Crítica sobre o filme "Superman: Anthology – BLU-RAY UK":

Jorge Saldanha
Superman: Anthology – BLU-RAY UK Por Jorge Saldanha
| Data: 09/07/2011
A coleção dos filmes da série SUPERMAN, agora relançados em Blu-ray, pode ser chamada de “A Vingança de Richard Donnerâ€. Para chegarmos ao porque desse título, traçaremos um breve histórico sobre a produção dos dois primeiros filmes. A Warner, em 1977, resolveu bancar uma superprodução sobre as aventuras do Homem-de-Aço, com produção de Alexander Salkind, poderoso na época e notoriamente difícil de se lidar. Ficou combinado que seriam dois filmes, filmados simultaneamente. Para escrever o roteiro foi contratado Mario Puzo, o autor de O PODEROSO CHEFÃO, com a colaboração de David e Leslie Newman. O diretor Richard Donner, que havia mostrado potencial com A PROFECIA, foi escolhido para dirigir os dois filmes. Donner só aceitou o trabalho com a condição de que o filme fosse tratado seriamente e que deveria convencer a audiência de que um homem poderia voar. Donner não aprovou o roteiro original, que continha humor pobre e beirava o ridículo, e chamou outro roteirista, Tom Mankiewicz, para polir o roteiro original, modificando vários diálogos e retirando todas as cenas ridículas, o que desagradou o produtor Salkind. O resultado foi um foi roteiro mais sério, inteligente e com excelentes diálogos.

Salkind, inconformado com a direção que Donner estava tomando, fez diversas ameaças de despedi-lo caso não seguisse os parâmetros traçados. O elenco do filme não poderia ser melhor. Marlon Brando (como Jor-El, o pai do Superman), Gene Hackman (como o vilão Lex Luthor), Glen Ford (como o pai adotivo do Superman), Ned Beatty, Jackie Cooper e, finalmente, Christopher Reeve como Superman. Reeve foi a chave para o sucesso do filme. Donner queria um ator desconhecido que passasse a imagem de ser realmente o Superman e que não ficasse ridículo usando o uniforme. Reeve foi a escolha perfeita; um ótimo ator, convincente tanto como Superman quanto Clark Kent, e que simplesmente convenceu usando o uniforme. Para a audiência não há dúvida, Reeve é o Superman. Quando Donner já tinha filmado a maior parte do primeiro filme e quase metade do segundo, a Warner resolveu antecipar o lançamento do primeiro filme para o final de 1978. Como consequência, a produção do segundo filme foi suspensa e toda a equipe passou a se dedicar exclusivamente ao primeiro.

O primeiro filme foi concluído e lançado nos cinemas com enorme sucesso de crítica e audiência. Algumas semanas após o lançamento do primeiro filme, Donner estava esperando o sinal verde para dar continuidade às filmagens do segundo filme. Entretanto, recebeu um telefonema de Salkind informando-lhe que fora despedido e que Richard Lester, diretor de OS REIS DO IÉ-IÉ-IÉ, dos Beatles, tomaria seu lugar. Em protesto, Gene Hackman e o compositor John Williams se recusaram a permanecer na produção. Marlon Brando exigiu um pagamento astronômico e foi excluído do segundo filme, mesmo já tendo várias cenas filmadas. Em substituição a Brando no segundo filme foi usada a imagem da mãe do Superman. Uma bela cena em que o personagem de Brando, Jor-El, se sacrifica para restaurar os poderes de seu filho, foi perdida. No caso de Gene Hackman, ele estava contratualmente liberado, pois já havia filmado todas as suas cenas em SUPERMAN II – A AVENTURA CONTINUA com Donner. Mas sua saída criou dificuldades, pois Donner já havia filmado quase metade do filme e para que seu nome não fosse incluído nos créditos, constando apenas Richard Lester na direção, várias cenas deveriam ser refilmadas por esse último, incluindo cenas com Lex Luthor. A solução foi usar um dublê a distância e redublar algumas cenas com outro ator, cuja voz em nada se parece com a de Hackman.

A saída de John Williams não criou problemas para a produção, pois a Warner era a detentora dos direitos autorais da trilha sonora e Salkind simplesmente contratou outro compositor, Ken Thorne, para adaptar a trilha de Williams. Como conseqüência, a trilha sonora do segundo filme é muito inferior à do primeiro, que é maravilhosa. Todos os demais atores também protestaram, mas como estavam contratualmente obrigados a terminarem as filmagens, nada puderam fazer. Durante anos boa parte da crítica e da audiência considerou SUPERMAN II superior ao primeiro filme, pois tinha mais aventura, ação e humor. Hoje em dia, diferentemente, SUPERMAN – O FILME é tido como o melhor da série. Mas por que dessa mudança de opinião? A resposta é simples: SUPERMAN II envelheceu muito com seu humor pastelão típico dos anos 1980 e exageros nos efeitos e na ação. O primeiro, por outro lado, por ter sido um filme mais sério, mais inteligente e com produção mais caprichada sobreviveu muito bem com o passar dos anos e é hoje considerado um pequeno clássico do cinema.

