Crítica sobre o filme "Búfalo da Noite, O":

Edinho Pasquale
Búfalo da Noite, O Por Edinho Pasquale
| Data: 26/03/2008
Todo e qualquer filme latino-americano merece ser visto. Ainda que, nem sempre, o que é produzido pelos vizinhos do Brasil seja de qualidade - e esta regra se aplica aos filmes brasileiros também, é claro. Mas geralmente o cinema latino-americano, com filmes de qualidade principalmente da Argentina ou do México, interessa. Na maioria dos casos, o que marca a produção vinda destes países é a qualidade narrativa, histórias interessantes contadas de maneira peculiar, normalmente valorizando as relações humanas, o trabalho dos autores e do diretor, com textos bem escritos e uma “humanidade†que muitas vezes Hollywood parece ter esquecido pelo caminho. Também é interessante perceber o olhar “atento†aos detalhes da maioria dos bons diretores dos países do Mercosul. Mas, como sempre, nem tudo que vem de um país ou de um continente entra no mesmo “balaioâ€, assume a mesma postura. Este O Búfalo da Noite, filme mexicano de 2007 com o conhecido Diego Luna no elenco, segue algumas qualidades do cinema latino-americano e, ao mesmo tempo, sofre com alguns deslizes que não são exclusivos de alguma “escola†de cinema ou de alguma corrente de produção, mas sim de uma crise de identidade que tem aparecido em vários filmes há alguns anos. Na verdade, El Búfalo peca por justamente querer ser “hollywoodiano†demais. Algo um pouco surpreendente, já que o homem decisivo por trás deste projeto, seu produtor e roteirista, é ninguém mais ninguém menos que Guillermo Arriaga, o responsável pelos três melhores roteiros que consagraram a carreira do diretor Alejandro González Iñarritu: Amores Perros, 21 Gramas e Babel.

O Búfalo da Noite trata, basicamente, de dois temas: amor e loucura. Olhando para a produção desta maneira, ela até pode parecer melhor do que realmente acaba sendo. No fundo, o filme vai bem até um certo ponto, mas depois se perde em alguns desvios nos quais não consegue mais se encontrar. No final você se pergunta: “E daí?â€, a respeito do filme, e encontra um grande ponto de interrogação como resposta. O final, especialmente, é muito fraco. Mas com ele, pelo menos, entendemos que o filme não passou disso, de uma viagem por meio de traições entre amigos, entre amantes, e nada mais. Toda a parte da esquizofrenia, da lealdade que vira simulação, do “búfalo†que sonha com as pessoas e das demais “pílulas†de possível filosofia ou “sentido escondido†no meio da história não passam de fumaça, de enfeite para uma história que é mais simples do que parece.

O começo do filme, embrenhado em um certo suspense, foi bem planejado. Até o primeiro “flashback†(retrocesso) da história, não sabemos se aqueles dois rapazes são apenas amigos ou se existe algo “escondido†naquela relação. Cheguei a pensar, pela troca de olhares e de diálogos entre Manuel e Gregorio no início do filme, que eles poderiam ser um casal gay. Nada mais distante da realidade. Na verdade eles são dois bons amigos que tiveram a amizade balançada e corrompida pela paixão por uma mesma mulher, Tania. Mas, como dizia antes, até o primeiro flashback sabemos que há algo de errado no ar, mas não sabemos o quê. Daí vemos as cenas dos amigos e de Gregorio com Tania no colégio e entendemos quase tudo… que os dois eram quase “irmãosâ€, inseparáveis; que Gregorio sofre com alucinações e que é apaixonado por Tania. Até o final do filme pouca coisa nos explica melhor os personagens principais.

Um problema do filme é que ele sofre do estigma do machismo que parece perseguir o imaginário latino. Sim, porque pela história Manuel pode ter vários casos e transar com quem bem entender - desde a irmã de Gregorio, Margarita, até a sua amiga Rebeca (Camila Sodi - que, convenhamos, aparece meio “do nada e para parte algumaâ€, uma personagem totalmente deslocada na trama) -, mas não pode aceitar nenhuma traição de Tania. Ainda que, neste caso, quem traiu primeiro foi ele a seu amigo Gregorio. Também descobrimos, conforme a história se desenvolve, que Gregorio sofria com a sua doença e, se sofria com a traição de Manuel e Tania, sofria calado. Porque em momento algum ele quis se vingar ou ter uma atitude destrutiva a respeito dos dois. Para mim os bilhetes que ele usa para “atormentar†- eu diria mais para informar - Manuel sobre o caráter de Tania através de Jacinto Anaya (Walther Cantú) tem mais a ver com uma demonstração de amor do que de vingança. Sem estragar surpresas, mas lá pelas tantas a história chega a um ponto em que descamba para a perseguição policial até o “grand finale†- que, claro, só reafirma o sentido do filme: nenhum.

Técnicamente falando, o filme está ok. Tem uma direção competente do venezuelano Jorge Hernandez Aldana, que assina o roteiro ruim junto com Arriaga. O filme também tem uma direção de fotografia cuidadosa e bem feita por Héctor Ortega, assim como uma boa edição de Alex Marquez. A trilha sonora de Omar Rodriguez-Lopez ficou exageradamente “distorcidaâ€, hollywoodiana, desenhada para um filme de ação, praticamente. Podia ter feito algo parecido, mas com uma voltagem um pouco menor. O elenco é competente, foi bem escolhido, com atores que não tem problema em encarnar várias cenas de sexo e nu explícito. Um filme com cara de “independenteâ€, mas sem a qualidade da maioria das produções do gênero. (Alessandra Ogeda – confira mais detalhes no blog Crítica (non)sense da 7Arte)