A proposta do programa pode ser sintetizada pelo título de sua hipnótica canção-tema, “A Perfect Lie” (Uma Mentira Perfeita), que pode referir-se tanto à busca pela aparente perfeição estética (no caso dos procedimentos cirúrgicos), como às próprias vidas dos protagonistas. Murphy e sua equipe de roteiristas souberam criar, além de histórias muito criativas, personagens cativantes, bem desenvolvidos e multifacetados. Sean é um cirurgião com cara de nerd, casado, certinho e conservador; já o bonitão e solteirão Christian, com suas roupas de grife, carros último tipo e vício por sexo, é praticamente seu oposto. A profunda amizade destes homens tão diferentes, que além de profissionais realizados são, principalmente, sujeitos cheios de conflitos, é a base sobre a qual a série se sustenta. Em vários momentos vemos essa amizade ser abalada, tanto por motivos profissionais como pessoais. Sean está em crise de meia idade e tem problemas com sua esposa Julia (Joely Richardson) e seu filho, enquanto Christian, que não titubeia em transar com todas as clientes (as jovens e bonitas, pelo menos), inveja seu amigo por ter uma bela família – na verdade, Christian é apaixonado por Julia, a quem namorou na época da faculdade. Ela, por sua vez, ainda é atraída por Christian, e sente-se anulada por ter abandonado a faculdade de Medicina para casar com Sean (no início da primeira temporada, inclusive, o casal está prestes a se separar). Por sua vez o filho de Sean, Matt, considera Christian o pai que deveria ter tido. De um modo geral o elenco defende os personagens (principais e secundários) de modo excepcional, mas sem dúvida Walsh (de Congo) e McMahon (visto recentemente como o vilão de Quarteto Fantástico e um dos nomes que foram cogitados para ser o novo James Bond) roubam a cena.
Como já referi antes, os personagens são multifacetados, e eventualmente tomam atitudes absolutamente inesperadas. Nestas ocasiões, por mais absurdas que sejam, a estupenda atuação dos dois atores, auxiliada pelos ótimos textos dos roteiristas, fornece toda a credibilidade (e, eventualmente, dramaticidade) necessária para que o espectador aceite suas ações. Sean por exemplo, apesar de conservador, rompe com seus preconceitos e aceita operar, gratuitamente, um transexual que quer mudar de sexo. Já Troy, que usa as mulheres apenas como objetos de prazer e é capaz de atitudes profissionais inescrupulosas, revela ser um cara extremamente humano ao criar e amar como filho uma criança que não é sua. Enfim, junte a tudo isso um humor ácido, lindas mulheres, cenas ousadas de sexo (pelo menos para os padrões televisivos) e algumas situações chocantes, e verá que Nip/Tuck é muito mais do que uma soap opera. Se ainda não conhece a série, confira este box de DVDs.