Crítica sobre o filme "Hellboy II: O Exército Dourado":

Jorge Saldanha
Hellboy II: O Exército Dourado Por Jorge Saldanha
| Data: 21/03/2009

Em um ano em que as atenções dos fãs de super-heróis foram quase todas atraídas por gigantes como BATMAN - O CAVALEIRO DAS TREVAS, O HOMEM DE FERRO e O INCRÍVEL HULK, este HELLBOY II - O EXÉRCITO DOURADO ficou relegado a um segundo plano. O que foi uma pena, já que entre todos os diretores que atualmente dedicam sua carreira ao gênero fantástico, o mexicano Guillermo del Toro a cada filme vem refinando seu estilo narrativo único e maravilhando o espectador com locais exóticos e criaturas fascinantes, capturadas com uma insuspeitada e via de regra sombria beleza. Isto ficou bem estabelecido no admirável O LABIRINTO DO FAUNO, e nesta continuação do filme de 2004, realizada com mais recursos de produção (U$ 85 milhões, um valor ainda médio em se tratando de um blockbuster de Hollywood), o diretor expande sua visão a patamares aos quais ainda não havia chegado – o que nos deixa ansiosos para ver o que del Toro nos trará na aguardada duologia O HOBBIT, prelúdio da aclamada trilogia O SENHOR DOS ANÉIS de Peter Jackson.

HELLBOY II: O EXÉRCITO DOURADO é obviamente um filme de ação com super-heróis, mas a visão de del Toro faz dele, acima de tudo, um de conto de fadas sombrio com sabor das antigas fantasias realizadas pelo mestre da animação stop motion Ray Harryhausen. O tom de conto de fadas é dado logo no início quando, após uma breve recapitulação das origens do herói, vemos um pré-adolescente Hellboy ouvindo de seu pai adotivo, o Professor Broom (John Hurt), a milenar lenda das criaturas míticas, do Exército Dourado e de sua guerra contra os humanos. Já na atualidade o príncipe elfo Nuada (Luke Goss, num papel muito parecido com o que interpretou em BLADE II, também de del Toro), rebela-se contra seu pai e a irmã Nuada, a fim de mais uma vez enfrentar os humanos. Hellboy e seus companheiros Liz (Selma Blair), Abe (Doug Jones), e Manning (Jeffrey Tambor) investigam uma ocorrência paranormal, na qual as “fadas de dente” de Nuada massacraram os participantes de um leilão, onde estava à venda uma das três partes da coroa que concede, ao seu portador, o controle do Exército Dourado. A partir daí eles descobrem os planos do elfo, que está em busca das peças restantes, e a aventura segue com boas doses de ação, humor e ótimos efeitos CGI.

O que poderia ser uma aventura visualmente arrebatadora, mas vazia, revela possuir um conteúdo igualmente atraente. O filme trata de valores e crenças como amor, amizade, lealdade e espiritualidade, e este contexto favorece a continuidade do desenvolvimento dos personagens. A começar pelo próprio Hellboy, fragilizado e com problemas em seu relacionamento com Liz. Isso aumenta sua necessidade de reconhecimento pelo público, o que finalmente leva à revelação da existência da secreta Agência de Pesquisa e Defesa Paranormais para a qual eles trabalham, em uma cena hilária. Abe, por sua vez, inicia um delicado romance com a princesa Nuala, que serve de contraponto às divertidas brigas do casal principal. E o grupo tem uma interessante adição na engraçada figura de Johann Krauss (voz de Seth Macfarlane, da série animada UMA FAMÍLIA DA PESADA), um expert alemão nas ciências ocultas que, após um acidente, transformou-se em ectoplasma e por isso está sempre contido numa espécie de escafandro. Algo que não me agradou, no entanto, foi a ausência do agente Myers (Rupert Evans), explicada por Hellboy numa única – e nada convincente – frase. Foi um tratamento no mínimo rasteiro para um personagem de grande relevância do filme original.

Outro fator interessante do filme são as sutilezas dramáticas atribuídas às criaturas e elementos fantásticos apresentados, passando ao espectador o sentimento de que um mundo sem fantasia – sem príncipes, princesas, gigantescas e maravilhosas criaturas (ainda que às vezes grotescas) – torna-se mais triste, mais pobre. Esta celebração do imaginário atinge seu ápice na seqüência do mercado dos Trolls, onde mesclando um primoroso desenho de produção, maquiagem, animatrônicos e CGI, del Toro cria um equivalente contemporâneo à Mos Eisley de STAR WARS, repleto de personagens vívidos, bizarros e interessantes. É o ponto alto do filme e do estilo peculiar do diretor, que soube criar uma das locações mais elaboradas, detalhadas e visualmente estimulantes dos últimos anos.