Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 15/08/2007
Em DomicÃlio conjugal (Domicile conjugal; 1970) o cineasta francês François Truffaut vai dar cabo da vida cinematográfica da personagem de Antoine Doinel, que começou esplendorosamente na mais criativa realização de Truffaut, Os incompreendidos (1959), que tratava da precária infância e dos tumultuados primórdios da adolescência. Em Beijos proibidos (1968), recém-saÃdo do quartel, surge o aprendizado sexual-sentimental de Doinel ao envolver-se com uma legÃtima dama francesa, vivida por Delphine Seyrig. Em DomicÃlio conjugal Antoine está casado com Christine, tem um filho bebê e acaba por viver um caso extraconjugal com uma japonesa, o que complica sua vida, antes da reconciliação final com Christine.
DomicÃlio conjugal está cheio do frescor narrativo de Truffaut e insere em seu roteiro o humor doce que o mestre de A noite americana (1973) sempre soube salivar para seduzir seu público. Mas no mesmo ano desta trama conjugal, Truffaut rodou um filme mais forte, O garoto selvagem (1970). A crise conjugal e o conseqüente adultério em DomicÃlio conjugal são expostos com uma sutileza frágil, sem a densidade dramática e psicológica de Um só pecado; parece ser um filme rápido, de passagem, muito bem feito como sempre, mas sem a agudeza plástica ou narrativa de quando Truffaut acerta no veio estético.
Por falar em Um só pecado, uma das cenas deste filme retorna integralmente em DomicÃlio conjugal. O casal está se separando, o homem está saindo de casa, a mulher lhe alcança um quadro da parede para levar entre suas coisas, o homem retruca que é um presente que deu a ela, após uma hesitação inicial ela recua e repõe o quadro na parede. Em ambos os filmes a cena é esta, quase plano por plano.
Jean-Pierre Léaud despede-se com sobriedade de sua personagem e Claude Jade é uma parceira adequada para esta despedida. O filme não me parece representar um grande salto na filmografia de Truffaut, mas a nenhum Truffaut se assiste com enfado: ele domina o meio cinematográfico desde sua função de observador (foi crÃtico de cinema e seus filmes, apesar de nunca engessados em fósseis crÃticos, são muito frutos de suas observações mais antigas e convictas sobre cinema) até o momento em que deve dispor dos meios materiais para executar sua arte. (Eron Fagundes)