Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 07/02/2007
Ao filmar a vida de São Francisco de Assis em Francesco (1989), a realizadora italiana Liliana Cavani não foge à morbidez e ao sombrio de filmar caracterizados em O porteiro da noite (1974), sua obra mais discutida, onde se cruzam aspectos da encenação operÃstica do italiano Luchino Visconti com as linhas de sombra de uma certa fase do cinema do também italiano Bernardo Bertolucci; ela segue fazendo seu cinema com concessões dramáticas e narrativas que sempre aspiram a vôos maiores, os vôos espirituais que todavia ela nunca alcança plenamente. Neste sentido os excessos de trevas de Francesco diferem bastante da exultação e luminosidade de filmar de outra cinebiografia do santo, Irmão sol, irmã lua (1973), do italiano Franco Zeffirelli; também Cavani vai por caminho muito distante daquele rigor semidocumental do italiano Roberto Rossellini em Francisco, o arauto de Deus (1950), este sim atingindo integralmente a espiritualidade exigida por seu tema.
Sabe-se que a Cavani já andara antes em busca do sentido da vida de Francisco em Francesco d’Assisi (1966), com Lou Castel no papel-central; em sua nova incursão, valendo-se de astros de Hollywood, o misterioso Mickey Rourke e a contida Helena Bonham-Carter, além da participação de Andréa Ferreol como a mãe do santo, Cavani vai abrindo as concessões de seu cinema, realizando uma narrativa que nos deixa insatisfeitos por suas incompletudes estéticas e espirituais. A dublagem de Mickey e Helena por italianos funciona bem, mas há algo incômodo em ver um rosto conhecido como o de Rourke na pele de um ser tão mÃtico ou quase-mitológico como Francisco de Assis; Aldo Fabrizzi no filme de Rossellini, antes de seu autêntico estrelato, parece mais caracteristicamente descarnado, ainda mais dirigido pelo rigor de Rossellini a que Cavani não pode aspirar.
O filme é contado em flash back por um grupo de seguidores do santo que, tempo depois de sua morte, resolvem registrar em conversações e escritos a vida do lÃder espiritual. Francesco vai concluir-se com o primeiro plano de Helena Bonham-Carter referindo o amor de sua personagem ao protagonista. Depois, a imagem escurece e surgem os créditos finais. (Eron Fagundes)