Em 2006 Richard Donner teve a oportunidade de reeditar a sua versão de SUPERMAN II e como resultado a “RICHARD DONNER CUTâ€, apesar de possuir a mesma trama da versão que chegou aos cinemas, possui um tom mais sério e praticamente 50% de tomadas até então totalmente inéditas, incluindo 15 minutos de Marlon Brando como Jor-El e várias novas cenas com Christopher Reeve e Margot Kidder. Parte desse material já aparecera em versões estendidas exibidas na TV norte-americana, e certas cenas já conhecidas foram substituídas por tomadas feitas de ângulos diferentes. Para dar coesão à nova montagem algumas novas sequências foram rodadas e efeitos visuais foram criados, além de serem mantidas algumas cenas filmadas por Richard Lester. Ao final, 83% do que vemos foi filmado por Donner, o que permite lhe dar o crédito de diretor dessa versão. SUPERMAN II – THE RICHARD DONNER CUT, já fora lançado no primeiro box em Blu-ray lançado nos EUA, mas até agora permanecia inédito no Brasil.

Após SUPERMAN II foram feitas duas continuações, uma pior que a outra e que não merecem comentários mais extensos. SUPERMAN III, com o controle total de Salkind e direção plena de Richard Lester, se mostrou uma grande bobagem. O comediante Richard Pryor ganhou mais destaque no filme do que o próprio Superman, e o filme tendeu mais para comédia do que para aventura. SUPERMAN IV – EM BUSCA DA PAZ foi melhor intencionado, pois procurou fazer um alerta sobre o risco de uma guerra atômica, mas fracassou devido à paupérrima produção e um ridículo vilão, “O Homem Nuclearâ€, que com suas unhas radioativas e uniforme colante parece saído de uma sátira pornô. Após o previsível fracasso dos dois últimos filmes do Homem de Aço, em termos de adaptações de quadrinhos a Warner passou a se preocupar unicamente com a franquia BATMAN. Até que, após anos de indefinições, o cineasta Bryan Singer, que realizara com sucesso os dois primeiros filmes da franquia X-MEN, foi contratado para assumir SUPERMAN – O RETORNO, que chegou aos cinemas em 2006.

A trama, baseada numa história do próprio Singer, leva tempo demais para engrenar e levamos algum tempo para superar a estranheza inicial causada por Routh (uma espécie de cover do falecido Reeve, sempre preocupado em imitar seus trejeitos), e pela Lois Lane de Kate Bosworth, que na verdade é loira e no filme está de peruca castanha. Mas o filme tem qualidades e homenagens suficientes que justificam, para os fãs, o esforço de Singer, como as referências ao nº 1 do gibi Action Comics, que trazia na capa o Homem de Aço levantando um carro, e aos eventos ocorridos em SUPERMAN II (aquele no qual Luthor descobre a localização da Fortaleza da Solidão e onde o Super abandona seus poderes para ter um relacionamento íntimo com Lois). Aliás, SUPERMAN – O RETORNO se propõe a ser uma continuação direta do segundo longa da franquia, ignorando os ruins III e IV. Os créditos iniciais seguem o mesmo estilo dos outros filmes, e na seqüência final mais uma vez vemos Superman voando em órbita da Terra, inclusive com Routh passando diante da câmera e sorrindo para a platéia, como Reeve fazia. E há outro fator de continuidade importantíssimo - a utilização pelo compositor/editor John Ottman, em sua trilha musical, dos memoráveis temas criados por John Williams para o filme de 1978. Em torno deles Ottman construiu aquela que talvez seja sua melhor partitura até agora.

Portanto, há uma série de referências visuais e auditivas aos dois melhores filmes da série, sendo impossível não ser cativado por elas. E que não deixam dúvidas: para o bem ou para o mal, este é um legítimo filme do Superman, concebido para reiniciar a franquia com Routh no papel do super-herói. Infelizmente a crítica e o público se dividiram e o longa rendeu nas bilheterias muito menos que o esperado, o que levou a Warner a mais uma vez colocar o Homem de Aço na geladeira. Mas de lá ele sairá ano que vem, quando estrear o reboot dirigido por Zack Snyder (300, WATCHMEN) trazendo Henry Cavill como Clark Kent/Superman. (Luiz Felipe do Vale Tavares, Jorge Saldanha)