Crtica sobre o filme "Prova de Amor, Uma":

Wally Soares
Prova de Amor, Uma Por Wally Soares
| Data: 07/01/2010
Obras como Uma Prova de Amor usualmente são exercícios cinematográficos fáceis, além de maniqueístas e baratos. Assim, é com certo temor que abordamos uma obra como esta, ao passo que narra uma “comovente história sobre a luta de uma família contra o câncer”. Certamente, já vimos este filme antes. O que acontece nesta película, porém, é algo muito novo e refrescante. Nada arrebatador ou demasiadamente memorável, mas tão decente e maduro que merece ser reconhecido. Baseado em romance da novelista Jodi Picoult (cujos outros livros foram adaptados para a televisão - o que não é bom sinal), o roteiro escrito a duas mãos por Jeremy Leven e pelo diretor Nick Cassavetes é falho e cheio dos bordões do gênero, mas aborda certos aspectos que surpreendem. Leven e Cassavetes nunca deixam de explorar o óbvio e o excessivamente sentimental, mas notam também nuances valiosas. E são nestas pequenas (mas evocativas) observações que encontra-se o prazer do filme.

Na história, seguimos o cotidiano da família Fitzgerald, afetada pelo surgimento bastante precoce de leucemia na ainda criança Kate (Sofia Vassilieva). Os pais Sara (Cameron Diaz) e Brian (Jason Patric) são encurralados e vêem como alternativo terem outro filho, mas um que seja geneticamente modificado para ser usado para suprir as necessidades fisiológicas de Kate. Assim, nasce Anna (Abigail Breslin). A revira-volta ocorre quando Anna atinge os 11 anos e - na obrigação de doar seu rim - decide processar seus pais para ser emancipada em termos médicos. Tudo isso é contado pelos roteiristas de uma forma não-linear e bastante fragmentada. Uma escolha ousada que garante uma fluidez admirável. Por outro lado, nem sempre funciona da forma mais eficiente e resulta ocasionalmente em irregularidade.

Utilizando a belíssima fotografia do sempre interessante Caleb Deschanel, o diretor inunda o filme de um lirismo muito bonito e significativo, que une-se à fragmentação da história ao passo que transforma a narrativa em uma espécie de sequência de sonho. Um sentimento, porém, estritamente sensorial (enriquecido pela trilha sonora fantástica), já que a história em si é bem dura, ainda que nunca realmente crua. Cassavetes entrega cenas muito fortes e emoções muito poderosas, mas talvez graças à fragmentação narrativa perde chances de realmente cravar a audiência. Culpa da irregularidade e o do vai e vem pouco sóbrio do que é desenvolvido em termos de trama e personagem. Assim, Uma Prova de Amor pode falhar e ter momentos levianos, sequências burocráticas e emoções calculadas. O que o mantém vivo nestas horas é a sua veracidade emocional, que não se esgota em momento algum.

O pivô curioso do longa-metragem é, além da leucemia e da união familiar, a decisão muito corajosa de Anna. O roteiro mantém nossa atenção conforme vai revelando a dinâmica que cerca a família após a escolha dela, e assistimos ávidos e meio que fascinados. Ainda assim, sinto que trata-se de um elemento explorado sem a devida relevância e provocação. Mas a direção de Cassavetes decide focar mais os sentimentos manipuladores, que conquistam a emoção fácil. Poucas vezes adentramos território diferenciado. Mas quando isso ocorre, é válido dizer que o filme torna-se brilhante. Ao narrar a história da película, até esquecemos de mencionar o outro filho da família, o jovem Jesse (Evan Ellingson). Com certeza ele teria sido apenas mais um personagem, mas o roteiro o explora com extrema dignidade. Não é exagero confirmar as cenas de Jesse como as melhores do filme, pois são nelas que vemos total domínio de técnica e emoção. O roteiro torna-se sutil e a direção, densa. Se o resto do filme mantivesse essa congruência sensacional, teria sido um filme muito mais memorável.

No entanto, ao final aceitamos Uma Prova de Amor com suas falhas e negligências. Por ser contado com frescor, delineado com emoção e ser manipulativo sem que com isso tenha que subestimar a inteligência de sua audiência. Não torna-se sem vergonha ou liga demais o piloto automático. O longa-metragem é sincero e pessoal. Ao fim das contas, é isso que acaba por ecoar e validá-lo. O elenco, por sua vez, eleva diálogos e emoções outrora muito baratos à níveis inconfundíveis de beleza. Vassilieva compõe uma Kate maravilhosa, rouba todas as cenas e realmente comove. Breslin é a atriz adorável e madura de sempre, e Diaz se entrega à personagem de forma recompensadora. Atenção também merece ser dada à Patric e, claro, à Ellingson. Mas é a genial Joan Cusack que torna tudo muito mais delicioso, ao passo que Alec Baldwin não entrega absolutamente nada.

Portanto, não tenha medo. Uma Prova de Amor possui sim um desfecho muito sentimental que pode ou não funcionar (tudo depende de como você aceita o clímax), mas trata-se de um filme realmente diferenciado tanto em sua proposta quanto em sua abordagem. Não é algo saído de um romance barato ou oriundo de roteiros televisivos dolorosos. É maduro, diversamente inteligente e muito atencioso. Por essas e outras, dilui a maior parte de seus erros para se tornar totalmente recomendável. Sua previsibilidade é inevitável e aquela tal mensagem ao fim, realmente necessária. São pontos que precisam ser relevados e de certa forma tornam-se obrigatórios diante do enredo a que nos é apresentado. A beleza da obra como história de vida é muito forte para que seja dispensada por errinhos tolos (que, ainda assim, precisam ser reconhecidos por parte da análise cinematográfica). (Wally Soares)