Crítica sobre o filme "The Spirit: O Filme":

Wally Soares
The Spirit: O Filme Por Wally Soares
| Data: 09/08/2009
Para convencer Frank Miller à vender os direitos de sua HQ "Sin City", o diretor Robert Rodriguez filmou um curto segmento sem autorização e exibiu ao escritor. Miller adorou, aprovou o projeto e foi co-diretor do filmaço de Rodriguez. "Sin City – A Cidade do Pecado" foi uma revolução na linguagem do cinema. Um quadrinho transportado para as telas com vitalidade e ousadia. Miller parece ter adorado a experiência, e decidiu adaptar o quadrinho de seu ídolo, Will Eisner, chamado "The Spirit". Infelizmente, porém, Miller não teve a sorte (e o talento) para fazer esta adaptação funcionar. Ambicioso, o filme foi todo filmado em frente à telas verdes, como "Sin City". Mas enquanto a narrativa de "Sin City" impressionava pela genialidade, a de "The Spirit – O Filme" cansa pela obviedade. O visual, entretanto, é "quase" tão rico quanto o projeto anterior, pecando apenas por ocasionais excessos ao jorrar cores mais exuberantes em meio ao preto e branco. A história segue o vigilante The Spirit (Gabriel Macht), um ex-policial chamado Denny Colt baleado na linha de fogo que volta do mundo dos mortos para batalhar a criminalidade da decante cidade que tanto ama e anseia proteger. Durante sua caçada pelo aqui-inimigo Octopus (Samuel L. Jackson), ele encontra Sand Saref (Eva Mendes), antigo amor de sua vida. É uma história um tanto rasa e que ganha contornos excessivamente artificiais nas mãos de Miller. Rodriguez transcendeu os limites de "graphic novel" em "Sin City", mas Miller se prende demais ao formato, ao apostar em humor exagerado, romance bobo e diálogos irritantes. A ação tem seus momentos estilizados que podem entreter. Mas, a todo momento, o trabalho soa cinematograficamente pobre, embora visualmente excitante. Você se encanta com as perfeições na arte, os efeitos impecáveis e toda a desenvoltura técnica. Mas cinema não é feito apenas de imagens. Principalmente quanto estas se limitam a ser belas, não expressivas.

Então, com todos seus pomposos artifícios visuais, inspiração estética e criatividade em construir um mundo inteiro, "The Spirit" não almeja além de um obra artificial e pouco memorável, que tem seus momentos descomprometidos divertidos e outros que se levam muito a sério. No final das contas, é um exercício frustrante com amplo espaço para aperfeiçoamento. O problema parece residir na mão de Miller, que carece experiência e desenvoltura. Sem a co-direção de Rodriguez, perdeu-se muito. Miller, sendo um artista visual virtuoso, transforma a obra em uma rica experiência visual. Mas ele se limita a tratar o resto de forma superficial. Sendo assim, diálogos, personagens e dramas são meros detalhes quando deveriam ser a atração especial. O resultado é uma sessão irregular. Muito para quadrinho, pouco para cinema.

O consenso mais "usual" que pode ser tido sobre a obra é de que seja um clássico exemplo de estilo vs. substância, e a vitória do primeiro sobre o resto. Fato incontestável dado a constante fragilidade de uma narrativa sem textura ou envolvimento maior do que as imagens nos propõem. E o estilo funciona. O preto e branco clássico impressiona, com a gravata vermelha de seu herói reluzente e emblemática. Ao contrário de "Sin City", que além do preto e do branco resgatava apenas o vermelho do sangue e o amarelo de seu sádico personagem, "The Spirit" mergulha em outros tons e realça outras cores de formas em vezes mais extravagantes. Às vezes funciona, como na fotografia dourada das lembranças do personagem título sobre seu romance com Sand Saref, mas na maior parte das vezes soa demasiadamente carregado e substancialmente artificial. A vertigem visual, porém, é incontestável, e o aspecto estético do filme merece os elogios mais sinceros.

No meio de um cenário inóspito, onde a ausência de sincera emoção dá lugar à uma frieza calculada, a última fortaleza residiria em um elenco habilmente centrado e emocional. Mas seja pelos personagens ocos e desinteressantes ou mesmo pela canastrice dos envolvidos, ninguém no extenso elenco consegue elevar o projeto à um nível mais pessoal. Macht faz seu herói da forma mais genérica possível enquanto Samuel L. Jackson atira para todas as direções e não acerta uma. O resto fica à deriva das femme fatale, que oscilam entre a explícita sensualidade de Mendes (se limitando a ser apenas um objeto sexual), a redonda Sarah Paulson, a quase inexistente Jaime King e a excêntrica (e divertida) personagem encarnada por Scarlett Johansson de forma inspirada. O máximo de coesão em um projeto repleto de inconsistências. Se fosse um filme mudo, "The Spirit – O Filme" teria almejado ser mais que apenas um ambicioso projeto totalmente esquecível.