Crítica sobre o filme "Rolling Stones: Shine a Light":

Rubens Ewald Filho
Rolling Stones: Shine a Light Por Rubens Ewald Filho
| Data: 13/08/2008

Martin Scorsese tem um passado ilustre como diretor de shows musicais: foi montador de “Woodstock†(1970), dirigiu o famoso “O Último Concerto de Rock†(‘The last Waltz’ - 1978), realizou o clip “Bad†(1987) com Michael Jackson, No “Direction Home: Bob Dylanâ€, um episódio de “The Blues†(2003), o que o qualifica para ser chamado a registrar este show dos ‘Rolling Stones’, que foi o primeiro documentário a abrir uma edição do ‘Festival de Berlim’ - este ano. Gravado com 16 câmeras, em duas noites consecutivas, no relativamente pequeno e íntimo teatro Beacon Theatre de Nova York, em beneficio de uma causa do ex-presidente Clinton (que aparece cumprimentando os roqueiros e fazendo uma pequena introdução ao show, no palco).

Não se pode dizer que o filme tenha alguma coisa de pessoal do diretor. Tanto que ele já começa falando que fez o set pensando que era isso que os ‘Stones‘ queriam (mas nenhum deles gostou), recebeu a lista e ordem das canções em cima da hora (ou seja, embora tenha tido muito pouco tempo para estudá-la, o resultado é impecável). E o que faz de mais interessante é uma longa caminhada ao final, com câmera subjetiva, quando saem do palco e vão para a rua, com uma virada para os luminosos (acho que é o único ‘tour de force’ do filme). Sem dúvida, a fotografia é esplêndida, com os melhores do gênero e a ajuda de Albert Maysles, que fez o lendário “Gimme Shelter†(1970) com os ‘Stones‘. Fora disso, obviamente, é preciso gostar do grupo para curtir o show, que traz seus maiores sucessos (até ‘As Tears Go By‘). As câmeras não perdem um instante, registram tudo com precisão, sem se preocupar muito com a platéia, que aparece de background.

Há poucos testemunhos e, ainda assim, antigos, no começo e no final do documentário, quando Mick Jagger diz, para o entrevistador Dick Cavett, ser capaz de se imaginar fazendo shows aos 60 anos. E ele em cena é um demônio, sem parar um minuto, num show de vitalidade e garra, difícil de igualar. É curioso como eles todos estão muito envelhecidos, principalmente de rosto, pagando o preço pela vida de sexo, drogas e rock n´roll. Mas isso não interfere no resultado, que não é bem um documentário; é mais um show filmado (e muito bem). (Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos de 4 de abril de 2008)

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Diretor de alguns maiores documentários de música da história do cinema, como O último concerto de rock (1978), Feel like going home (2003) e No direction home: Bob Dylan (2005), o norte-americano Martin Scorsese chega agora a nova realização do gênero, acompanhando muito de perto com sua câmara as evoluções no palco do Beacon Theatre  do grupo de rock Rolling Stones em The Rolling Stones: shine a light (Shine a light; 2008). Scorsese é um mestre de filmar e une admiravelmente música e cinema em seu novo documentário; discreto e preciso, não faz pirotecnia cinematográfica para amaciar os efeitos de sua objetividade documental sobre as cabeças que não curtem o rock e possam eventualmente aborrecer-se com a musicalidade constante e trêfega que se apresenta em cena; também não se apaga como diretor, a despeito do estrelismo enérgico de Mick Jagger, Keit Richards e sua turma, mostrando sua perícia em captar a essência do espetáculo que se está encenando (o espetáculo é tanto o show musical dos Stones quanto o filme musical de Scorsese).

Feito para atingir mais diretamente os sentidos do observador, Shine a light é um luminoso reencontro com o cinema de Scorsese; e certamente aqui o cineasta é mais inventivo e inquieto que em seus mais recentes filmes de ficção, os quadradões O aviador (2004) e Os infiltrados (2006). Sem chegar ao delírio fílmico de No direction home: Bob Dylan, este Shine a light é mesmo assim portador de densas emoções musicais e cinematográficas. Inserindo na montagem basicamente centrada no show cenas antigas dos Stones bem mais jovens fazendo declarações provocativas e irônicas, Shine a light estabelece o contraste aparente entre a juventude e a velhice dos roqueiros, mas mostra que o conceito de velhice parece ter mudado depois dos anos 60, pois há ainda as mesmas almas jovens que impulsionam os já degenerados corpos. Scorsese, o diretor, aparece dirigindo as cenas no prólogo e no epílogo do filme.

Enfim, um prato cheio para quem se delicia com música e com cinema. (Eron Fagundes)