A Complexidade das Personagens

O mundo fora do lugar repõe-nos em contato com um humanismo de filmar muito próprio da geração de realizadores alemães a que Von Trotta pertence

22/04/2017 00:38 Por Eron Duarte Fagundes
A Complexidade das Personagens

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É um prazer reencontrar o mais característico cinema alemão em O mundo fora do lugar (Die Abdhandene Welt; 2015), dirigido por uma das figuras exponenciais da arte cinematográfica germânica em qualquer época, Margarethe von Trotta. O cinema da Von Trotta se impõe por duas coisas essenciais: um rigor formal extremado e uma construção de personagem feita com uma complexidade sempre surpreendente. E ela o faz sem pedantismo intelectual: há uma naturalidade em sua forma cinematográfica que, ainda que bastante estudada, parece ter sido adquirida no ato de filmar. Uma fluência mental de que estamos, ao que parece, e há muito tempo, afastados no cinema. Esta fluência nunca é acadêmica: como o é habitualmente o cinema de todos os dias.

O mundo fora do lugar começa com a frustração duma criatura. A personagem de Katja Riemann está, com um colega, cantando numa casa noturna alemã, a sala quase vazia, os poucos presentes desinteressados, e é interrompida com brutalidade pelo dono do local, que a demite, ninguém se interessa pelos lamentos que ela canta, eis a argumentação. Como contraponto, vemos cenas duma cantora alemã, bem sucedida, que aparece nos palcos de Nova Iorque: na pele desta personagem, a grande intérprete Barbara Sukowa (uma espécie de fetiche do cinema da Von Trotta e que já foi a protagonista de Lola, 1981, uma obra-prima de Rainer Werner Fassbinder). Que é que liga estas duas mulheres que vão compondo narrativas separadas e interligadas num jogo às vezes paradoxal? A criatura de Barbara se assemelha à falecida mãe da outra cantora, a fracassada da noite alemã; o pai da fracassada se impressiona, e a filha vai atrás do mistério, rumando para Nova Iorque; então a cineasta, de maneira profundamente complexa, cria uma história familiar que traz à cena o irmão de seu pai e põe fogo na memória da falecida.

Com todos os quadros no lugar preciso, mas sem abdicar da sensibilidade para impor seu jogo cinematográfico, O mundo fora do lugar repõe-nos em contato com um humanismo de filmar muito próprio da geração de realizadores alemães a que Von Trotta pertence.

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro “Uma vida nos cinemas”, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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