Crítica sobre o filme "Identidade Roubada":

Edinho Pasquale
Identidade Roubada Por Edinho Pasquale
| Data: 03/12/2008
Tem filmes que realmente não me convencem. Este Identidade Roubada caiu no meu colo porque era um lançamento deste mês fácil de conseguir… depois acabei me animando, nos créditos iniciais, ao ver os nomes de Susan Sarandon e Sam Neill. E até que o filme começa bem, mas depois ele se perde de uma maneira… com títulos assim, fico pensando: Será que a diretora realmente perdeu a mão no meio do caminho ou os atores bacanas que fazem parte dele simplesmente fizeram uma escolha ruim?

Basicamente este filme segue a seguinte fórmula: tudo o que ele parece querer fazer o espectador acreditar é, na verdade, o contrário. Por isso mesmo achei o roteiro da também diretora Ann Turner tão fraquinho.

Bem, o filme começa bem. Gostei daquela idéia de arte misturada com sanidade ou a falta dela no início. Devo admitir que contribuiu muito para essa minha primeira impressão positiva a presença da música Time After Time meio que no início da história. hehehehehehehehe. Além disso, admito, a direção de Ann Turner é muito cuidadosa e detalhista - ponto positivo.

O filme realmente tem um ritmo interessante no início, quando os personagens são apresentados para o espectador. Quando os primeiros acontecimentos “estranhos†ocorrem, Identidade Roubada ainda segura um ritmo interessante. Afinal, seria normal uma dona-de-casa super atarefada e que perdeu a mãe recentemente esquecer de que desligou o ferro de passar ou a filha dela perder o bichinho de pelúcia que ninguém consegue encontrar. Mas a partir da festa em que Mara e o marido Jimmy (William McInnes) recebem vários convidados em casa, inclusive o casal Sophie e Craig, o filme parece desandar.

Primeiro que ele perde muito o ritmo, fica meio “sem ação†em vários momentos - ou, para ser mais justa, com uma ação morna, quase uma crise criativa resumida a um “deixar rolar†em uma visão contemplativa da vida da dona-de-casa Sophie. Chega a ficar chato, bem chato. Ao mesmo tempo, fica um pouco esquizofrênico, com a história de uma aproximação estranha da personagem da Mara. Se bem que, até um certo ponto, o roteiro até nos faz pensar se a visão desta aproximação estranha não seria uma “deturpada†da mente um tanto desequilibrada da provável narradora da história, que seria Sophie. Mas, na verdade, o filme não é nada conceitual ou complicado. Pelo contrário.

No final das contas, ele acaba sendo bem arrastado em muitos momentos, tentando imprimir um clima de tensão que muitas vezes não cola. Não convence. Como na maior parte das discussões do casal Sophie e Craig. Adoro os atores que interpretam os personagens. No fundo, eles até estão bem em seus papéis. Mas o roteiro realmente não ajuda. E fora os momentos de puro tédio - disfarçado de uma tensão mal fabricada durante o filme -, Irresistible força a barra em uma ou duas “reviravoltas†na história bastante estranhas. Vejamos:

1) Curioso que toda a vez que “alguém†entra na casa da família de Sophie, ninguém consegue flagrar esta pessoa - exceto uma vizinha um tanto velha e com uma memória “ruim†-, mas a primeira tentativa da personagem principal em entrar na casa de Mara termina em flagrante e no juizado. (SPOILER - não leia se você ainda não assistiu ao filme). E estranho, para dizer o mínimo, que Sophie tenha entrado na casa da família de Mara quando esta saiu para levar as filhas para o colégio e que, em seguida, a própria Mara tenha voltado para casa e flagrado a invasora. Achei uma forçada de barra desnecessária - afinal, bastava que Jimmy flagrasse a mulher na casa deles. Depois, quando Mara realmente se revela ao trancar Sophie no porão, algo não se encaixa na loucura da personagem: se ela fez tudo que fez para se aproximar da mãe que a rejeitou, qual era a lógica dela de querer matar a progenitora? Ou será que ela queria apenas “vingar-se� Se fosse isso, uma vingança, porque ela não tentou dar o golpe certeiro antes? Ok, até que parece interessante a idéia dela de “enlouquecer†a mãe que a rejeitou primeiro para logo matá-la, mas tudo isso me parece meio sem lógica… Além do mais, não entendi exatamente quando Sophie teria “rejeitado†a filha. Lá pelas tantas a personagem de Susan Sarandon comenta que ela entende a raiva de Mara, porque ela (Sophie) teria sido covarde ao não querer conhecer a filha quando estaria grávida de Elly… mas em momento algum do filme, antes disso, sequer se dá uma pista desta rejeição. Ok, toda a parte dos “pesadelos†de Sophie com uma coruja atacando um bebê dão a idéia do “sacrifício†de um recém-nascido, mas nada aponta para uma rejeição de alguém já crescido. Para mim, mais um dos vários fios soltos da história.

