Crítica sobre o filme "Só Deus Sabe":

Eron Duarte Fagundes
Só Deus Sabe Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 11/08/2007

A jovem atriz brasileira Alice Braga, de desempenho sedutor em Cidade baixa (2005), de Sérgio Machado, dá seus precoces passos iniciais numa produção internacional, Só Deus sabe (2006), dirigida pelo mexicano Carlos Bolado; reunindo capitais brasileiros e mexicanos e assumindo o formato de filme itinerante que percorre cenários mexicanos (Tijuana, especialmente), brasileiros (São Paulo e Salvador, com direito a travelling pelo túnel verde da avenida que dá acesso ao aeroporto da capital baiana, um túnel semelhante àquele da estrada que leva à praia gaúcha de Cidreira, filmado por Carlos Reichenbach em Dois córregos, 1999) e norte-americanos (Califórnia), Só Deus sabe mostra novamente a força da interpretação de Alice, capaz de segurar uma narrativa que se alonga demais e cuja superficialidade latina (mexicanamente melodramática) põe a perder os projetos de estudos de costumes latino-americanos, como a visão da religiosidade que surge já no misticismo do garoto no México e depois nas idas de Dolores, a personagem de Alice, aos candomblés da Bahia, onde por vezes chegamos a identificar a mão brasileira no filme à sombra de Nelson Pereira dos Santos.

O filme nunca deslancha, parece centrar-se demasiadamente no caso de amor entre Dolores e Damián, esquecendo o curioso retrato de costumes místicos que esboça. Alice (como já se percebera no belo Cidade baixa) parece estar um pouco interessada em seguir os passos de arrojo erótico de sua tia, Sônia Braga, cuja volúpia do corpo foi plasmada em filmes como A dama do lotação (1975), de Neville d’Almeida, e Eu te amo (1980), de Arnaldo Jabor. Mas Alice também humaniza mais o sexo em seus filmes que Sônia, que parecia mais “uma carne ambulante†nas realizações citadas; Alice parece dramaticamente mais escolada, ainda que se pudesse despojar suas interpretações de alguns vazios de encenação sexual (mas aí, quem sabe, estamos mais no terreno da direção de ator e um pouco de roteiro).

Só Deus sabe pode ser valorizado por sua iniciativa de co-produção latino-americana; mas perde a oportunidade de aprofundar os temas que aborda. (Eron Fagundes)