Crítica sobre o filme "Queime Depois de Ler":

Rubens Ewald Filho
Queime Depois de Ler Por Rubens Ewald Filho
| Data: 02/03/2009

No gênero das comédias, principalmente das que envolvem humor negro é difícil um filme obter um êxito tanto de crítica, quanto de público. Ainda mais quando os diretores deste filme acabaram de dirigir, escrever e produzir um vencedor de Oscar®. Pois bem, Joel e Ethan Coen mostram que não perderam a boa mão e dirigem um dos filmes mais gostosos de 2008 - Queime depois de Ler não é apenas um filme de grandes atuações, mas sim um divertimento muito bem escrito e feito. Tudo gira em torno de um memorando perdido, personagens hilários e um elenco formidável composto por George Clooney, Brad Pitt, Frances Mc Dormand, Tilda Swinton, John Malkovich e Richard Jenkins que arrasam em seus personagens.

A história começa assim: Osbourne Cox (John Malkovich) é demitido da CIA e resolve então escrever suas memórias, enquanto sua enjoada esposa, Katie (Tilda Swinton) o trai com Harry (George Clooney) um homem fraco e totalmente maluco. Em contrapartida, Katie grava os escritos de Osbourne em um cd e o acaba esquecendo na academia onde malha, e onde trabalham Linda (Frances McDormand, a grande alma do longa), que sonha em encontrar seu verdadeiro amor e melhorar sua aparência, Chad (Brad Pitt, fantástico) um personal trainer esquisito e curtido e Ted (Richard Jenkins) que gerencia a academia e é apaixonado por Linda. Dentro de uma trama nada fácil de se lidar e que poderia tornar-se um desastre se não tivesse uma boa equipe, os irmãos Coen mostram uma agilidade na trama que demonstra um grande ritmo, onde as reviravoltas nos são apresentadas com uma dinâmica que só nos faz ficar prestando mais atenção na historia, onde a qualquer minuto pode haver uma mudança.. .também é válido destacar a ótima trilha de Carter Burwell com melodias que não saem da cabeça. Claro que o grande trunfo do filme é ter um elenco afinadíssimo, mas tudo isto sob a batuta dos maestros Coen, que conduzem a historia com uma facilidade impressionante.

Filme feito para pessoas que curtem historias bem estruturadas e ótimo para dar algumas gargalhadas. Recomendadíssimo. (Viviana Ferreira)

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Como ocorreu com filmes do norte-americano Woody Allen, também os irmãos americanos Joel e Ethan Coen tiveram duas obras lançadas em Porto Alegre na temporada de 2008. Queime depois de ler (Bum after reading; 2008) é a segunda realização deles que aporta por aqui este ano e comprova a inquietação e a criatividade constantes dos diretores; o novo Coen, um alto sentido do divertimento cinematográfico, está longe da crueza e da perversidade de Onde os fracos não têm vez (2007), o filme deles anteriormente exibido por aqui, porém seu humor sai da bainha cortando para todos os lados e sua agilidade narrativa tem um poder de comunicação que todavia nunca se abastarda em concessões comerciais, ao menos nestes seus dois trabalhos vistos por aqui este ano.

As criaturas em cena em Queime depois de ler são imbecis interesseiros, que pensam muitas vezes em usar a inteligência que julgam ter mas se atrapalham e se dão mal. Esta visão de um ser humano tolo e ridículo em suas maldades é depurada nas duas obras recentes dos Coen. Se a crueldade da personagem de Javier Bardem em Onde os fracos não têm vez se embaralha no humor impiedoso com que o narrador o vê, a trêfega irritação da personagem Osbourne Cox que abre o filme com os maneirismos interpretativos delirantes de John Malkovich (a personagem é uma espião da CIA que é demitido no início do filme por embriaguez) é pateticamente analisada pela câmara dos Coen; o grande idiota da jogada é a criatura interpretada por Brad Pitt, que, juntamente com sua parceira vivida por Frances McDormand, tenta chantagear Cox. Chantagista e chantageado cometem muitos erros de ação e acabam mal. Igualmente curiosa é a personagem de George Clooney, cuja paranóia de espião espiado explode seguidamente e tem seu ponto máximo quando, diante da criatura de Frances McDormand, entra em transe ao descobrir que ela é colega de trabalho do idiota vivido por Brad e que foi morto pela própria personagem de Clooney numa malversada situação de espionagem no apartamento de Cox.

A ciranda policial de alta espionagem é armada com engenho e simplicidade pelos Coen. Toda esta ciranda é costurada por dois diretores da CIA, que a interstícios narrativos comentam os desastrados fatos que também se desenrolam diante do espectador. Mas, pelos diálogos e alguns esboços faciais, logo vemos que também este diretores onipresentes e onipotentes se enquadram na família de imbecis de que devemos rir. Sobra para o espectador a extremada lucidez do narrador último do filme que é o cinema dos Coen. (Eron Fagundes)

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Prefiro os irmãos Coen, Joel e Ethan (como sempre, fazendo tudo junto, inclusive roteiro e montagem, com pseudônimo) assim: divertidos e engraçados. Menos pretensiosos do que no superestimado filme que lhes deu o Oscar® deste ano, Onde os Fracos Não Têm Vez. É claro que o humor deles é desconcertante, e não tão acessível a todos (este foi o filme de maior bilheteria nos EUA da carreira deles, embora não tenha chegado a 60 milhões). Mas são sempre inventivos, sabem aproveitar o que os atores têm de melhor e conseguem um resultado muito bom.

Este foi o filme de abertura do Festival de Veneza, e o primeiro em anos que não foi fotografado por Roger Deakins, que estava ocupado com Reservation Road. Diz a lenda que eles teriam escrito este script simultaneamente com Onde os Fracos Não Têm Vez, alternando-se. E também, expressamente, para todos os atores centrais, menos Tilda Swinton. Talvez por isso funcionem tão bem. Começando por John Malkovich, que é sempre formidável (e nunca lembrado pela Academia), como um agente da CIA que é despedido e, sentindo-se ofendido, resolve fazer revelações comprometedoras, escrevendo um livro. É alcoólatra mas não admite isso, e não tem qualquer escrúpulo. O problema é que uma empregada de uma academia de ginástica, Frances McDormand (mulher de Ethan Coen na vida real), encontra o rascunho de um livro dele em CD e, junto com seu amigo professor e parco de inteligência, Chad (um inusitado Brad Pitt, fazendo um tipo diferente e com momentos ótimos; participação relativamente pequena, mas das melhores de sua carreira), tenta vender o CD na embaixada da Rússia!

Ao mesmo tempo tem George Clooney, que é amante justamente da mal-humorada mulher de Malkovich, e vive tendo problemas para completar a relação sexual. Todos são imperfeitos, uns até mesmo chatos e incompetentes, e estamos falando aqui de um forte humor negro que vai crescendo devagar, para explodir justamente na virada da primeira hora (o primeiro assassinato é aos 60 minutos).

Este é a melhor comédia dos Coen desde seu premiado Fargo, uma sucessão de momentos engraçados, surpreendentes, com apenas 96 minutos. Mas que também faz seus apontamentos sobre a vida, o amor, o sexo, a traição e a espionagem, tudo de forma muito mais acertada do que em Rede de Mentiras, por exemplo.

Procure assistir, que vale a pena. (Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos de 3 de fevereiro de 2009)