2) E quando tudo parece ter sentido - ou seja, que Mara quis se aproximar à força, até mesmo tentando se vingar da mãe que havia lhe havia rejeitado duas vezes, descobrimos que na verdade Mara não é a verdadeira filha de Sophie. Ela assumiu, na prática, a identidade da amiga Kate Crotic, filha da escritora. Achei um problema a forma com que esta segunda “reviravolta†é jogada no colo do espectador. Digo isso porque ela aparece nos minutos finais e se resume a “explicar†a troca de identidades através da semelhança física da filha de Sophie deixada no orfanato no passado com as filhas dela com o atual marido. No mínimo algo um pouco “forçado†por parte da diretora/roteirista, não é mesmo? E essa “reviravolta†não explica algo: se Mara assumiu a identidade da amiga morta no incêndio para fazer cumprir a promessa dela de que a garota poderia ter tudo da amiga, porque ela quis ter tudo da vida de Sophie? Afinal, não seria mais lógico ela virar uma fotógrafa, ajudar crianças em campos de refugiados e, de quebra, exigir espaço na vida de Sophie em lugar de querer enlouquecê-la ou ter tudo que a mãe da amiga tinha?

Sei que os filmes não precisam ter muita lógica, especialmente os de suspense e/ou terror. Mas me incomoda quando um filme tenta ser “sérioâ€, procura surpreender o espectador e contar uma história “complexa†e, no final, apenas deixa muitos fios soltos e não convence. Isso aconteceu com este Irresistible. Um filme que poderia ser interessante mas que, na prática, na maior parte do tempo se mostra chato, arrastado, inverossímel.

Fora os problemas no roteiro e na direção, o filme conta com interpretações competentes de todos os atores envolvidos, com especial destaque para o trio principal e as filhas de Sophie. Gostei também da trilha sonora. Muito, aliás.

Depois de ver o filme, fiquei curiosa para saber mais sobre a diretora e roteirista. Ann Turner nasceu na cidade de Adelaide, na Austrália - o filme, aliás, foi produzido por aquele país. Ela estava 12 anos sem dirigir um longa-metragem. O filme anterior dela foi Dallas Doll, de 1994, com (a feia) Sandra Bernhard, Roy Billing e Melissa Thomas. Antes ela dirigiu a Russell Crowe (quando este ainda não havia estourado como ator) e Charlotte Rampling no filme Hammers Over the Anvil (de 1993). Nada que realmente tenha chamado tanto a atenção até hoje.

Vale a pena destacar o trabalho do diretor de fotografia Martin McGrath - que faz um trabalho realmente competente, especialmente nas cenas de interior - e do responsável pela trilha sonora do filme, David Hirschfelder.

Fora as derrapadas do filme e o ritmo lento do meio da história, a verdade é que Identidade Roubada acaba tocando em temas interessantes, como a criação artística, o desafio de uma mulher administrar carreira e vida familiar, a neurose que pode surgir depois de uma perda importante - como a de uma mãe, etc. Especialmente interessante todas as atitudes de “defesa†de Sophie durante a fase em que não sabemos se acreditamos nela ou nas demais pessoas da história. A sequência dos “palitinhos†nas portas, em especial, é de matar.

Produzido na Austrália, o filme também foi todo filmado no país “dos cangurusâ€. Basicamente, todas as cenas foram rodadas na cidade de Melbourne. Na parte técnica, a maioria dos nomes envolvidos na produção também são de australianos. (Alessandra Ogeda – confira mais detalhes no blog Crítica (non)sense da 7Arte)