É diferente do primeiro, menos sensacional, menos violento, menos original, talvez até faça menos sucesso. Mas é o filme mais ousado politicamente que já assisti do cinema brasileiro dos últimos anos. José Padilha é o único cineasta que não tem medo de botar a boca no trombone, ainda mais em tempo de eleição e levanta o dedo acusador para os verdadeiros culpados da bandidagem nos morros cariocas. Acusa o sistema, os políticos corruptos, antigos e atuais, os policiais, o governador, os deputados. E não bota panos quentes.
É um tipo de Máfia que mandava e manda e quem desobedecer ou falar demais ou aparecer demais, é morto, desovado. Tudo tão claro e chocante que dá vontade de aplaudir no final. Que bom alguém ter coragem de tomar posições sem medo do beneplático de governos. Não que eu tenha elementos para julgar se tudo que se diz é verdade, confesso que não estou inteirado dos bastidores da política carioca e muito menos do conflito entre traficantes e milícia (isso teoricamente poderia atrapalhar a aceitação do filme que é muito carioca tematicamente).
Com menos cenas de efeito e ação, eu gosto mais deste segundo filme. A narrativa off do herói Comandante Nascimento, que no primeiro foi criada a posteriori e tinha momentos desajustados, agora vai nos guiando de forma mais confiante e até nos revelando algumas surpresas, sem nunca ser óbvia. Lembrou-me inclusive o trabalho de dois cineastas, os filmes de denuncia de Costa-Gavras (que por acaso foi quem presidiu o júri que deu ao filme o Urso de Ouro em Berlim) e o Poderoso Chefão, de Coppola, na sua eficiente e convincente descrição de uma organização criminosa.
Quando o filme começa, Nascimento (Wagner Moura envelhecido para o personagem e com menos chances de brilhar, tem que ser mais contido, mas não deixa de ser o grande ator de sempre) está sendo vítima de um atentado não se sabe muito bem de quem. Em flashback, ele recorda que esteve uma cilada que fez com que descesse para cima, virou subsecretário da Segurança, se dedicando a fortalecer sua organização BOPE (que agora passa a ter menos importância na história) e combater os traficantes. Sem perceber que está cometendo um engano histórico, o poder saiu do tráfico e foi parar nas mãos dos policiais corruptos, as chamadas milícias, e dessa forma são utilizados para conseguir voto e eleições.
O filme tem menos o corpo a corpo da guarnição, cria-se um interessante triângulo entre Nascimento e sua ex-mulher, Maria Ribeiro, e o novo marido dela, um sujeito ambicioso que é porta-voz dos Direitos Humanos e sonha em ser deputado e que tem a guarda do filho deles (que portanto entra em choque com o pai). É uma boa sacada do roteiro, que aumenta o interesse humano, envolvendo também os antigos colegas André (André Ramiro) e Capitão Fábio (Milhem Cortaz). Também na história entra uma jovem repórter (a bela gaucha Tainá Muller) ansiosa demais para ter muito futuro. O fato é que o roteiro, novamente de Braulio Mantovani e do diretor. é muito competente, assim como praticamente tudo. Inclusive o elenco de apoio.
É mais uma confirmação de Padilha é de fato um grande cineasta. (Rubens Ewald Filho na coluna Clássicos de outubro de 2010. Rubens mantém um blog exclusivo no portal R7)