Crítica sobre o filme "Príncipes e Princesas":

Eron Duarte Fagundes
Príncipes e Princesas Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 24/06/2006
O realizador francês Michel Ocelot representa uma vertente da animação cinematográfica que se opõe àquele espírito de Carros (2006), o belo filme norte-americano John Lasseter, mas que americanamente está sempre de olho nas possibilidades comerciais de um divertimento para crianças. Quem acha que Carros é um filme para o espectador adulto em face de uma certa gravidade emocional de seu tema, nunca viu uma narrativa animada de Ocelot ou não tem a percepção exigida pelo diálogo entre imagens proposto por este cineasta gaulês.

Príncipes e princesas (1999), um notável agrupamento de seis contos à maneira arcaica dos velhos contos de fadas mas com uma linguagem desenhada deslumbrantemente moderna, é um bom começo para um confronto com Carros e aquilo que as realizações de Lasseter e seus pares ianques propõem. Não se trata aqui duma limitada avaliação hierárquica (o que é melhor ou pior), mas sim observar como duas orientações estéticas diversas podem ser produtivas para a análise e a criação de filmes. Carros fala da futilidade da arrogância de maneira simples, adrede ingênua e necessariamente superficial: é americaníssimo. Príncipes e princesas recaptura o gosto pelas antigas histórias da literatura de feitiçaria e folclore (os irmãos Grimm são citados numa linha de diálogo) e exercita sobre toda a ingenuidade da imaginação o refinamento de idéias sem nunca perder a perspectiva narrativa: é francesíssimo.

Ocelot é um mestre da pintura cinematográfica: tem mão fácil para transpor as linhas até o limite dum delírio poético-visual que arrebata o olhar. Evoluindo para certas complexidades apenas esboçadas no anterior Kiriku e a feiticeira (1998), Ocelot é, juntamente com o japonês Hayao Myasaki (A viagem de Chihiro; 2001; O castelo animado, 2004), um dos mais prestigiados diretores de animação do mundo. Merecidamente. (Eron Fagundes)