Crítica sobre o filme "Desaparecidos":

Edinho Pasquale
Desaparecidos Por Edinho Pasquale
| Data: 30/04/2008
O tráfico de mulheres e crianças para a prostituição é um problema grave e real, muito real. Quem vive fora do Brasil ou já viveu algum período de sua vida fora acompanha, uma vez ou outra, notícias a respeito de quadrilhas presas por esse tipo de crime. No Brasil os jornais também publicam algo a respeito, mas o destaque é menor. Afinal, no próprio país se sofre com esse tipo de crime sem ele ser, exatamente, de “exportaçãoâ€. Sem contar o fato que nos países europeus, nos Estados Unidos ou Canadá o tema ganha maior “importância†porque estes locais são os “alvos†de destino de mulheres, crianças e homens que acabam sendo vendidos como antigamente se fazia com escravos. Como disse Antonio María Costa, diretor-executivo do Escritório das Nações Unidas para as Drogas e o Crime, “o tráfico de seres humanos é a escravidão dos nossos diasâ€. Pois justamente sobre esse tema que trata Desaparecidos, uma produção com algumas falhas mas com grande boa vontade e, porque não dizer, com grandes qualidades.

Um ponto positivo do filme é que ele começa bem, muito bem. Afinal, o tipo de mentira que pregam em Weronika é bem usual. Há muitas empresas por aí que vendem “pacotes turísticos†ou “vistos de trabalho†e, no fundo, tudo isso é nada mais que escravidão. Isso porque essas mulheres que saem de países pobres com tais promessas chegam no outro país e viram escravas, normalmente da prostituição. Os países do Leste europeu e da América Latina (especialmente o Brasil) são os principais alvos destas quadrilhas para trazer mulheres e crianças para países como a Espanha, onde vivo. Também foi realista - ainda que menos - o sequestro de Adriana em uma rua da periferia do México. Se sabe que muitas quadrilhas realmente sequestram crianças e jovens em locais muito podres (isso quando não “compram†as pessoas de seus pais) para depois traficá-los como mercadoria.

Os problemas do filme começam depois do sequestro de Adriana. Afinal, como o irmão dela, Jorge, tem sorte, não? Fico impressionada. Por duas vezes, pelo menos, ele tem uma sorte fantástica! Vejamos: Cidade do México é uma metrópole, uma cidade gigantesca. E ele tem a sorte do garoto que pega a bicicleta da irmã passar justamente por ele pouco depois dela ser sequestrada! Uau!! Na vida real isso seria quase impossível, convenhamos. Além disso, quando o carro que ele está usando para seguir a quadrilha enguiça sem gasolina, outra vez ele tem uma sorte fantástica… Alguém pode dizer: “Ah, mas você está pedindo demais ao exigir lógica de um roteiro de Hollywoodâ€. Não se trata disso. Em filmes menos “sériosâ€, como suspenses, filmes de terror ou ação, eu já vejo a falta de lógica como um ingrediente quase básico. Mas em um drama como Desaparecidos, com o roteiro de Jose Rivera (indicado ao Oscar anteriormente pelo roteiro de Diários de Motocicleta) baseado em um artigo premiado do jornalista Peter Landesman, não aceito esse tipo de “facilidade†do roteirista… ou seja: já que é para ser realista, porque não cuidar dos detalhes? Ainda que tenha essas pequenas falhas, Desaparecidos merece ser visto, claro.

Além de tratar de um tema importante - e pouco tratado no cinema - como é o tráfico de mulheres e crianças para a prostituição, Desaparecidos é uma história interessante sobre a busca por justiça e por fazer a diferença para uma pessoa que seja. O conto dos irmãos Jorge e Adriana também torna a história forte e bonita. Interessante a busca do policial Ray Sheridan (Kevin Kline) por sua redenção pessoal. E, no final, ele descobre que pode fazer a diferença de outro modo… e, ao invés de se acomodar ou de assumir uma postura de “vamos olhar para todo o quadroâ€, que é a postura dos responsáveis pela lei em Nova Jersey (cidade para onde as garotas são levadas), ele resolve salvar ao menos aquela família de mexicanos que ele tem à sua frente. É um grão de areia no deserto? Pode até ser, mas mostra como um grão de areia faz toda a diferença.

Fora os pequenos deslizes, gostei do roteiro de Jose Rivera e da direção do alemão Marco Kreuzpaintner. Aliás, essa última, para mim, foi exata, como um cálculo matemático. O diretor, com apenas 30 anos, não exagerou no drama e cuidou de manter uma câmera firme, um olhar quase documentarista do que estava acontecendo - sem grandes “rebuscadas†de estilo e sem cair no fácil recurso de “dramatizar†demais as cenas, o que poderia ter sido feito com extensos closes nas vítimas e tal. (Alessandra Ogeda – confira mais detalhes no blog Crítica (non)sense da 7Arte)