Crítica sobre o filme "Amante, O":

Wally Soares
Amante, O Por Wally Soares
| Data: 23/04/2009
Depois do excitante Notas Sobre um Escândalo, o diretor Richard Eyre volta a trabalhar como roteirista ao lado de Charles Wood – parceiros no roteiro do belo Iris – para adaptar a história de O Amante, que é baseado em um conto pequeno de Bernhard Schlink (recentemente adaptado com O Leitor). Na trama de O Amante, seguimos a obsessão de um homem pelas suspeitas de traição de sua mulher, investigando sua infidelidade. Simples. Mas não tanto. Talvez, no conto de Schlink, a trama complexa e cheia de idas e vindas no tempo faça sentido e funcione como meticuloso estudo da mente humana, da solidão, do amor e da infidelidade. E, de fato, o filme de Eyre toca nessas teclas sutilmente diversas vezes. O problema é que, ao adaptar o curto para o longo, fez-se um filme carregado incansavelmente na repetição e sobrecarregado de uma aura interminavelmente cansada de tristeza e obsessão ofegante, movida pelo seu personagem principal desesperado. A virtude é que o filme não passa dos 90 minutos, não incomodando mais que o necessário. Mas a questão é que o material em mãos não deveria ter passado dos 45.

Explico. Ao início do filme, os créditos dão lugar para Lisa, uma Laura Linney (A Família Savage) sorridente e, pelo clima, apaixonada. Corta para Lisa e seu marido Peter, interpretado por Liam Neeson (Busca Implacável). Nas conversas, percebemos que infidelidade paira na cabeça de Lisa. Um dia, ela vai para Milão. Corta para o futuro com Peter cuidando das roupas da mulher e discutindo com a filha, Abigail. Logo em seguida, começa a suspeitar da infidelidade de sua mulher com certas provas e começa a se tornar obcecado em achar o amante. Nesse desenrolar de fatos, já passamos por três épocas diferentes e nestas três épocas aconteceram fatos importantes ainda não nos revelados pelo roteiro. Ou assim os roteiristas pensam. A verdade é que tudo é muito óbvio, mas o filme tem em sua consciência de que está escondendo algo da audiência, que é revelado perto do fim de uma forma irregularmente engraçada e tola. Esse “segredo†do roteiro é facilmente percebido pelos mais atentos e durante a sessão quem descobriu não vai entender os jogos do diretor com as idas e vindas da narrativa. Como que se tentasse nos envolver em um clima paranóico de segredos, sensualidade e mistério. A questão é que tal clima é nulo. E tudo soa mais como uma enganação.

Apesar de todo esse equívoco narrativo, O Amante esconde certas virtudes. Além de dialogar sobre um tema de forma íntima e sincera, é carregado de personagens interessantes e você o segue até o fim intrigado, ainda que não completamente convencido. Tem bons diálogos e um elenco consistente. Eu destaco Romola Garai (Desejo e Reparação), simplesmente fantástica como a filha Abigail (e ela continua provando o quanto é a grande revelação da nova geração). Laura Linney também brilha, mas aparece muito pouco. Ela é mais mencionada do que realmente mostrada. Liam Neeson lidera o filme e, apesar de ter uma ou duas cenas boas, no geral revela um desequilíbrio incômodo ao oscilar entre o exagero e a canastrice. É uma pena, pois o estudo de seu personagem poderia ter rendido algo muito mais interessante. Quem me surpreendeu é Antonio Banderas (Mais do que Você Imagina), ator do qual nunca realmente me simpatizei mas que encara aqui seu personagem de uma forma madura, sensível e o constrói de forma que ele soe mais interessante do que o roteiro falho poderia ter insinuado.

O Amante é, em síntese, um exercício em frustração. Frustração porque, ao desenrolar da sessão, é inevitável perceber o quanto ele deixa a desejar em suas implicações, suas insinuações e em suas particularidades. Ele tinha muito mais a entregar e talvez por isso ficamos mais intrigados em ler o conto de Schlink, que deve ser mais equilibrado. Eyre, que nunca foi o forte de seus filmes (os roteiros eram o destaque, em especial o de Patrick Marber), desperdiça elementos e mantém seu filme na estranheza constante. No irregular e no repetitivo. Certas cenas e atitudes são repetidas de forma irrelevante. No todo, um trabalho inconstante e frágil. Por isso, é compreensível que, apesar de seu elenco reconhecido e enredo intrigante, tenha tido um destino lamentável direto para as locadoras. É surpreendente que nos Estados Unidos tenha ocorrido o mesmo. Alias, é assustador. Mas é a prova da falta de virtuosidade do filme, que denota um clima opressor, desagradável e poucas virtudes para fazer tudo valer a pena. (Wally Soares – confira o blog Cine Vita)