Crítica sobre o filme "Simplesmente Complicado":

Wally Soares
Simplesmente Complicado Por Wally Soares
| Data: 05/07/2010
Ao contrário de Kathryn Bigelow, cineasta americana que comumente retrata histórias que se passam dentro do mundo tipicamente masculino, Nancy Meyers sempre teve uma ânsia de retratar seu próprio mundo. Utilizando-se de fórmulas banais, senso de humor delicioso e provável inspiração de suas próprias vivências, ela criou uma filmografia própria, apesar de firmá-la sobre um grande número de clichês. Simplesmente Complicado segue, então, a linha de filmes anteriores da cineasta. É sobre pessoas ricas, explora relacionamentos e as dinâmicas entre homens e mulheres e, especialmente, traz consigo um olhar feminino. Se Do Que as Mulheres Gostam trazia um protagonista homem pouco importa, o foco ali era o feminino. Para Meyers, esse é o pivô. E seu novo filme é a irmã gêmea (quase idêntica) de Alguém Tem que Ceder. Mesma dinâmica, personagens muito parecidos e piadas que giram em torno de mesmos propósitos – só não é tão bom. Simplesmente Complicado acaba funcionando por que os protagonistas se divertem, entregando ótimas atuações, e porque a audiência almeja se identificar por conflitos e insinuações de uma obra que, se não complicada, ao menos é agradável.

A comédia romântica gira em torno das complicações que surgem quando os divorciados Jane (Meryl Streep) e Adam (Alec Baldwin) reiniciam o romance que deixaram para trás há muitos anos. Adam, casado com uma jovem e com novo filho para cuidar, precisa lidar com a situação, ao passo que Jane precisa enfrentar seu próprio código moral e as investidas de seu arquiteto, Jake (Steve Martin). Uma premissa até refrescante que é diversamente bem conduzida por Meyers quando ela confia nos seus personagens e deixa as emoções fluir de forma concisa. Mas nem sempre é assim. Simplesmente Complicado é muito burocrático e em vezes terrivelmente estereotipado. Meyers possui uma tendência já conhecida para o medíocre e ela bate muito nesta tecla em seu novo filme.

É tudo muito artificial no mundo criado por Meyers. Tudo muito redondo e trivial, evitando que emoções sinceras surjam. Portanto, quando os três filhos do casal começam a chorar em certo momento da metragem, sentimos indiferença e rangemos o dente. Não só diante da péssima qualidade das atuações, mas pelo deslocamento dramático, que por sua vez oscila muito no decorrer da metragem. E é justo no equilíbrio que o filme sobrevive, no momento onde a audiência releva as banalidades para deliciar-se pelos pequenos prazeres que a obra proporciona. Entre eles, a dinâmica de relacionamentos amorosos, que Meyers normalmente explora com uma comicidade eficiente. Mesmo que tal espírito cômico (ou mesmo o dramático) se mantenha um tanto inferior ao do ótimo Alguém Tem que Ceder.

O humor e agrado são então os triunfos de um trabalho que pouco possui a acrescentar, o que não evita que Simplesmente Complicado tenha seus momentos preciosos. Seja na cena competente que se passa em uma festa, sintetizando muito bem a dinâmica do “quarteto†que acaba sendo formado, ou mesmo um momento honesto que extrai de Alec Baldwin o desempenho mais emotivo e crucial da película. Baldwin, alias, rouba o filme ao lado - claro - de Meryl Streep. A deusa do cinema não está nada menos que exemplar e se diverte com sua personagem (o que é sempre bom). Ela e Baldwin formam uma química maravilhosa e sabem explorar ao máximo as nuances que residem entre seus personagens. Certamente são eles que provocam o fogo que mantém Simplesmente Complicado lúcido.

Por outro lado, Steve Martin possui poucos momentos realmente competentes e acaba se revelando como um personagem realmente aborrecido, em nada envolvente. Ao contrário do personagem de John Krasinski, ótimo para a fluidez cômica da película e roubando as cenas nas quais surge. Eles representam os dois extremos de Simplesmente Complicado, um filme que almeja ser ao mesmo tempo divertimento descomprometido e Cinema bastante limitado e superficial. O aproveitamento da película, portanto, acaba dependendo de sua audiência, e da capacidade desta para entreolhar aspectos e desconsiderar outros. É uma verdade incontestável a obviedade de Simplesmente Complicado e sua pura fraqueza, mas é também inevitável o sentimento leve e espirituoso que pode se ocasionar diante de uma regularidade cômica afetuosa e uma dupla principal de atores bastante virtuosa.

Não é conclusivo, portanto, a avaliação de Simplesmente Complicado em termos que vão de fotografia à trilha sonora - o longa-metragem é nocivo neste sentido. Graças às pitadas um tanto inspiradas do roteiro e um elenco que provoca a diversão instantaneamente, o filme torna-se assistível dentro de suas incapacitações assumidas. Contanto que não haja muitas exigências, é possível que o novo filme de Nancy Meyers - apesar de sua medíocre direção - consiga se qualificar ao menos como diversão gratuita. E consegue. Especialmente por que a outra mulher nos ingredientes deixa tudo muito mais gostoso. (Wally Soares)