Crítica sobre o filme "Juno":

Eron Duarte Fagundes
Juno Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 04/07/2008

Marcado em sua utilização de cenários naturais pelas estações do ano (é um processo a que o cinema, arte visual, recorre de quando em quando; um dos pontos altos do valer-se das evocações das estações do ano para estruturar uma narrativa fílmica é o maravilhoso Amantes no meio do mundo, 1974, do suíço Alain Tanner), Juno (2007), dirigido pelo norte-americano Jason Reitman, é uma comédia dramática que se comunica facilmente com o público. Mas, embora ambientado nas esquisitices do universo jovem de hoje, está longe de ser uma bobagem infanto-juvenil.

Boa parte dos méritos do filme vem da espontaneidade que o realizador soube imprimir ao elenco. A espontaneidade nasce da própria escolha ajustada dos intérpretes (perfeitos para os tipos cênicos que representam) e se estende na maneira como Reitman os vai dispondo em seus quadros tão ágeis quanto enxutos. Apesar de uma certa característica de facilidade americana de filmar, às vezes se tem a fugidia impressão de que o diretor aprendeu alguma coisa da sutileza européia; com o francês Eric Rohmer, por exemplo, mas sem a intelectualização dos diálogos, deixando somente uma agradável banalidade do cotidiano. Rohmer talvez seja mesmo uma evocação demasiado pesada e filosófica para um cineasta que, em seu filme, em alguns diálogos, prefere citar o italiano Dario Argento e faz duas de suas personagens assistir a um filme de horror violentissimamente sanguinário.

Se a espontaneidade de interpretar é a chave da simpatia do filme, a jovem atriz Ellen Page, na pele da adolescente que engravida de seu patético namorado eventual e decide dar o bebê a um casal para adoção, está extraordinária e quase carrega a narrativa com uma energia poucas vezes vista no cinema americano de hoje. O tema central do filme —gravidez indesejada na adolescência— tem sido tocado aqui e ali pelo cinema; em A criança (2005), dos belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne, um casal de adolescentes tem o filho inesperado; se Bruno, o rapaz dos Dardenne, quer vender a criança a despeito de sua namorada, obedecendo a seus instintos criminosos, Paulie, o garoto de Juno, é uma figura acovardada, bloqueada diante dos ímpetos decididos de Juno, a garota que engravida; demais, os adolescentes europeus de A criança parecem perdidos no universo, enquanto em Juno a base familiar americana ainda existe. E os Dardenne são também mais duros e ásperos que Reitman em sua abordagem (docemente americana) da questão. O final de Juno não deixa de ser demasiado conformista e conciliador ao modo dos melodramas de Hollywood; mas isto não lhe retira um sopro até certo ponto original dentro das asfixiantes fórmulas do cinema que habitualmente vemos.