Crítica sobre o filme "Enigma de Andrômeda, O":

Jorge Saldanha
Enigma de Andrômeda, O Por Jorge Saldanha
| Data: 04/10/2008

O escritor norte-americano Michael Crichton notabilizou-se por escrever populares livros de ficção científica, que já venderam aproximadamente 150 milhões de cópias em todo o mundo - muitos, posteriormente, transformados em filmes. Os mais lembrados hoje sem dúvida são os da franquia Jurassic Park, porém tudo começou no início dos anos 1970, quando seu livro The Andromeda Strain foi adaptado para o cinema. O livro já mostrava as principais características do autor, em especial sua capacidade de desenvolver uma trama fictícia firmemente baseada na ciência – ainda que esta, via de regra, fosse convenientemente manipulada ou distorcida para atingir os objetivos da história. Algo similar ao que eficientemente faz Dan Brown com a história, especialmente em O Código Da Vinci.

O Enigma de Andrômeda (The Andromeda Strain, 1971), o filme, foi dirigido pelo veterano Robert Wise, que em 1951 estreara na função com o clássico sci fi O Dia em que a Terra Parou, e em 1979 levou as aventuras da tripulação da nave estelar Enterprise à tela grande com Jornada nas Estrelas – O Filme. Foi o primeiro filme a tratar de uma contaminação por formas de vida alienígenas, e sua direção seca e fria deu o tom exato que a trama de Crichton exigia. Lembro perfeitamente que quando assisti ao filme pela primeira vez, na TV, estava legitimamente tenso e exasperado com a corrida contra o tempo para se descobrir a verdadeira natureza do vírus, e a chave para a descoberta de uma cura. O longa acabou recebendo duas indicações ao Oscar de 1972, e ao longo dos anos revelou-se, se não um clássico do gênero, pelo menos uma respeitada e cultuada realização.

Agora, 37 anos depois, o livro de Crichton ganhou uma nova adaptação, produzida pelos irmãos diretores Ridley e Tony Scott para o Canal americano A&E. A produção, dividida em duas partes de aproximadamente 90 minutos cada (Noite 1 e Noite 2), procura atualizar e expandir a obra de Crichton. Deste modo, agora a equipe de cientistas busca desvendar o mistério do vírus no melhor estilo CSI, a trama é politizada, eventos contemporâneos (uso de armas químicas por Saddam, o programa nuclear norte-coreano) são citados, e violência mais ao gosto das platéias de hoje é adicionada. Contudo, a nova versão perde muito do clima de suspense e corrida contra o tempo do original, porque o foco se dispersa na introdução de mais uma das “teorias da conspiração†que viraram clichê após a série Arquivo X. No caso, ela envolve a corrida armamentista e o uso de armas biológicas.

Como seria de se esperar, a minissérie foi comparada ao filme de 1971, e por isso muito criticada. Da minha parte acho que nisso deve ser dado um desconto, afinal o filme foi dirigido por um mestre do gênero, e queiram ou não cinema e televisão, ainda que muitas vezes andem de mãos dadas, são mídias distintas que apresentam linguagem e características próprias – isso sem falar nas quase quatro décadas que separam uma realização da outra. Tendo isto em mente, fica mais fácil aceitar os clichês e o elenco medíocre, encabeçado por Benjamin Bratt e que inclui Eric McCormack, da série Will & Grace (deslocado no papel de um repórter viciado que quer revelar a verdade sobre o caso), Christa Miller de Scrubs, Daniel Dae Kim de Lost, e um quase irreconhecível Ricky Schroder, que teve seu momento de glória ainda criança no melodrama de Franco Zefirelli O Campeão (The Champ, 1979), no papel de um militar integrante da equipe do Dr. Stone.

O diretor Mikael Salomon, que já foi diretor de fotografia em filmes como O Segredo do Abismo (The Abyss, 1989) faz um trabalho decente, e em que pesem as longas cenas de bastidores políticos, consegue manter a trama fluindo num ritmo satisfatório. Os valores de produção são muito bons, e como seria de se esperar em determinados momentos são usados efeitos CGI, de qualidade variável. Talvez o ponto que mereça maiores críticas seja a mudança da origem do patógeno Andrômeda e o desfecho da trama, totalmente diferentes da obra original. Mas enfim, visto como o que realmente é – um longo e bem produzido telefilme – este novo O Enigma de Andrômeda, indicado ao Emmy nas categorias de maquiagem e edição, é um satisfatório e inofensivo entretenimento.