A realizadora norte-americana Julie Taymor põe em cena, no filme Across the universe (2007), o mundo tenso e intenso de transformações sociais dos anos 60 no planeta a partir da comunidade jovem norte-americana. Como a cineasta não tem sangue revolucionário nem criatividade, tudo o que se vê ao longo duma narrativa de mais de duas horas padece do já visto; os rebeldes de quarenta anos atrás aparecem diante da objetiva de Taymor como figuras mofadas, datadÃssimas, pré-históricas, incapazes de angariar a paixão dum jovem de hoje. É certo que as juventudes de todas as épocas se parecem um pouco, o que pode facilitar a identificação pretendida pelo filme; e as músicas dos Beatles que embalam e costuram o conjunto de cenas são eternidades de emoção. Não é, porém, suficiente para segurar a barra fraca da realização.
A diretora rodara antes um pomposo e fracassado Frida (2002), que só o que provocava eram saudades da recriação da pintora mexicana feita nos anos 80 pelo cineasta mexicano Paul Leduc. O estilo superficial e brilhoso de Julie Taymor está de volta em Across the universe. O que se vê na tela é uma mescla de narrativa comum com musical; uma certa objetividade americana interrompida por personagens que cantam. Algo que Hair (1979), de Milos Forman, tornou definitivo e inalcançável. Mas não é somente a sombra da obra-prima de Forman que pode atrapalhar a fruição deste atrapalhado semimusical de Taymor; são as próprias pernas de Across the universe que estão mancas e tropeçam sobre si mesmas.
O jovem inglês que vai para os Estados Unidos nos anos 60 e dá com a revolução comportamental daqueles tempos, é aqui uma personagem estereotipada e fraca que nada ajuda a dar densidade dramática à narrativa. Seu caso de amor na América, longe de se inserir nas questões da época, vai servir a uma construção melodramática e escapista que parece marca registrada das facilidades de filmar da cineasta. A dureza da escusa guerra do Vietnã e os enfrentamentos sociais entre jovens e policiais são conformistamente edulcorados por Taymor. E, demais, a beleza visual buscada pela realizadora obedece excessivamente aos padrões de Hollywood.
Certamente todos os rebeldes dos anos 60 ainda vivos se inseriram no sistema; o que Across the universe faz agora é inseri-los num sistema fÃlmico convencional. (Eron Fagundes)