Crítica sobre o filme "Frost/Nixon":

Wally Soares
Frost/Nixon Por Wally Soares
| Data: 09/06/2009
Quando Richard Nixon se resignou, após o vergonhoso escândalo de Watergate, os Estados Unidos inteiro viu a presidência com um olhar diferente, muito como a casa branca foi vista durante os mandatos de George W. Bush. As pessoas queriam respostas, e o ex-presidente definhava em sua luxuosa mansão, vivendo às custas de sua mediocridade. Alias, já aponto aqui a minha reprovação quanto ao trigésimo-sétimo presidente dos EUA, um homem que abria mão até mesmo de suas crenças para chegar onde queria (mudou do partido democrático para republicano quando perdeu as eleições). O filme de Nixon, propriamente dito, é o Nixon de Oliver Stone (quem mais?), mas Frost/Nixon é ótimo ao humanizar o personagem e traze-lo num embate fervoroso com David Frost, numa entrevista histórica que serviu de palco para um duelo deliciosamente rico entre dois homens que se viam à beira do precipício. Dirigido de uma forma muito instigante por Ron Howard (Anjos e Demônios), o filme baseia-se numa peça escrita por Peter Morgan (A Outra), que também assina o roteiro cinematográfico. Os dois atores principais, Martin Sheen (Anjos da Noite – A Rebelião) e Frank Langella (O Corajoso Ratinho Despereaux), também personificaram os personagens no teatro.

Primeiramente, é válido ressaltar que, mesmo baseado em uma peça, Frost/Nixon deixa suas características teatrais para trás, num roteiro bem estruturado e uma direção que, ainda que não reserve nada original, cumpre seu dever ao conseguir arquitetar o filme com riqueza de nuances e planos que capturam de forma ácida e envolvente discussões e bastidores. O filme de Howard é daquele típo de exercício cinematográfico louvável cuja ação se reserva à força de seus diálogos e, neste aspecto, as cenas das entrevistas entre Frost e Nixon são cenas de ação excelentes. E os enquadramentos são bons, os diálogos eficientes e o retrato dos bastidores consegue inserir autênticidade digna ao longa. Mas o brilho aqui, o motriz do filme e que o faz ecoar é a força de seu elenco. Langella traz um Richard Nixon despido de qualquer exagero, ao não realizar uma imitação e se deixar levar pela composição honesta e pungente do homem. Enquanto isso, Sheen não definha diante do talentosíssimo ator mais velho, e encarna Frost com uma densidade notável, conferindo a ele olhares extremamente eficientes em meio à ansiedades. Ambos compõem um painel genuíno, e o duelo não se reserva apenas aos personagens (apesar dos atores sumirem em seus papéis) mas também aos atores, que desafiam um ao outro tanto fisicamente quanto psicológicamente. É impossível não vibrar diante de tamanha eletricidade.

O elenco, porém, não se limita apenas à Sheen/Langella. Elogios merecem ir à um ótimo Sam Rockwell (Choke – No Sufoco), o excelente Kevin Bacon (Ligados pelo Crime) e coadjuvantes de peso como Matthew Macfadyen (Morte no Funeral), Oliver Platt (Ensinando a Viver) e Rebecca Hall (Vicky Cristina Barcelona). Eles adicionam vida ao trabalho muito bem editado, e conduzido com instigação natural por Howard, que parece evoluir sua linguagem cinematográfica mesmo que o trabalho em si não denote nenhuma originalidade e se reserve à ser demasiadamente acadêmico. Howard aposta no poder do primoroso roteiro de Morgan (compensando o fraco script de A Outra), voltando à boa forma de A Rainha, onde possui a chance de compor personagens com desenvoltura e imensa densidade. O retrato de Morgan do personagem de Nixon é de um homem bem arrogante e incapaz de reconhecer seus atos, definhando diante de acusações ao enrolar seu acusador com respostas longas e irrelevantes. Mas é na última cena entre Nixon e Frost que vemos o quanto o personagem é bem composto, roteirizado por Morgan sem cair em armadilhas de biografias habituais, ao entregar Nixon não como um mero homem da história, mas como um ser humano, antes de qualquer coisa.

E estas virtudes transformam Frost/Nixon no típo de filme imperdível que, mais do que entregar o retrato de um fato histórico, nos fascina ao construir belos personagens, ótimos diálogos e dignos momentos de drama que elevam o longa à muito mais do que um mero testemunho. Mesmo que seja notável a carência de um formato mais ousado, Howard acerta o suficiente para compensar seu erro e faz de Frost/Nixon sua direção mais recompensadora ao lado de Uma Mente Brilhante, provando ser sim um contador de histórias hábil, claramente ajudado pelo furor de um roteiro impressionante e um elenco bom de mais para meros elogios. E o filme, portanto, termina contigo, e pedirá revisões e revisões. Afinal, nada é mais fascinante do que testemunhar personagens tão críveis em duelos tão escaldantes e reais. Como um drama realizado à base de diálogos, Frost/Nixon pode não ser poderoso aponto de sobreviver à passagem do tempo, mas não só descobre belo ritmo, mas te deixa querendo mais ao final. Uma forte recomendação. (Wally Soares – confira o blog Cine Vita)

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As relações de oposição e atração que se exercem entre o bonitinho apresentador David Frost e o sisudo ex-presidente americano Richard Nixon em Frost/Nixon (2008), ambicioso filme político dirigido por Ron Howard, podem facilmente ser comparadas com o que ocorre na trama do filme francês O último Miterrand (2005), de Robert Guédiguian, onde um jovem jornalista convive na mansão de últimos dias do político gaulês François Miterrand para compor a biografia autorizada do estadista. O relacionamento tenso e complicado da imprensa com os políticos é um tema sempre candente; geralmente os políticos (especialmente os executivos) detestam as características abelhudas da imprensa e gostaria de responder como Nixon, tudo o que fazem é legal porque é feito pela nação, o ato de um chefe de Estado seria um ato da nação e portanto inquestionável.

