Crítica sobre o filme "Johnny Vai à Guerra":

Eron Duarte Fagundes
Johnny Vai à Guerra Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 04/06/2006
Johnny está num hospital, cortaram-lhe os braços e as pernas, não ouve, não vê, não tem rosto, não pode comunicar-se com as pessoas, é apenas um cérebro que sente as coisas e tenta lembrar-se: trata-se dum mutilado da I Guerra Mundial, um jovem feliz antes do evento bélico que teve a infelicidade de ver seu corpo destroçado por uma granada. Em imagens de sombrio preto-e-branco Dalton Trumbo, o realizador do filme Johnny vai à guerra (Johnny got his gun; 1971), conta as estranhas relações do deformado de guerra com enfermeiras e médicos do hospital, em imagens coloridas Trumbo concretiza as evocações de seu protagonista dos tempos alegres de antes da guerra.

O desespero de Johnny tem semelhanças com aquele do personagem de O homem elefante (1980), de David Lynch: ambos são seres vitimados pela sociedade e explorados como figuras ridículas, quase circenses. Só que a visão de Trumbo é bastante mais cruel que a Lynch: enquanto em O homem elefante Lynch resgatava as possíveis manifestações humanas de seu “monstroâ€, em Johnny vai à guerra Trumbo coloca ao final o trágico futuro de seu herói, que, impedido de sair e ser mostrado, impossibilitado de matar-se, terá de suportar a consciência de seu estado até a velhice e a morte.

Lidando com elementos perigosamente melodramáticos e sem chegar propriamente a partir para as razões belicistas da sociedade humana, Dalton Trumbo faz o inventário das emoções dum espírito que já não tem as condições dum homem; e o drama de Johnny é suficientemente forte e profundo para nos tocar, assim como a interpretação de Timothy Bottons é límpida e segura para nos emocionar.

Sem ser “o mais perfeito filme antibelicista jamais feito†(afinal existe uma obra-prima como Glória feita de sangue, 1958, assinada por Stanley Kubrick), Johnny vai à guerra é, antes de tudo, o retrato miserável duma condição humana. (Eron Fagundes)