Crítica sobre o filme "Êxtase":

Eron Duarte Fagundes
Êxtase Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 26/01/2009
O realizador tchecoeslovaco Gustav Machatý escandalizou o mundo do cinema e a sociedade de sua época com uma peça cinematográfica hoje inocente: Êxtase (Xtase; Ecstasy; 1933) é este filme que deu pano para manga em seu tempo. A sequência mais referida pelos anotadores de ousadias eróticas é aquela em que a atriz austríaca Hedy Kielser (ou Hedy Lammar) se despe e joga-se num rio a nadar, inteiramente nua; o primeiro plano em que ela aparece despida a câmara se posiciona estrategicamente atrás de árvores e o espectador vislumbra muito pouco a nudez de seu corpo; depois os planos em que a vemos nua são muitas vezes de imagens distantes da câmara ou são imagens desfocadas; o que aparece mais visivelmente de seu corpo são os belos seios em alguns poucos planos; o breve plano nu da sueca Birger Malmsten em Música na noite (1947), de Ingmar Bergman, é em seu todo um nu mais visivelmente nu em cinema. Outra cena anotada pelos historiadores de escândalos envelhecidos é o ato sexual encenado entre Hedy e Aribert Mog, que vive o homem que acode a personagem de Hedy quando ela sai do rio nua correndo e se machuca; sua expressão de orgasmo, solta, derretendo-se, captada em primeiros planos, dizem que foi obtida porque o diretor lhe cravou alguns alfinetes nas nádegas, o que, enfim, já pertence ao folclore dos bastidores do cinema.

Em sua organicidade, Êxtase é um filme que envelheceu, superficializando-se. Porém, para além de seu escândalo, é inegável sua importância histórica. Sua influência pode ser avaliada pelo observador. A utilização do signo dos cavalos como fonte de energia sexual; estes planos de belos cavalos empinados foram reaproveitados com deleite e modernidade pelo brasileiro Walter Hugo Khouri em Corpo ardente (1965); Khouri igualmente deve ter bebido na cena em que Hedy espia nostalgicamente a chuva pela vidraça numa sequência em que a prostituta de Norma Bengell refaz este gesto em Noite vazia (1964). E também parecem khourianos os primeiros planos da face de Hedy em orgasmo: é claro que Khouri não deve ter recorrido aos alfinetes medievais de Machatý.

Por todos estes títulos, e por contar razoavelmente bem sua história de comportamento sexual livre, Êxtase ainda hoje não aborrece. É o que de melhor se pode dizer deste velho filme tcehco. (Eron Fagundes)