O filme de Howard tem um material bastante interessante, semidocumental, rastreia os processos estéticos dos grandes filmes políticos dos anos 70, lembrando especialmente o documentário Corações e mentes (1974), e muito especialmente nas sequências de Frost/Nixon em que vemos imagens televisivas da guerra do Vietnã, mas é formalmente inconsistente e carece de profundidade em sua visão das coisas, por sinal muito mal explicadas ao longo da história (e neste filme não é diferente). Frank Langella na pele de Nixon tem uma interpretação excepcional. E Michael Sheen, se não é nenhum Langella, compõe com justeza o apresentador de televisão frívolo que é sua personagem. Se o filme falha, os atores ao menos brilham. (Eron Fagundes)

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Baseado na peça homônima baseada em fatos reais, muitos diziam (e ainda dizem) que Frost/Nixon poderia ser um fracasso. Por quê? Porque embora Ron Howard dirija bem ele é um diretor limitado, quadrado, que nunca avançou muito em seus longas, nunca tentando desafiar ou ser desafiado. Só que em Frost/Nixon, Howard não só faz a lição de casa como consegue uma proeza: ser denso ao extremo, brincando com os assuntos, jogando sempre... mas isto tudo claro é graças ao roteiro soberbo de Peter Morgan, que ao meu ver tem o roteiro do ano. O filme é baseado na peça de Peter, e tem outra grande qualidade: seus protagonistas são os mesmos da peça- Frank Langella, como Richard Nixon, e Michael Sheen, como David Frost. Enfim, o longa conta a história das entrevistas que David Frost fez com Richard Nixon alguns anos depois do escândalo que arruinaria a vida de Richard Nixon. O caso Watergate, que só pra entender foi quando no prédio Watergate cinco homens foram presos no dia 17 de junho de 1972 ao tentar colocar escutas nos escritórios do Comitê Nacional Democrata. O arrombamento, durante uma campanha eleitoral, foi investigado e levou aos membros de um grupo de apoio a Nixon - o Comitê para Reeleger o Presidente. Os invasores e dois cúmplices foram condenados em janeiro de 1973, e muitos, inclusive o juiz que os julgou, John Sirica, suspeitaram que havia uma conspiração que alcançava os altos escalões do poder. O caso acabou se transformando em um escândalo político amplo quando um dos arrombadores condenados escreveu para Sirica alegando ter havido uma grande operação de acobertamento do caso. Bem, depois desta explicação, houve toda aquela confusão, Nixon acabou renunciando e passando aquela vergonheira danada. No filme, a história parte deste ponto: dos acontecimentos no ano de 1972 até o inicio das entrevistas, onde posso dizer que David Frost penou muito nas mãos de Richard Nixon, até dar sua tacada de gênio e conseguir como resultado uma das mais importantes entrevistas já feitas na história dos Estado Unidos.

E a história é uma verdadeira delícia. São diálogos bem formulados, bem interpretados, bem dirigidos. Michael Sheen mostra mais uma vez que é um ator realmente muito bom, enquanto Langella tem neste filme o papel de sua vida. Seu Nixon é uma verdadeira águia, mas também um homem caído por sua derrota de caráter. E o elenco secundário também está impecável. Oliver Platt, Sam Rockwell e Mathew MacFadyen interpretam o trio que segurou as pontas de David Frost, pesquisando questões, organizando perguntas (e posso dizer que os 3 estão formidáveis), onde o destaque vai para Rockwell, que interpreta seu personagem com muita dignidade. Rebeca Hall faz Caroline Cushing, namorada de Frost, dando como sempre conta do recado, embora seu papel seja pequeno. Ao lado de Nixon, Kevin Bacon faz Jack Brennan, braço direito de Nixon, e Toby Jones faz Swift Lazar, conselheiro de Nixon. O elenco é fortíssimo em seu total, e é isto que faz a diferença. Juntos todos os atores formam o quebra cabeça de forma tão perfeita que impossível não se apaixonar por cada atuação. Posso dizer que, o que é curioso, é que Frost/Nixon, por ser tão desafiador, parece ser de Oliver Stone, enquanto W., de tão sutil que é, poderia passar fácil fácil por um filme de Ron Howard. Mas por ser esta força inatingível, Frost/Nixon se consagra como um dos melhores filmes políticos dos últimos 30 anos.

Também não posso esquecer de destacar a parte técnica, também impecável. A fotografia e a edição são maravilhosas, sendo que principalmente a edição de Daniel P. Hanley que foi indicada ao Oscar® de melhor edição (o editor já tem uma estatueta em casa por Apolo 13). E a trilha de Hans Zimmer? É gloriosa! Desafiadora, inteligente, e muito forte, com um tema em violoncelos que deixa qualquer um arrepiado. Mas como já divaguei anteriormente- é o roteiro de Peter Morgan quem brilha, incansavelmente, com sua beleza suprema. Peter é um ótimo roteirista, e vale destacar que em Frost/Nixon ele é a estrela maior. Um filme para ver com gosto e sair com um sorriso aberto. (Viviana Ferreira)