Por Eron Duarte Fagundes
| Data: 13/04/2010
Sabe-se que o cineasta espanhol Pedro Almodóvar reveste seu estilo de filmar de muitas poses têm tanto admiradores quanto acusadores. Estas poses podem ser às vezes bastante fortes e divertidas, embora haja quem pense que elas são sempre maneiristas. No caso de Abraços partidos (Los abrazos rotos; 2009) o vigor dramático de seu filme anterior, Volver (2006), igualmente interpretado por Penélope Cruz, se ausenta inteiramente; excessivamente digressivo e rebuscado desde seu roteiro, o filme se aproxima mais dos desleixos de construção de Má educação (2004), outro Almodóvar da linha de baixo.
Almodóvar pretende que Abraços partidos seja sua atual declaração de amor ao cinema. E na verdade o assunto mesmo da narrativa é o próprio cinema. Como o alemão Rainer Werner Fassbinder, o espanhol Almodóvar não esconde sua queda pelos melodramas clássicos de Douglas Sirk, alemão que ganhou fama em Hollywood; cada um destes realizadores, refaz à sua maneira a escrita fÃlmica de Sirk, mas sem nunca se propor como cópia. Em Abraços partidos mais uma vez Almodóvar solta seu pendor melodramático; e conta com o jeitinho apaixonante de Penélope para expor este seu sentimento; mas, com ser um melodrama, é também algo de que Almodóvar se apropria cerebralmente, esfriando demasiadamente as emoções, daà os maneirismos.
Entre todas as referências cinematográficas de Almodóvar, há uma que parece demasiadamente pomposa. Numa determinada cena, a personagem de Penélope e seu amado vivido por Lluis Homar estão vendo na televisão uma sequência de Viagem à Itália (1953), provavelmente o mais belo filme do italiano Roberto Rossellini, justamente aquela em que George Sanders, diante duma visita à s escavações do Vesúvio, observa como um casal foi surpreendido pela morte quando estavam abraçados e Ingrid Bergman passa a chorar e afasta-se desesperada. O próprio tÃtulo do filme de Almodóvar, “abraços rompidosâ€, faz uma alusão ao contrário ao trabalho de Rossellini. Pode haver abraços que nem um vulcão rompe? Tudo muito culto, muito curioso, mas ineficiente na textura narrativa de Abraços partidos.
Montado com uma certa displicência, Abraços partidos talvez devesse ser reeditado, como faz o diretor do filme dentro do filme (o filme-dentro chama-se Garotas e malas); o filme dentro do filme lá pelo final se superpõe demasiadamente ao filme de Almodóvar, fazendo com que o fio narrativo se perca. Uma disjunção temporal que surpreende negativamente num cineasta experiente como Almodóvar.
No elenco de apoio, uma curiosidade: José Luis Gomez, já veteranÃssimo, é o produtor de cinema obcecado sexualmente pela atriz interpretada por Penélope. Gomez foi quem interpretou para outro espanhol, Carlos Saura, uma de suas obras-primas, Os olhos vendados (1978); neste antigo filme de Saura ele era um diretor de teatro que não se envolvia com uma mulher casada vivida por Geraldine Chaplin. (Eron Fagundes)