Crítica sobre o filme "Suspeito, O":

Edinho Pasquale
Suspeito, O Por Edinho Pasquale
| Data: 17/04/2008
Digam o que disserem a respeito de Hollywood, mas algo que eles tem de vantagem em relação a maioria das produções cinematográficas espalhadas pelo mundo - inclusive a brasileira - é a coragem de seus melhores roteiristas e diretores em falar de temas da atualidade. E temas delicados. No Brasil, por exemplo, alguém tem coragem de falar da corrupção política em um bom filme? Ou sobre a falta de distinção entre as lideranças de direita e de esquerda? Não, ninguém fala a respeito. E isso porque estou citando apenas dois temas atuais. Ok que Tropa de Elite é uma exceção, porque trata da violência no Rio, sobre corrupção policial e narcotráfico. Mas no demais, no Brasil parece que se vive em uma “censura†permanente, em uma ditadura que não terminou. Enquanto isso, nos Estados Unidos, se faz muito filme ruim e/ou de entretenimento apenas, é verdade. Mas também se produz filmes maravilhosos, alguns que são apenas entretenimento e outros que são um bocado filosóficos, mas existem outros que mexem em verdadeiros vespeiros. O Suspeito é um destes últimos. Ele não vai muito fundo no debate, eu admito. Mas conta uma história que incomoda, ainda que não seja baseada em fatos reais - mas que poderia ser. Parte do que se vê, afinal, é verdade.

Um dos pontos interessantes do filme é que ele nos deixa, desde o principio, na incerteza sobre o envolvimento de Anwar no ataque terrorista. A dúvida persiste quase até o final - ainda que, no fundo, como acontece com o personagem de Douglas Freeman, nos parece que tudo que ele confessar nas condições em que está será para terminar com a tortura e com a dor pela qual está sendo submetido.

O roteiro poderia ter recebido uma indicação ao Oscar. Especialmente pela “jogada†de mestre de Kelley Sane em contar duas histórias aparentemente simultâneas mas que, depois descobrimos, não são simultâneas. O interessante do filme é que ele questiona a política dos Estados Unidos adotada depois dos ataques ao World Trade Center em 11 de setembro de 2001. A partir daí, realmente, o governo norte-americano adotou uma postura que possibilita que absurdos como o visto no filme possam acontecer. Claro, como diz a senadora Corrine Whitman no filme, foi através de tortura e prisão arbitrária que eles conseguiram “salvar 7 mil vidas em Londres†(se referindo ao ataque terrorista na cidade que não deu certo), mas e todas as injustiças que foram praticadas em nome dessa segurança? E a morte sumária e injusta do brasileiro Jean Charles na mesma Londres? Eu aposto as moedas que tenho no bolso como muitos e muitos descendentes de árabes que vivem nos Estados Unidos há muito tempo, como Anwar, passaram por situações como a que vemos no filme, sendo torturados e/ou afastados de sua família apenas por suas origens.

Gostei da direção do sul-africano Gavin Hood. Acho que ele realmente mantêm o tom exato de ação e de drama, sem pender demais para um lado ou para outro. O filme tem bom ritmo e algumas sequências muito boas, com um cuidado técnico importante. Gostei especialmente do momento em que o personagem de Douglas Freeman questiona Abasi sobre a eficácia da tortura e pergunta se ele pode provar que cada pessoa que passa por experiência semelhante não alimenta 10, 100 ou mil novos inimigos para o seu governo. É a pura verdade. Ainda que nada justifique a violência, na minha opinião, mas se pode entender alguns atos extremistas quando se vê o abuso da outra parte. (Alessandra Ogeda – confira mais detalhes no blog Crítica (non)sense da 7Arte)