Crítica sobre o filme "King Kong":

Jorge Saldanha
King Kong Por Jorge Saldanha
| Data: 14/04/2006
KING KONG, o clássico de 1933, à época foi um marco do cinema fantástico e um prodígio da tecnologia cinematográfica. Há gerações vem maravilhando pessoas de todas as idades, e foi a inspiração de muitas que resolveram ingressar no mercado cinematográfico, como o mago dos efeitos stop motion Ray Harryhausen e o cineasta neo-zelandês Peter Jackson, que por anos sonhou em fazer sua própria versão do clássico. Celebrizado por sua premiada trilogia O SENHOR DOS ANÉIS, ele finalmente ganhou da Universal um cachê de U$ 20 milhões e U$ 150 milhões de orçamento para gastar no seu sonho. Ao final Jackson estourou o orçamento em mais U$ 50 milhões, mas até agora faturou aproximadamente U$ 600 milhões nas bilheterias mundiais (fora a já expressiva receita das vendas do DVD, estimada no momento que escrevo em mais de U$ 100 milhões), com um resultado indiscutivelmente à altura do projeto acalentado por décadas.

Para os que achavam que a tecnologia digital já tinha dado tudo o que tinha que dar, o filme é um assombro. A Weta Digital, empresa de efeitos do próprio Jackson, reproduziu com fidelidade a Nova York da Grande Depressão, colocou na tela uma impressionante Ilha da Caveira povoada de criaturas de pesadelo e criou um Kong como nunca se viu. Para Kong Jackson utilizou a mesma técnica que empregara para criar o Gollum de O SENHOR DOS ANÉIS: os movimentos e a voz do ator Andy Serkis (que no filme também interpreta o cozinheiro do navio, Lumpy) foram capturados e aplicados o macaco digital. Serkis estudou profundamente o comportamento dos grandes gorilas, e o resultado é de cair o queixo. Com um foto-realismo que mostra seu corpo peludo coberto de cicatrizes deixadas pelos combates com monstros pré-históricos, expressões faciais, sons e movimentos de um verdadeiro gorila, o Kong de Jackson é a criatura digital mais perfeita já surgida nas telas.

O roteiro é muito fiel à história original de Merian C. Cooper e Edgar Wallace, as mudanças na estrutura narrativa são mínimas - Ann agora é uma atriz do vaudeville, e Driscoll, que no original era um marujo, virou o roteirista do filme de Denham. São introduzidos alguns personagens secundários de maior relevo, e os principais tem a caracterização bem mais desenvolvida. As situações originais são expandidas, algumas até o ponto do exagero - a ilha fervilha de criaturas digitais, muitas horripilantes e remetendo ao passado trash de Jackson - outras, que foram escritas mas ficaram de fora do filme original foram aproveitadas, como o confronto com insetos gigantes no fundo da ravina. Mas de um modo geral, até o combate final de Kong com a esquadrilha de biplanos no topo do Empire State, o filme é uma carinhosa recriação expandida do original. Talvez recriação seja um termo inadequado: tributo ou homenagem me soam melhores.

Infelizmente, durante a produção houve uma baixa importante. O compositor Howard Shore, o premiado autor das trilhas da trilogia O SENHOR DOS ANÉIS, teve algumas "desavenças artísticas" com Jackson e, após cinco meses de trabalho, foi dispensado. Para o seu lugar o diretor escalou o sempre competente James Newton Howard, que em apenas cinco semanas compôs e gravou quase três horas de música. A partitura ficou ótima, mas pressinto que Shore teria feito algo melhor. Nos extras, Jackson diz que se Howard tivesse tido mais tempo, a partitura não teria ficado tão boa... Ironicamente Shore pode ser visto no filme, regendo trechos do score original de Max Steiner durante a apresentação de Kong ao público nova-iorquino.

Enfim, apesar de alguns excessos, como as suas três horas de duração, o KING KONG de Peter Jackson é um dos melhores filmes de entretenimento a atingir as telas em anos. E com ele e a trilogia de Tolkien, o diretor pode com justiça, desde já, ocupar o trono que já foi de Lucas e Spielberg.