporadas da série, além de um encarte com uma nota do produtor Surnow, várias fotos e comentários de Callery sobre cada faixa. Se você acompanha 24 Horas, neste CD você irá reviver musicalmente alguns de seus melhores momentos. Se não, mesmo assim vale a pena descobrir o recomendável trabalho de Callery.

 

Então caro leitor, por hoje é só. Daqui a quinze dias retornaremos com mais lançamentos em DVD que estão chegando na Região 1. Até lá!

Por Jorge Saldanha