Fez mal o diretor Terry Gilliam (do grupo “Monty Pythonâ€) em vir a público se queixando das interferências da produtora Miramax. Era melhor ter ficado calado porque assim deixa uma má impressão no espectador mesmo antes dele ver o filme. Tanto que as mudanças são relativas (obrigou-o a substituir Samantha Morton pela bela inglesa Lena Headey, que é uma figura charmosa. Fizeram ele mudar de fotográfo e mexeram na edição final. Mas tudo isso é normal dentro do sistema de Hollywood. E devia agradecer porque a Miramax veio salvar o filme quando a MGM o largou). Chegou ao cúmulo de parar o filme no meio, em junho de 2004 e rodar outra fita pequena nesse Ãnterim chamada Tideland.
Em
vez disso, era melhor ele ter cuidado mais do roteiro,
que é o ponto fraco desta filme curiosa,
que teve a idéia de usar os famosos escritores
de contos infantis, os Irmãos Grimm (já teve
filme a sério sobre eles, em Cinerama em 62)
como sendo dois vigaristas que viajavam pelo interior
encenando falsos exorcismos para extorquirem dinheiro
de nobres e ricos.
Até o dia em que são chamados para
enfrentar um caso real de magia negra, onde garotinhas
estão sendo seqüestradas para uma história
tipo Rapunzel / Bruxa de Branca
de Neve (quem faz
essa figura é a bela Monica Bellucci que pouco
tem a acrescentar).
Enfim, eles deveriam ser aventureiros e matreiros,
mas o roteiro é tão mal construÃdo,
que parecem duas crianças assustadas, sem
muita ação ou heroÃsmo, particularmente
Matt Damon que tem o papel mais ingrato e menos a
fazer.
O australiano Heath Ledger ao menos é o desajeitado
e sofrido irmão mais novo e compõe
um tipo (Damon fez bobagem quando concordou em trocar
de personagem com Heath pouco antes das filmagens).
Acho que o erro é construir o filme como farsa, como um conto de fadas de humor negro, durante a invasão francesa do que futuramente seria a Alemanha (fica tudo com cara de medieval embora estivessemos no século 18). Rodado na Checoeslovaquia, o filme certamente poderia ter um elenco mais ilustre caso não tivesse tido defecções (Johnny Depp, Nicole Kidman, Anthony Hopkins, Robin Williams, estiveram em algum momento envolvidos).
O que mais incomoda na fita é que as alusões às famosas histórias infantis são passageiras e não especialmente importantes. Acaba virando uma aventura gótica, com elementos de farsa (em particular aos cuidados de um grotesco oficial francês feito pelo sueco Peter Stormare, a quem eu achei totalmente sem graça).
Bastante movimentada, com alguns efeitos curiosos e algum clima, o filme não chega a ser um desastre. Mas também esta longe de ser o blockbuster que pretendiam (custou US$ 80 milhões, rendeu 35 nos EUA). Talvez por não ser exatamente infantil, nem precisamente para adultos. No meio termo, será uma diversão eficiente em DVD. O que hoje em dia, é o que mais importa. (Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos de 16 de outubro de 2005)
O cineasta norte-americano Terry Gilliam integrou o grupo de comediógrafos do famigerado grupo inglês Monty Python. E aquele humor escrachado e barroco, desequilibrado muitas vezes, irreverente sempre, acabou por marcar os filmes que rodou sozinho: Gilliam é um americano influenciado pelo formalismo britânico de seus companheiros de farra visual da década de 80.
Em seu novo filme, Os irmãos Grimm (The brothers Grimm; 2005), Gilliam volta-se para a personalidade literária de dois escritores germânicos irmãos do século XVIII, tentando fundir aspectos de sua vida na sociedade da época com elementos de seu imaginoso universo de ficção: o resultado se desequilibra facilmente, pois os exageros da fantasia estão mais para a superficialidade da série Harry Potter do que para uma apurada investigação de como a fantasia determinava os rumos da sociedade de então.
Os Grimm (Jacob Ludwig Carl Grimm e Wilhelm Carl Grimm) foram um caso incomum de dois indivÃduos que formaram uma personalidade literária única. A literatura é uma arte individualista, é a arte do ego por excelência; no cinema irmãos cineastas que formam um único ser é algo mais freqüente (os Coen, os Taviani), mas o cinema tem uma forma de manifestação mais coletiva, capaz de dissolver um pouco os egos; creio que os Grimm chegam ao cinema como uma paródia dos atuais manos-diretores.
Sem muita inspiração, a obra rodada por Gilliam circula em torno dos clichês, devendo satisfazer o público mais conformista. Gilliam caricaturiza sua direção de atores, tornando Matt Damon (que vive Wilhelm) e Heath Ledger (o intérprete de Jacob ou Jake) dois maneiristas palhaços de cena. A participação da bela atriz italiana Mônica Belluci no papel da Rainha Má (Mônica é especialmente lembrada pela dura e intransigente seqüência no filme francês IrreversÃvel, 2002, de Gaspar Noé, em que sua personagem foi impiedosamente estuprada) só serve mesmo para edulcorar uma narrativa falhada.(Eron Fagundes)