Crítica sobre o filme "Verdade Nua e Crua":

Wally Soares
Verdade Nua e Crua Por Wally Soares
| Data: 14/01/2010
Ao surgir o material de divulgação de A Verdade Nua e Crua, com um cartaz esperto em sua observação cínica de como funciona o amor entre homens e mulheres, deu a entender que se tratava de uma comédia romântica atípica. Talvez uma com uma proposta mais incisiva e, quem sabe, uma execução mais ousada. Infelizmente, porém, A Verdade Nua e Crua não é nenhum frescor ou novidade. Na verdade, é o exato oposto. É mais uma fita do gênero que foi realizada sob encomenda por Hollywood. Desta vez, temos um enredo com abordagem um pouco mais interessante. O que não quer dizer, necessariamente, que tenha resultado em algo competente. A idéia inicial, que é muito mal tratada por três roteiristas totalmente equivocadas, não leva o espectador para lugar algum, tratando seus dois protagonistas em termos de estereótipos e nunca os elaborando à verossimilhança.

A protagonista é Abby Richter (Katherine Heigl), uma produtora muito bem sucedida cujo trabalho não anda sendo recompensada apropriadamente, já que a emissora na qual está hospedada não tem produzido bons números. Pressionados, eles são obrigados a contratar Mike Chadway (Gerard Butler), que é dono de um programa intitulado “A Verdade Feia†no qual versa sobre a futilidade amorosa das mulheres e o direcionamento sexual dos rapazes. Com isso, garante o ódio de Abby, que ainda assim se vê obrigada a não só trabalhar ao seu lado, mas produzir as besteiras que ele tem a dizer. Em busca de um amor perfeito, Abby é uma moça obsessiva e que representa o tipo que Mike prega. Assim, ele começa a ajudá-la a conquistar um vizinho, por meio de dicas. Não delonga, porém, até que Mike e Abby aos poucos começam a olhar para si mesmos de formas diferentes.

A sinopse (e a prévia do filme, por sua vez) nem precisa revelar que algo vai rolar entre os dois protagonistas tão antagônicos. É algo que, infelizmente, a audiência já antecipa, o que torna toda a experiência de se assistir ao filme muito menos gratificante. Mas mesmo em meio à previsibilidade nascem bons exemplares - como o recente A Proposta. Naquela obra - também de opostos se atraindo - o espectador não era subestimado e nem sujeitado a um número desgastante de cenas vergonhosas. O roteiro de A Verdade Nua e Crua é infalível ao tornar situações potencialmente cômicas em momentos desastrosos. Torna-se, portanto, uma tarefa difícil aproveitar a película, já que falta uma conexão autêntica com os humanos unidimensionais, da mesma forma que o longa-metragem carece de um senso de humor no mínimo autêntico. Todo segundo da obra parece gritar artificialidade.

É curioso observar - como já havia mencionado - que A Verdade Nua e Crua foi roteirizado por três mulheres (a partir do argumento de uma delas). Fator este que influenciou vários dos elementos do roteiro. Não é coincidência, então, que a protagonista surja como uma mulher independente e bem sucedida, uma produtora que manda no personagem de Mark. Mas estas mesmo três mulheres pintam Abby como uma moça presunçosa, superficial em seus trejeitos e completamente manipulada por uma figura máscula. Mark, por sua vez, um sujeito que encarna a brutalidade de um homem que só pensa com a cabeça de baixo, todo ríspido e charmoso. Claro que, ao fim, as três mulheres manipulam o personagem, fazendo-o acreditar no amor assim que se vê enlaçado por Abby. Em outras palavras, trata-se de um roteiro monocromático, cujos personagens são ignorantes e rasos. Nenhum ponto virtuoso ou ao menos interessante é extraído do argumento, que poderia ter gerado uma discussão divertida sobre a guerra dos sexos. Em contrapartida, A Verdade Nua e Crua banaliza o que já estava desgastado por natureza.

Terrivelmente enganador, A Verdade Nua e Crua inicia-se com um plano-sequência ótimo de quase dois minutos, ao seguir a personagem de Abby pelo seu ambiente de trabalho. É um ponto virtuoso de cinematografia que nunca mais é pontuado no decorrer da obra. Robert Luketic - dos divertidos mas regulares Quebrando a Banca e Legalmente Loira - chama nossa atenção para depois esmiuçá-la. A verdade feia mesmo - e que demoramos para aceitar - é que não existe nada de remotamente interessante ocorrendo neste filme. Emocionalmente vazio, comicamente inexpressivo e totalmente contraditório em seu retrato do amor e do sexo. Alias, se o amor já surge banal com a pobre execução, o sexo deixa de ser explorado para poder garantir a censura mais baixa - estamos falando, afinal de contas, de um filme realizado com o intuito de encher cofres.

O elenco com certeza beneficia o longa-metragem. Heigl é uma atriz muito talentosa, mas o que ela é obrigada a retratar com Abby cai no desgosto (e no irritante). Abrindo espaço para Butler roubar a cena. E poucas vezes o ator combinou tanto com um papel. Ele faz seu Mark tão bem que quase vemos faíscas se soltarem - o que deixa de ocorrer em relação à química entre os dois apaixonados. O casal secundário de jornalistas protagonizados pelos comediantes Cheryl Hines e John Michael Higgins oferecem o humor que os protagonistas deixam de produzir. Diversamente, o filme pertence à eles. Tais pequenas virtudes não são o suficiente para salvar A Verdade Nua e Crua da perdição. Pode haver um ou outro sorriso, a ameaça de uma risada ou o lampejo de uma gargalhada, mas na maior parte das vezes você estará fazendo careta para o longa-metragem, já que é exatamente isso que ele está fazendo para você, lhe zombando por ter pago para assisti-lo. (Wally Soares)