Crítica sobre o filme "10.000 a.C.":

Eron Duarte Fagundes
10.000 a.C. Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 24/07/2008

No fundo de todos os filmes (ou quase todos) sempre há uma história de amor. Pode ser um super-espetáculo histórico de Hollywood (onde a história de amor é por via de regra mais perceptível) ou uma criação experimental de um diretor europeu (onde só o processo de despir a linguagem pode tornar visível esta história de amor). As histórias de amor são assim vistas pelo romancista e crítico inglês Edward Morgan Forster: “Todos vocês sabem o espaço que o amor ocupa nos romances e, provavelmente, concordarão comigo que isto os tornou monótonos e causou-lhes danos.” Disfarçando seus melodramas em histórias de aventura e ação, Hollywood tem mantido sua supremacia e provado que o conceito de monotonia (repetição que convida ao sono) não afasta o público, não causa danos nas bilheterias.

10000 A.C. (10000 B.C.; 2008), o novo filme americano dirigido pelo alemão Roland Emmerich, é uma artificiosa aventura épica pré-histórica  com lances de heroísmos e bravatas que Hollywood sempre usou, mas aqui o realizador capricha para impressionar o espectador com a utilização de superplanos de conjunto facilitados pelas conquistas da era digital; é curioso como as possibilidades computadorizadas da linguagem do cinema atual permitem a um artesão comum como Emmerich adquirir aqui e ali ares (ainda que falsos) de criador cinematográfico. Neste aspecto, 10000 A.C. surpreende o observador, pois o cineasta atingiu um nível de realização bastante mais apurado que o que se viu em seus filmes precedentes (Independence day, 1997; Godzilla, 1998; O patriota, 2000; O dia depois de amanhã, 2004); não é muita coisa, o filme está longe de ser um espetáculo para perdurar, mas abre alguns créditos para a esperança de que Emmerich venha a rodar algo mais pessoal, menos industrial. 10000 A.C. não deixa de conter muita ação e pirotecnia, como convém, mas há algo de mais pensado e vagaroso na encenação que poderia remeter às origens germânicas do diretor. Nada muito convincente ou sólido, mas que torna seu produto atual melhor encaminhado que os anteriores.

Entre as debilidades do filme, o elenco é tão primário quanto as  emoções que os rostos dos atores e os diálogos carregam. Steven Strait e Camilla Belle (é filha duma brasileira e sua brejeirice caracteriza a etnia) precariamente desenvolvem suas personagens, transformando-as necessariamente em títeres.

O que se esconde por trás da falsa epopéia histórica grosseiramente encenada por Emmerich é a história de amor entre o jovem caçador D’Leh e uma garota de outra tribo, Evolet,; no caminho deste amor, inevitáveis percalços, com vilões e gigantescos animais pré-históricos. A capa modernosa da digitalização de 10000 A.C. não escapa de um mergulho nos arcaísmos mal alinhavados duma antiqüíssima história de amor. Sem o engenho visual do italiano Mario Bava em Hércules no centro da terra (1961) ou o refinamento britânico de John Boorman em Excalibur (1981), Emmerich faz seu amadorismo teutônico ser perversamente engolido pela pompa de um espetáculo à grande. (Eron Fagundes)