Crítica sobre o filme "Fim da Escuridão, O":

Wally Soares
Fim da Escuridão, O Por Wally Soares
| Data: 24/06/2010
Baseado em premiada mini-série britânica dos anos 80, O Fim da Escuridão mantém o diretor do original, Martin Campbell (cineasta responsável também pelo belo reboot de 007 no Cassino Royale), ao passo que traz a assinatura de William Monahan (vencedor do Oscar pela brilhante adaptação de Os Infiltrados) no roteiro. Os ingredientes são promissores, mas este não é o longa-metragem que deveria ter sido. Irregular em seu desenvolvimento, O Fim da Escuridão é sem dúvida alguma um bom filme – divertido, ágil, decente – mas é doloroso perceber o quanto ele poderia ter sido superior. Fortes evidências nos levam a crer que, durante sua produção, houve uma imensa mudança de tom. Robert De Niro (que interpretaria o papel que ficou com Ray Winstone) abandonou o projeto por conflitos criativos e o compositor John Corigliano (de O Violino Vermelho) teve sua trilha sonora desperdiçada quando perceberam que suas composições mais densas não encaixavam na fita de ação na qual o filme havia se transformado quando certas cenas foram refilmadas. No fim das contas, “fita de ação†é mesmo o melhor termo para definir o filme, mesmo que Campbell e Monahan se esforcem para construir um suspense policial mais palpável.

Mel Gibson, retornando às telas após um grande hiato (seu último trabalho como ator foi em Crimes de um Detetive, de 2003), interpreta Thomas Craven – um detetive de homicídios veterano que se afunda em uma frenética busca por vingança quando sua filha é brutalmente assassinada na porta de sua casa. Ao desvendar segredos da vida da filha, aos poucos descobre as justificativas por trás de sua morte, se envolvendo em uma trama conspiratória muito maior do que possa imaginar. De muitas formas, é o tipo de filme no qual vemos Gibson protagonizando, ator que se especializou no gênero policial e em histórias movidas à vingança.

Abrindo com uma imagem evocativa e atmosférica, O Fim da Escuridão logo oscila do perturbador para o lugar comum, quando surge em tela uma compilação de filmagens de sua filha quando pequena. Lembra, talvez até um pouco demais, Busca Implacável, filme recente de temática muito similar. Ao contrário deste filme, porém, não temos ação ininterrupta de início ao fim – mesmo com algumas sequências excelentes. O que fundamenta a película é a vingança de Craven, que aos poucos dá lugar à obsessão típica de uma teoria de conspiração. Portanto, há aqui um enredo sólido e recheado com sub-tramas, personagens intrigantes e inúmeras desculpas para cenas de ação. O desenvolvimento não é, porém, tão consistente quando esperaríamos. O filme se estende em excesso, possui muitos momentos desnecessários e mais que o usual aposta nos clichês mais cansados do gênero.

Há, antes de qualquer coisa, uma estereotipação dos personagens. Apesar de todos surgirem intrigantes de alguma forma, apenas Jedburgh, interpretado com grande afinco por Ray Winstone, evolui e se torna memorável. Alias, não há muito o que reclamar do elenco. Danny Huston faz um ótimo vilão (como de costume) e Gibson faz o que tem feito por grande parte de sua carreira. Pode estar um pouco fora de forma, mas convence nos momentos mais dramáticos e cria um homem com o qual a audiência possa se identificar de alguma forma (seja pelo amor de pai, a busca por vingança ou a sede por justiça). Seu personagem, porém, não vai muito além do herói que “não tem nada a perderâ€. Os personagens de Monahan não excedem a função básica que precisam cumprir na trama, da mesma forma que a narrativa nunca evolui para um filme que vá além da fórmula.

O trabalho de Campbell, porém, é admirável. Aplicando textura à película e realizando cenas de ação virtuosas (a sequência de atropelamento vem em mente), o cineasta ainda cria momentos de tensão e cenas esteticamente excitantes – como uma em que descobrimos de forma sutil (em movimento de câmera inspirado) um homem morto no sofá. Há também o último ato, vibrante e impactante na violência. São aspectos fortes que, ao fim da sessão, reverberam. Nos lembrando que, ainda que seja um filme falho, cumpriu seu objetivo como “fita de ação†– no caminho surpreendendo com uma ou outra escolha memorável.

Sintetizado por uma mesclagem de momentos silenciosos instigantes e uma super-exposição lamentável – caracterizada por diálogos verdadeiramente ruins – O Fim da Escuridão traz consigo aqueles típicos momentos irritantes onde certo personagem vai buscar uma bebida pro outro e nunca volta (isto ocorre duas vezes no filme), mas acaba finalizando-se como sólido entretenimento. Movido mais pela ação estilizada do que pela sua trama levemente pretensiosa, trata-se de um trabalho com valiosos momentos e um personagem secundário especificamente marcante. Que poderia ter sido um filme completamente diferente (e superior) isto é óbvio. No entanto, não deveria ser solenemente ignorado. (Wally Soares)