Crítica sobre o filme "Ligados Pelo Crime":

Edinho Pasquale
Ligados Pelo Crime Por Edinho Pasquale
| Data: 14/05/2008
O filme parecia interessante por vários aspectos. Começando pelo título original - algo como “O Ar que eu Respiro†-, seguindo pelo elenco (fantástico, diga-se!) e terminando pelo pôster. Quando vi uma arma com uma borboleta, pensei: “Hummmmm, que interessante antítese entre a violência e a liberdade…â€. Então comecei a assistir a Ligados pelo Crime e logo me deparei com Forest Whitaker em uma vida ferrada, sem perspectivas, mas que muitos veriam como uma “vida padrãoâ€. Em teoria ele tem tudo para ser feliz: trabalho, casa… mas, ainda assim, ele não quer esta vida. O começo é promissor. Nesta primeira parte, denominada “Happiness†(Felicidade), vemos pouco disto em cena… afinal, nada mais contraditório para a cena dele com uma arma na mão. Mas o problema é que o filme começa promissor, mas vai se mostrando vazio… algumas vezes, bem “fake†(falso), um tanto descompassado entre o que pretende ser e o que realmente consegue.

Inicialmente o site IMDb me enganou… ali eles colocam o nome dos quatro atores principais como Happiness, Pleasure, Sorrow e Love. Na verdade, os personagens principais, no melhor estilo de José Saramago, não tem nomes próprios. Eles são apenas pessoas identificadas por suas profissões e por seus atos, não por nomes. Exceto por Trista, o nome da artista, nenhum dos outros é chamado pelo nome. E detalhe: sabemos que o nome dela é falso. Ou seja: os roteiristas cuidaram de não colocar em nenhum deles um nome - talvez para significar que eles podem ser qualquer um de nós. Mas o fato é que os “sentimentos†Felicidade, Prazer, Tristeza e Amor estão ali para demarcar rupturas na narrativa, mas não para definir personalidades.

O diretor e roteirista Jieho Lee se inspirou em um antigo provérbio chinês para fazer o seu filme. Este provérbio prega que a vida está dividida entre os quatro sentimentos que dividem a história. Não por acaso ele coloca, no início do filme, a frase do teólogo libertário e abolicionista Henry Ward Beecher: “Nenhuma emoção, tal como uma onda, consegue manter por muito tempo a sua forma individualâ€. Uma coisa é certa: Ligados pelo Crime bate muito na tecla de que todas as pessoas estão conectadas - seria a razão do “ar que eu respiro†do título? - e que cada “modo de viver†influi no do outro.

O filme escrito por Lee e Bob DeRosa tem várias sequências muito boas, assim como sacadas inteligentes. Mas também tem muitos “espaços vazios†de sentido, com boas frases jogadas no meio de uma série de afirmações dispensáveis. Como eu disse lá no início, ele realmente começa muito bem, promissor, mas depois termina com um grande “e daí?â€. No fim das contas, dois dos nossos quatro personagens principais morrem e dois sobrevivem. Não entendi muito bem porque, em um filme em que nenhum dos quatro personagens principais tem um nome conhecido, existe tanta curiosidade sobre o verdadeiro nome de Tristan. E daí se ela se chama Patrícia, Isabela ou Joana? Ok, talvez seja uma maneira do diretor dizer que o nome é uma das nossas principais identidades e que descobrir o verdadeiro “nome das coisas†é a melhor maneira de conhecer a sua verdadeira essência - fazendo referência a Fernando Pessoa.

Mas vamos falar de acertos do filme: gostei de cada um dos “retrocessos†na vida dos personagens principais. Tecnicamente falando, o filme é muito bom. Especialmente pela fotografia cuidadosa de Walt Lloyd e da edição feita por Robert Hoffman. Eu diria que a fotografia e a edição, assim como a trilha sonora original de Marcelo Zarvos são os pontos altos do filme. Os atores também estão bem, no geral, ainda que, muitas vezes, eles pareçam muito caricaturais. Nenhum deles me convenceu de todo. Mas eu acho também que o roteiro contribuiu com isso, com algumas falas e algumas cenas desnecessárias ou “forçadasâ€.

No fim das contas, fiquei pensando sobre a arma com uma borboleta na ponta… se a borboleta simboliza liberdade e a “mudança†de um estágio de “feiúra para outro de belezaâ€, como mesmo comenta o personagem de Whitaker no início, porque ela está pousada sobre a arma? Será que o filme, por tudo que ele mostra, quer dizer que a transformação e a liberdade só podem surgir como resultado da violência? Ou ele seria uma ode ao conceito que de toda a violência que existe no mundo será transformada em beleza? Eu diria que esse pensamento, de que a beleza ou a transformação ou a liberdade serão frutos da violência é um tanto quanto assustador e perigoso. Eu acho que a borboleta existe antes da arma e continuará existindo - se não acabarmos com todas as espécies antes - depois que todas as armas forem jogadas fora. (Alessandra Ogeda – confira mais detalhes no blog Crítica (non)sense da 7Arte)