Crítica sobre o filme "Anônimo Veneziano":

Eron Duarte Fagundes
Anônimo Veneziano Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 15/08/2007
Anônimo veneziano (Anônimo veneziano; 1970), dirigido pelo italiano Enrico Maria Salerno, é uma peça de câmara de duas notas que se multiplicam exaustivamente em suas variações ao longo deste autêntico concerto cinematográfico que é este filme de estréia de Salerno na direção. Notam-se as pegadas de elegância e sutileza, utilização dos cenários duma cidade para captar a melancolia das personagens. Onde o espectador já viu algo parecido? Em outro italiano, Valério Zurlini. Sabe-se que Salerno atuou como ator em Verão Violento (1959), uma das obras-primas de Zurlini. A plasticidade buscada por Salerno é a mesma que existe nos geométricos filmes de Zurlini, o que diferencia é que em Zurlini as composições de quadro + cenário se expandem na direção da profundidade, enquanto em Salerno os aglomerados compostos da cena muitas vezes produzem um efeito teatral ou das antigas telenovelas. Não que Anônimo veneziano não seja uma obra agradável de ver: é bastante bonito em suas articulações visuais, mas trata-se duma beleza que às vezes cansa e irrita.

Entre as virtudes deste belo filme, o dueto dos intérpretes centrais se salienta. Um nostálgico Tony Musante vive um maestro que, doença incurável, está prestes para morrer. Ele se encontra, numa deslumbrante Veneza, com sua ex-esposa, vivida com ajustada tensão dramática por Florinda Bolkan, uma atriz brasileira que fez carreira na Itália. Durante o tempo do filme, as duas personagens debatem-se nas diferenças de seu antigo relacionamento, compondo um mosaico amoroso refinado e educado (citações a Gustave Flaubert e a Marcel Proust surgem naturalmente). Em nenhum momento o filme levanta a voz, mesmo que os amantes se exaltem e gritem um com o outro, a câmara permanece em voz baixa. (Eron Fagundes)