Crítica sobre o filme "Reflexos da Inocência":

Wally Soares
Reflexos da Inocência Por Wally Soares
| Data: 07/01/2009
Iniciando-se se com uma aura extremamente poética, banhado ainda por um visual lírico muito bem fotografado, "Reflexos da Inocência" captura nossa atenção abruptamente desde seu primeiro quadro. Os créditos iniciais criativos passam enquanto presenciamos, sob uma fotografia quebrada e sensorial, uma noite na vida do astro Joe Scott, protagonista da obra. Ao som da belíssima "Sons Of", que dialoga maravilhosamente bem com o próprio roteiro do filme, assistimos a noite de sexo quente, bebidas em overdose e drogas em excesso de Scott. É um início marcante pela sua subjetividade e a perfeita construção de personagem que entrega sutilmente. Essa competência toda, liderada pelo talento fresco de Baillie Walsh, na sua estréia promissora em um longa-metragem, é construída por toda a sessão que, valorizando seus personagens e os sentidos que podemos tirar de palavras, imagens e sons, se revela uma sessão extremamente gratificante e prazerosa tanto em seu contexto dramático quanto em suas pequenas cenas individuais maravilhosas.

O roteiro, escrito pelo próprio Baillie Walsh, apresenta certas falhas durante a projeção, mas na maioria dos momentos Walsh compensa pela sua habilidade gratificante em fazer uma união memorável de imagens e música, construindo momento tão especiais e emblemáticos quanto um que pontua a metade do longa. Ao som da magnífica "If There Is Something" de Roxy Music, assistimos dois adolescentes viverem os prazeres da música na década retratada com louvor, excelência em filmagem e uma perfeição de ritmo incrível. O significado da canção de Roxy Music ecoa por todo o trabalho, sendo revivido ao fim, numa seqüência especialmente comovente e bem estilizada que apresenta duas características inconfundíveis do cinema novo de Walsh: a primeira provém de sua carreira como diretor de clipes, quando Walsh deixam mudos os diálogos de seus personagens para deixar a música dialogar com a audiência. No momento específico ao fim, garante um momento comovente apresentando um desempenho curto mas admirável de Claire Forlani que, possuindo pouco espaço, consegue brilhar aqui.

A segunda característica é a sua movimentação de câmera. O diretor apresenta posicionamentos e movimentos sempre muito certeiros, mas é especialmente admirável quando isola muitas peças de sua cena ao decidir focar um personagem em especial e, com isso, a performance do ator. A câmera segue de perto o personagem, não exibindo cortes e elevando o sentimento particular do momento. São virtudes como estas que tornam "Reflexos da Inocência" na sessão gratificante que é, visto que, se dirigido tradicionalmente, não teria brilhado tanto. A história é óbvia, possui clichês e até alguns momentos manipuladores. Essas falhas são cautelosamente esquivadas quando o diretor deixa o foco de sua história, o valor de seus personagens e o sentimento em si transcender completamente o trabalho em si. Exemplo de uma cena trágica que serve de propulsor para o destino dos personagens, previsível, mas, pela forma com que foi dirigida, emocionalmente arrasadora, permanecendo com o espectador.

Ainda assim, o roteiro problemático esconde alguns valores particulares. O conto de um homem em decadência que, refletindo sobre seu trágico passado, arruma uma forma de contornar suas besteiras e almejar redenção é, por si só, bastante forte, identificável e, no filme de Walsh, muito bem filmado e caracterizado, com estilo e sentimento próprio. Tudo muito bem exaltado pelo elenco talentoso que, fora o curto papel de Forlani, tem com o excelente Daniel Craig e o admirável Harry Eden seus protagonistas exemplares. Ainda temos uma estréia gratificante da jovem Felicity Jones, que faz do momento "If There Is Something" o melhor de todo o filme tanto com seu talento quanto com sua beleza. No todo, "Reflexos da Inocência" foge completamente à fórmula de "filmes de redenção e lições de vida" para se tornar cinema essencialmente bem filmado, com muita personalidade e especial gosto para música, lembrando a importância grandiosa que esta pode estabelecer a um filme. Contorne suas óbvias falhas então para apreciar sua particularidade e seu comentário interessante sobre astros em decadência moral, passados assombrosos e os erros que podemos cometer na nossa curta vida. Mas o filme é, no fim das contas, sobre a inocência que perdemos a certo ponto de nossa vida, e o que precisamos fazer para, ao fim, resgatá-la. (Wally Soares – confira o blog Cine Vita)